Bolsonaro diz buscar 'vacina própria'; país só tem testes com estrangeiras
Resumo da notícia
- Declaração foi dada por Bolsonaro na reunião dos chefes de Estado que compõem o grupo dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)
- Os quatro projetos de vacina pesquisados no país na fase clínica são provenientes da China, Reino Unido, Europa e Estados Unidos
- Há três projetos autônomos nacionais desenvolvidos pela Fiocruz, mas todos ainda na fase pré-clínica, ou seja, trabalhados em laboratórios e animais
Há quatro possíveis vacinas para o novo coronavírus atualmente submetidas a testes clínicos no Brasil, nenhuma de origem brasileira, segundo os dados registrados e divulgados ao público pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
Nesta terça-feira (17), em reunião por videoconferência com os chefes de Estado do grupo dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), o presidente Jair Bolsonaro declarou que "o Brasil busca e trabalha para uma vacina própria".
A realidade brasileira está bem distante da alusão feita pelo presidente. Além das quatro pesquisas clínicas, todas oriundas do exterior, há três pesquisas nacionais, mas ainda na fase pré-clínica, isto é, distantes do teste da vacina em voluntários. A fase pré-clínica envolve pesquisas em laboratório e com animais. A pesquisa clínica, dividida em três fases, envolve testes em voluntários com doses reais e placebos. Nenhuma das pesquisas de origem brasileira chegou a esse ponto.
De acordo com a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), há dois projetos de vacina em Bio-Manguinhos e um terceiro no grupo de Imunologia de Doenças Virais da Fiocruz Minas Gerais, todos pré-clínicos.
O Ministério da Saúde citou um número muito maior, de "270 pesquisas" sob o acompanhamento da pasta, "muitas já em estágio avançado e com resultados promissores". Indagado se o número é a soma das pesquisas sobre vacinas e medicamentos usados em tratamentos, não houve resposta até o fechamento deste texto.
Duas pesquisas preveem transferência de tecnologia ao Brasil
O mapa das quatro vacinas que atualmente passam por testes com voluntários no Brasil é produzido pela Anvisa e fica aberto à consulta pública na internet. O quadro inclui a origem do produto. Uma veio do Reino Unido (Astrazeneca-Oxford), uma da China (Coronavac), uma dos Estados Unidos e Europa (Pfizer-Wyeth) e outra da Europa (Janssen-Cilag).
Das quatro possíveis vacinas, duas preveem transferência de tecnologia: a Chadox NCOV-19, da Astrazeneca e Universidade de Oxford, que tem como origem o Reino Unido, para Biomanguinhos, e a Coronavac, da Sinovac e Instituto Butantan, originada da China, que prevê transferência de tecnologia para o Instituto Butantan, em São Paulo.
Texto da Anvisa que acompanha o mapa das vacinas explica que "algumas das vacinas preveem transferência de tecnologia". "Essa questão é importante para que a produção da vacina seja completamente internalizada e se torne nacional. Ou seja, a transferência de tecnologia está diretamente relacionada à autossuficiência do país na produção da vacina", diz o texto.
Em seu discurso, Bolsonaro não fez referência a transferência de tecnologia. Uma das vacinas que prevê a transferência, a do Butantan, já foi alvo de diversos ataques do presidente, incluindo uma comemoração, em rede social, sobre o atraso da pesquisa.
Parceria entre Rússia e Paraná é considerada estrangeira pela Anvisa
Na sua página sobre as vacinas em teste no Brasil, a Anvisa informa que as quatro vacinas foram autorizadas "para desenvolvimento no país, após avaliação das condições de resposta às necessidades regulatórias, no caso de eventual registro no futuro, e à segurança dos participantes envolvidos".
Há uma quinta vacina relacionada ao Brasil, proveniente da Rússia e trabalhada junto ao governo do Paraná. Porém, para efeitos legais a Anvisa não a inclui no rol porque "o desenvolvimento clínico" da vacina está sendo "totalmente conduzido fora do Brasil".
"Importante lembrar que, quando o desenvolvimento clínico de uma vacina é totalmente conduzido fora do Brasil, como é o caso da vacina russa, a exigência de anuência prévia aos estudos clínicos não faz sentido. Porém, é necessário o cumprimento dos devidos procedimentos para registro da vacina. Nesse sentido, a Anvisa está em tratativas e já realizou reuniões com membros do governo do estado do Paraná e do Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar) sobre o processo de registro da vacina desenvolvida pela Rússia. Essas reuniões são de caráter preliminar, antecipando possíveis demandas futuras", diz o texto da Anvisa.
Ministério da Saúde diz que "todas as apostas necessárias serão feitas"
Procurado pelo UOL, o Ministério da Saúde afirmou, em nota, "que todas as vacinas do mundo em fase avançada de estudos clínicos estão sendo analisadas. A Pasta atua em diversas frentes com a intenção de alcançar, no menor prazo, possível uma solução efetiva e segura para a cura da Covid-19 no Brasil".
De acordo com o ministério, "todas as apostas necessárias serão feitas para achar uma solução definitiva para imunizar a população brasileira".
Procurada pela coluna, a Anvisa confirmou que o endereço disponível na internet sobre o mapa das pesquisas reflete o atual estágio dos testes no Brasil. O mapa "vem sendo atualizado em tempo real, de acordo com a evolução ou mudanças ocorridas".
"É importante destacar que somente os estudos clínicos com objetivo de registrar um medicamento precisam de autorização prévia na Anvisa. Estudos de caráter apenas acadêmico ou científico não precisam de autorização da Anvisa", informou o órgão.
Em nota, a Fiocruz informou que "desde o início do enfrentamento da pandemia no Brasil, como um dos pilares na estratégia de combate ao vírus Sars-CoV-2", o órgão "tem feito parte das diversas frentes nacionais e internacionais de busca por um imunizante contra a Covid-19".
"No campo da produção de vacinas, a Fiocruz firmou um acordo com a biofarmacêutica AstraZeneca para produzir, no Brasil, a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford. Além da entrega de 100,4 milhões de doses no primeiro semestre de 2021, a partir do recebimento do Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) da AstraZeneca para finalização da produção na Fiocruz, o acordo também permitirá a transferência total da tecnologia para que, no segundo semestre de 2021, seja possível a nacionalização da produção e a entrega de mais 110 milhões de doses", informou a Fiocruz.
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