Natália Portinari

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Reportagem

Negociação entre empreiteiras e governo pode acabar em calote na Petrobras

Atendendo as empreiteiras que estão renegociando seus acordos de leniência firmados na época da Operação Lava Jato, o ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), endossou, durante uma reunião na semana passada, uma proposta que pode levar a um calote bilionário na Petrobras e outras empresas.

A negociação diz respeito a acordos com um saldo devedor de R$ 8 bilhões (reajustados pela inflação, R$ 11,8 bilhões), firmados pela União com Braskem, Novonor (ex-Odebrecht), OAS, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, UTC e Nova (ex-Engevix). As empresas confessaram irregularidades em troca de punições menores.

Na última quinta-feira (23), em audiência no Supremo com integrantes da AGU (Advocacia-Geral da União) e CGU (Controladoria-Geral da União), as empreiteiras discutiram as questões que estão dificultando a concretização dos acordos, que devem ser fechados até 26 de junho.

A renegociação do governo com as empreiteiras chegou a um impasse porque elas querem usar o crédito tributário que têm com a União para pagar também a dívida com estatais, especialmente a Petrobras, o que corresponde a cerca de 55% dos R$ 11,8 bilhões.

Isso significa, de acordo com fontes que participam da negociação, que a Petrobras e as outras empresas — como a Eletrobras, que, desde então, foi privatizada — podem perder de R$ 2 bilhões a R$ 3 bilhões em compensações que hoje são devidas pelos acordos.

Hoje, a Petrobras é compensada pelos pagamentos dos acordos. Com o ajuste que Mendonça sinalizou que irá permitir, a fatia da empresa, assim como de outras estatais, em menor proporção, pode diminuir drasticamente.

Além disso, o ministro também deu aval a um mudança no cálculo do percentual de devolução do lucro ilícito que as empresas foram obrigadas a pagar ao governo pelos acordos. Estima-se que, com isso, seja possível obter uma redução de até 20% nos valores devidos pelas empreiteiras.

Na reunião, o ministro ainda sugeriu que os pagamentos dos acordos sejam usados para a reconstrução do Rio Grande do Sul após as enchentes, outra possibilidade que está em análise na negociação com as empresas.

Prejuízo fiscal

O crédito tributário que as empresas querem usar é gerado quando elas têm prejuízo. Grandes firmas pagam impostos ao governo federal antes do fechamento de seus balanços. Em anos em que têm prejuízo, é gerado um crédito, chamado de prejuízo fiscal.

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No entendimento da AGU, a lei permite que esse crédito, chamado de prejuízo fiscal, seja usado para abater até 70% de dívidas com a União, e não com outros entes lesados em acordos.

Na reunião, o ministro André Mendonça afirmou, contrariando o entendimento da AGU, que, como a Petrobras não é parte formal nos acordos, as empresas podem abater 70% da totalidade de seu saldo devedor, pois se tratam, de fato, de dívidas com a União.

Dessa forma, as estatais poderiam ser pagas apenas com os 30% restantes que, no caso de algumas das empreiteiras, não são suficientes para quitar a dívida que elas têm hoje com a Petrobras e as outras empresas.

O cálculo é o seguinte: hoje, cerca de 55% do valor devido iria para as estatais. Com o acordo, os pagamentos do valor total podem ser reduzidos em até 70%. Portanto, não sobraria dinheiro, nos 30% remanescentes, para pagar o que hoje é devido à Petrobras e às outras empresas.

Mendonça acrescentou também que a Petrobras já reconheceu que não houve sobrepreço nas obras que contratou dessas empreiteiras e que, por isso, a empresa não precisaria ser compensada pelos acordos.

Dos R$ 3,3 bilhões pagos até agora pelas empresas nos acordos, cerca de R$ 1,8 bilhão foi para a União e R$ 1,4 bilhão para a Petrobras. Há outros pagamentos menores devidos também para a Valec, Furnas, Eletronorte, CHESF e Eletrobras, entre outras.

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Procuradas, a CGU e a AGU não informaram quanto dos R$ 11,8 bilhões ainda são devidos para cada um dos entes lesados.

Algumas empreiteiras, como UTC, Novonor, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez, ainda têm boa parte do seu saldo devedor em dívidas com estatais e, por isso, têm insistido em usar o prejuízo fiscal para cobrir 70% de tudo o que devem em seus acordos. Para elas, restringir a compensação das dívidas à fatia com a União pode inviabilizar os acordos.

O ministro André Mendonça disse durante a reunião que estava apenas fazendo sugestões, e que cabe aos órgãos do governo, AGU e CGU, negociar com as empresas. Fontes que participam da negociação, porém, saíram com a impressão de que o endosso de Mendonça ao pleito das empresas acabou encurralando o governo no processo de negociação.

O ministro da AGU, Jorge Messias, disse às empresas que enviaria uma contraproposta de acordo nesta semana contemplando parte das demandas das empreiteiras, como um uso mais amplo do prejuízo fiscal. Até esta terça-feira (28), a proposta ainda não havia sido enviada.

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