Raquel Landim

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Opinião

Discurso de Lula é menos benefício fiscal, mas prática é apoio a montadora

O Congresso está fazendo mais uma manobra para ajudar as montadoras instaladas no Nordeste, dessa vez na regulamentação da reforma tributária. A versão restritiva de redução do incentivo fiscal enviada pela equipe econômica ficou mais "light" nas mãos dos deputados. Detalhe: o subsídio, teoricamente, só acaba em 2032.

Digo teoricamente porque é preciso aprender com a história. Criados em 1997 ainda no governo Fernando Henrique Cardoso para levar montadoras para o Nordeste e o Centro-Oeste, os regimes regionais, que dão isenção de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), estavam previstos para acabar em 2025.

Veio a reforma tributária, que deveria terminar de vez com essas exceções, e deu-se o contrário.

Houve disputa com as montadoras instaladas no Sul e no Sudeste, mas não teve jeito. O pleito para esticar os benefícios até 2032 perdeu por um voto na Câmara, só que foi impossível segurar o lobby no Senado e a prorrogação acabou aprovada.

Os regimes efetivamente pavimentaram a chegada de montadoras nessas regiões. Com a ajuda de redução generosa também de ICMS feita pelos governadores, a Ford se instalou em Camaçari, na Bahia, Caoa e HPE colocaram linhas de produção em Anápolis e Catalão, em Goiás, e, por fim, chegou a Fiat, hoje chamada de Stellantis, em Pernambuco.

Só que incentivos fiscais não foram capazes de mudar a realidade do mercado. Falta demanda por veículos nesses Estados, que são mais pobres e tem menos população, e também falta fornecedor. Ao redor da fábrica da Fiat em Pernambuco, estão instalados 16 fornecedores de autopeças, já no entorno da unidade em Minas Gerais mais de mil.

A despeito de todo o incentivo fiscal, a Ford fechou a fábrica na Bahia e deixou de produzir no Brasil. A unidade ficou parada por três anos apesar de todo o esforço do governo da Bahia, que é do PT, e do governo federal. Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, é ex-governador da Bahia. Agora os chineses da BYD assumiram e também querem benefício fiscal.

Segundo o Tribunal de Contas da União, os programas de incentivos regionais já custaram R$ 50 bilhões aos cofres públicos. Geraram algum emprego nessas regiões, mas não foram muito além disso.

Porém, os lobbies são tão fortes no Congresso e no governo federal que o país não consegue refletir se seria melhor investir esse dinheiro em outros setores onde o Nordeste poderia ser mais bem sucedido como, por exemplo, o turismo.

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Aliás, o governo Lula propôs e o Congresso aprovou recentemente o Mover, outro programa de incentivo às montadoras de veículos - dessa vez todas que estão instaladas no país. Teoricamente, para incentivar a descarbonização. Na prática, nem tanto. Mais R$ 19,5 bilhões em subsídios.

E tudo isso acontece num momento em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva promete um pente fino nos incentivos fiscais e diz que esse é o caminho para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, fazer o ajuste nas contas que o país precisa.

Sim, é evidente que os incentivos fiscais devem ser revistos e muitos cancelados. Mas para isso o governo federal tem que ser específico. Quais? Não adianta fazer um discurso retórico generalista, enquanto cada lobby garante a sua fatia do Orçamento público no Congresso.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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