Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Pazuello teve a cabeça cortada para proteger a de Bolsonaro
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Eduardo Pazuello ofereceu mil motivos para a sua degola.
Para ficar só no terreno da logística, a antes decantada especialidade do general, a pasta da Saúde sob o seu comando esqueceu mofando num galpão em Guarulhos quase 7 milhões de testes para detecção da covid-19, deixou o Brasil no fim da fila de compradores de vacina ao colocar todos os ovos num único cesto e falhou em cumprir TODOS os calendários de entrega de imunizante divulgados até hoje, sem contar trapalhadas de menor monta como a que fez lotes de vacinas destinados a Manaus irem parar no Macapá e vice-versa.
Mas a cabeça do general só rolou finalmente ontem por um motivo: a necessidade de evitar a abertura da CPI da covid-19, cujos desdobramentos poderiam respingar feio sobre o ex-capitão — e isso num momento em que a sua popularidade cai e os adversários avançam.
Em outras palavras, Pazuello foi o cordeiro do sacrifício, imolado para salvar a pele do chefe.
Na sexta-feira passada, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), fez saber a Bolsonaro que, diante dos sucessivos desastres protagonizados pelo ministério da Saúde no processo de vacinação, seria impossível continuar segurando a abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) destinada a investigar a conduta de autoridades na pandemia.
A CPI foi protocolada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e desde o início fevereiro já contava com o número suficiente de assinaturas para ser aberta. Com a demissão de Pazuello, o processo fica esvaziado — e o presidente, salvaguardado. "Melhor perder os aneis do que os dedos", resume um assessor palaciano.
As atenções agora se voltam para o "novo" ministério, que de novo mesmo, pouco deverá ter.
O médico Marcelo Queiroga, substituto do general, é descrito por conterrâneos como um homem "dócil" e ávido por agradar — não por acaso o perfil preferido de Bolsonaro.
Nada indica, portanto, que na "nova fase" do ministério o presidente irá arredar pé de suas convicções obscurantistas ou desistir de sua maior obsessão: a de fazer a "vacina do Brasil".
O sonho nacionalista do ex-capitão se apoia em duas frentes: uma pesquisa conduzida pela Universidade Federal de Minas Gerais, em parceria com o governo daquele estado e o Ministério da Saúde; e a produção em larga escala, pela Fiocruz, da vacina de Oxford, a única negociada pelo governo no ano passado, entre outros motivos, por prever a transferência de tecnologia para o Brasil.
Bolsonaro sonha não só em fabricar vacinas para o mercado interno como quer exportá-las para América Latina. A viagem da comitiva brasileira a Israel no início deste mês teve como um dos objetivos pedir ao primeiro- ministro daquele país, Benjamin Netanyahu, ajuda para desenvolver o imunizante no Brasil.
Como sempre, o delírio presidencial tromba com o muro da realidade.
A pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais é incipiente - os testes para a "vacina brasileira" não passaram da primeira fase e até agora desconhece-se até mesmo qual o caminho (a chamada "plataforma") que ela percorrerá para uma eventual produção.
Quanto à Fiocruz, basta lembrar que a despeito da fieira de promessas desfiada pelo agora ex-ministro da Saúde, o laboratório não entregou até hoje UMA única dose de vacina fabricada por ele no Brasil, apesar de ter recebido o primeiro lote de insumos do exterior no início de fevereiro.
Bolsonaro continuará delirando e, se a queda de Pazuello poderá lhe dar um refresco, o Brasil continuará no sufoco.
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