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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Sem Bolsonaro nos debates de 1ª turno, Lula tem de comparecer? Respondo

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Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

31/05/2022 17h00

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O presidente Jair Bolsonaro vive a fazer por aí a defesa da "nossa liberdade". No geral, creio, ninguém entende direito o que quer dizer com isso. Esse pronome possessivo designaria qual grupo? Vai ficando claro: "nossa" quer dizer "a minha", "da minha turma", "do meu grupo", "dos que pensam como eu", "dos meus aliados", "da minha grei" (este último só na hipótese de, um dia, ele ampliar o vocabulário além de mil palavras). É tão privatizante, a seu modo, que tenta privatizar a própria... liberdade.

Em bate-papo com Ratinho, o presidente disse que não deve participar de debates eleitorais no primeiro turno. O motivo singelo é um só: ele acha que todos os outros candidatos vão se voltar contra ele. Nas suas palavras:
"No segundo turno, vou participar. Se eu for pro segundo turno, devo ir, vou participar. No primeiro turno, a gente pensa, porque, se eu for, os dez candidatos ali vão querer o tempo todo dar pancada em mim, e eu não vou ter tempo de responder pra eles".

O presidente teve ainda uma outra ideia original para debates, acostumado que está a enfrentar adversários sempre com alto estilo, com alto nível: acha que as perguntas deveriam ser acertadas previamente "para não baixar o nível".

Vale dizer: Bolsonaro não quer debater coisa nenhuma porque, como é notório, está acostumado a falar sozinho. Em 2018, participou de dois debates, com desempenho pífio, e só. Veio a facada. E o tal Adélio — que, com efeito, por pouco não matou o agora presidente — acabou pavimentando o caminho da vitória eleitoral. O então candidato do PSL foi poupado de debates e entrevistas eventualmente incômodas, dado o seu obvio despreparo, que persiste; concedeu entrevistas em tom agônico no leito do hospital; criou a personagem que passava por martírios para defender o Brasil e se limitou a fazer transmissões pela Internet. Não se conta a história que não houve, e, pois, não dá para dizer que teria sido derrotado sem a facada. Mas não há dúvida de que, do ponto de vista estritamente eleitoral, a candidatura foi beneficiada pelo ato tresloucado que quase matou o candidato.

Debates têm regras: uma delas impõe que todos os candidatos respondam e façam o mesmo número de perguntas. Mas é evidente que, no correr do evento, alianças meramente táticas se formam. Cada participante tenta, ainda, eleger aquele que pretende que seja seu duelista, recorrendo a terceiros para alvejá-lo. Há também o ataque indireto — "Como você vê o atual desgoverno no combate à inflação e como você resolveria?" — e a "não pergunta" meramente discursiva: "Fulano, seu eu for eleito vou obrigar a Petrobras a cobrar o preço de custo da produção, mais rentabilidade de 15%. O que você faria?" É da natureza do jogo.

Hoje, quem lidera a disputa com folga é Lula. Assim estará quando começar o tempo dos debates? Não se sabe. Mas me parece certo que tanto o presidente como o petista seriam alvos privilegiados dos demais. Até porque a grande demanda da imprensa — da sociedade, até agora, não — é por um candidato viável que não seja nem um nem outro. Há ainda Ciro Gomes, com uma postulação que fala a linguagem de esquerda e tenderia, é provável, a mirar mais no ex-presidente do que no atual. Ou em ambos igualmente. Também a vida do petista não seria fácil.

Lula e Ciro são debatedores experientes, com um leque amplo de recursos retóricos. Bolsonaro está acostumado a falar sozinho e tem pendor mais para a ofensa do que para a contradita. Parece-me que ele teme menos ser "alvo" de todos do que ter de se confrontar com oponentes que, por óbvio, vão expor a leitura que fazem da herança do seu governo.

Se o presidente não participar dos debates, será que Lula encara o desafio? Pois é... Parece-me evidente e da natureza do jogo que, estando presentes os dois que hoje iriam para o segundo turno (com a chance de Lula vencer no primeiro se a eleição ocorresse amanhã), o natural é que os demais postulantes centrem fogo na dupla, não? Pensem: por que iriam duelar entre si? As dobradinhas contra a dupla que lidera seriam uma imposição do jogo.

Se, no entanto, o atual presidente se nega a participar, há duas possibilidades: ou o petista vai de peito aberto, sem qualquer entendimento prévio, e será massacrado sozinho, por mais que seja bom no embate — afinal, há limites para contestar os contendores — ou se faz um pacto, à luz do dia, de modo que os debates sejam realmente propositivos, voltados para a exposição de propostas, sem altercações pessoais. E deixo claro: é tarefa das mais difíceis.

Lula faça o que quiser. Eu digo o que eu faria: se Bolsonaro não fosse, também não iria. É uma estratégia que traz algum risco porque os contendores outros terão uma vitrine para falar. E é claro que os dois que lideram a corrida serão os alvos principais. Deve-se avaliar se essa não é, afinal, a melhor chance da "terceira via" ou de Ciro.

É evidente que considero que o mais correto e democrático é que todos os postulantes participem dos debates, muito especialmente os que aparecem na frente nas pesquisas de opinião. Mas também sou realista.

A única coisa razoável que disse Bolsonaro sobre os debates é — ou seria — a formação do tal "pool" de emissoras. A questão é saber quem entraria hoje nesse grupo, com a multiplicação de mídias. Já haveria uma pauleira danada para saber quem poderia se sentar nessa távola que poderia ser tudo, menos redonda. A ideia parece simpática, mas vem com vinte anos de atraso. A multiplicação de plataformas hoje parece torná-la inviável.

Participe, Bolsonaro! Eis a chance de fazer o que não pôde em 2018: enfrentar Lula num debate já no primeiro turno. Você tinha levado uma facada, e ele, a peixeira de uma condenação sem provas, com ordem de prisão expedida por Sergio Moro, que se tornou seu ministro da Justiça. Coragem, rapaz!

Agora diz Bolsonaro: "Só no segundo turno". Talvez um insuspeitado ser que pondera lhe dê uma esperança, que parece improvável: "Quem sabe, Jair, você nem vá para o segundo turno..."