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Rubens Valente

Preso e solto no mesmo dia, deputado do PSL nega prisão e ataca jornalistas

O deputado Loester Trutis - Reprodução/Facebook
O deputado Loester Trutis Imagem: Reprodução/Facebook

Colunista do UOL

14/11/2020 17h27

Resumo da notícia

  • Em vídeos, o deputado federal bolsonarista Loester Trutis (PSL-MS) chamou jornalistas de "maconheiros" e disse que não foi preso na quinta-feira (12)
  • Prisão em flagrante do parlamentar é confirmada em diversos documentos que tramitam no STF e foi comunicada pela PF à presidência da Câmara e ao MPF

O deputado federal Loester Trutis (PSL-MS) - preso em flagrante e solto no mesmo dia na última quinta-feira (12) pela Polícia Federal em Campo Grande (MS) - foi às redes sociais para negar sua prisão e atacar a imprensa e jornalistas. Contrariando toda a documentação do caso que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal), ele disse que não foi preso.

"A imprensa mente e eu preciso de você", publicou o deputado no Facebook junto com um vídeo compartilhado 384 vezes e curtido por 1,1 mil pessoas. Em vídeo, ele xingou jornalistas de "maconheiros", pediu que seus seguidores "parem de acreditar na imprensa" e disse que sua prisão "é uma mentira". "Em momento algum eu fui preso", disse Trutis, dono de uma lanchonete, apoiador do presidente Jair Bolsonaro e defensor do armamento da população civil que foi eleito em 2018 para seu primeiro mandato eletivo.

Todos os passos que explicam e documentam a prisão e a soltura do parlamentar estão na Petição nº 9285, de 63 páginas, que foi aberta no STF por ordem da ministra Rosa Weber apenas para o caso da prisão em flagrante e está disponível para consulta pública no tribunal - três documentos estão aqui reproduzidos.

PF apreendeu fuzil e mais de R$ 44 mil em espécie na casa do deputado

Comunicação da PF à Presidência da Câmara dos Deputados sobre a prisão em flagrante do deputado federal Loester Trutis (PSL-MS) - Reprodução/ Inquérito STF - Reprodução/ Inquérito STF
Comunicação da PF à Presidência da Câmara dos Deputados sobre a prisão em flagrante do deputado federal Loester Trutis (PSL-MS)
Imagem: Reprodução/ Inquérito STF

Na manhã de quinta-feira, ao cumprir uma série de mandados de buscas e apreensão expedidas pela ministra do STF Rosa Weber na Operação Tracker, a PF encontrou mais de 200 munições e três armas de fogo na residência do deputado em Campo Grande, uma das quais um fuzil da Taurus T4, além de R$ 44 mil numa mala e dois pacotes de dinheiro. A operação foi desencadeada para apurar se Trutis forjou um atentado a tiros que ele disse ter sido vítima em fevereiro de 2020. A PF e a PGR apontam indícios de que o parlamentar simulou o atentado.
No momento da apreensão das armas, a PF entendeu que o fuzil era de uso proibido no Brasil e decidiu pela prisão em flagrante do parlamentar. Deputados perdem sua imunidade parlamentar e podem ser presos em flagrante quando os crimes são inafiançáveis o que, no primeiro entendimento da PF, seria o caso de porte de arma supostamente proibida.

Guia de recolhimento da prisão em flagrante pela PF do deputado federal Loester Trutis (PSL-MS) - Reprodução/Inquérito STF - Reprodução/Inquérito STF
Guia de recolhimento da prisão em flagrante pela PF do deputado federal Loester Trutis (PSL-MS)
Imagem: Reprodução/Inquérito STF

O deputado foi levado à Superintendência da PF em Campo Grande (MS) e portais de notícias dentro e fora de Mato Grosso do Sul noticiaram a prisão. Por e-mail, a PF comunicou a prisão em flagrante para diversos órgãos, como a presidência da Câmara dos Deputados e o STF.

A PF fez no mesmo dia uma perícia no fuzil e constatou que se tratava de uma arma de uso restrito, não proibido. Essa mudança de proibido para restrito para aquele modelo de fuzil ocorreu no ano passado, no governo de Jair Bolsonaro, segundo o laudo da PF. A partir de então, a PF passou a indicar que se tratava de um crime afiançável, o que tornava a prisão do parlamentar impossível de ser caracterizada como flagrante.

Ministra do STF relaxou prisão após informações da PGR e da PF

A documentação no Supremo inclui a informação passada oficialmente pela Polícia Federal à presidência da Câmara dos Deputados, ao STF e ao Ministério Público sobre a prisão em flagrante de Trutis (assinada às 16h36 e enviada por e-mail às 17h04), a guia de recolhimento do parlamentar preso para uma sala de Estado-Maior, tendo como motivo a "prisão em flagrante" (às 16h50), uma manifestação da PGR (Procuradoria Geral da República) que confirmou a prisão (às 21h47) e a própria decisão da ministra Rosa Weber sobre o relaxamento da prisão, que não tem horário mas foi dada depois das 21h47, pois faz referência à manifestação da PGR - se o deputado não estivesse preso, a ministra não teria motivo para relaxar sua prisão.

Na sua manifestação à ministra Rosa Weber, o vice-procurador-geral da República Humberto Jacques Medeiros disse que "há materialidade e autoria com densidade incomum para este momento processual", mas opinou pela soltura do deputado. "A diligência policial se apresenta com tamanha completude que não parece haver risco à instrução criminal com a liberdade do agente flagrado. Da mesma forma, a atividade profissional do agente não faz transparecer as hipóteses de risco à aplicação da lei penal ou dano à ordem pública, pelo contrário."

Trecho da decisão da ministra do STF Rosa Weber que relaxou prisão do deputado Loester Trutis (PSL-MS)  - Reprodução/STF - Reprodução/STF
Trecho da decisão da ministra do STF Rosa Weber que relaxou prisão do deputado Loester Trutis (PSL-MS)
Imagem: Reprodução/STF

Com as novas informações trazidas pela PF e pela PGR, a ministra Rosa Weber decidiu pelo relaxamento da prisão de Trutis.

"A informação técnica que instrui a comunicação de prisão em flagrante aponta que o fuzil submetido a exame é classificado como de uso restrito, nos termos dos Decretos Presidenciais nº 9.845,9846 e 9847/2019 e da Portaria nº 1.222/2019 do Comando do Exército. Em sendo a arma de uso restrito, não se submete, o crime ora sob escrutínio, ao regime de inafiançabilidade previsto no artigo 2º, inciso lI, da Lei nº 8.072/1990. Por conseguinte, é forçoso constatar que a situação concreta não autoriza o afastamento da imunidade parlamentar formal ou processual encartada no artigo 53, § 2º, da Constituição Federal, do que decorre a ilegalidade da formalização do ato flagrancial", decidiu a ministra.

Parlamentar diz que prisão e suspeita de simulação são mentiras

Postagem do deputado federal Loester Trutis (PSL-MS) em 13/11/2020 - Reprodução/Rede social - Reprodução/Rede social
Postagem do deputado federal Loester Trutis (PSL-MS) em 13/11/2020
Imagem: Reprodução/Rede social

Contrariando toda a documentação sobre o caso, o deputado Trutis passou a atacar a imprensa e negar que tenha sido preso, em dois vídeos postados nas redes sociais na sexta-feira (13).

"E vocês, jornalistas maconheiros, que ficaram bravos com minhas propostas, inclusive da internação compulsória dos 'cracudos' que compram crack ao redor de Campo Grande, queria perguntar para vocês se vocês sabem a diferença do maconheiro pro 'cracudo'. É que o 'cracudo' não faz jornalismo nem fica na internet enchendo o saco das pessoas", disse o deputado.

Ele afirmou que na quinta-feira "foi promovido um verdadeiro assassinato de reputação contra a minha pessoa". "Mais de cem reportagens afirmavam que eu fui preso, que eu seria transferido para o presidio de segurança máxima, sendo que isso é mentira. Em momento algum eu fui preso. Eu fui à Polícia Federal prestar esclarecimentos porque de manhã teve um mandado de busca e apreensão na minha casa em busca de uma pistola ilegal, sem marcação, sem numeração, de uma marca que eu não possuo", argumentou o parlamentar.

"Não fui indiciado, não fui preso, não fui nem acusado de nada, mas como você pode ver aí mais de cem matérias tentando arrebentar com a minha reputação um dia antes da eleição ou dois dias antes da eleição."
Trutis também negou ter simulado o atentado de fevereiro e voltou a dizer que sofreu uma tentativa de assassinato, sem mencionar os nomes dos autores.
"A imprensa MENTE quando diz que eu forjei meu atentado, MENTE quando diz que fui preso, MENTE quando diz que as armas na minha casa eram ilegais, e não é por inocência ou pelo simples fato de serem péssimos jornalistas, não é pelo fato de não checarem as suas fontes. A imprensa mente com a única intenção de me prejudicar. Mentem pq sabem que as minhas redes sociais têm mais acessos gratuitos do que os seus sites que recebem milhões de reais de verba de publicidade da prefeitura e do governo do estado. Ou seja, mentem pq eu não faço parte dos seus esquemas, nunca farei e, se depender de mim, farei de tudo para acabar com esses esquemas", escreveu o deputado no Facebook.