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Wálter Maierovitch

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Chefão da Wagner sumiu. Suspeita-se ter jogado de mão com Putin

O chefe do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin - Alexander Ermochenko/Reuters
O chefe do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin Imagem: Alexander Ermochenko/Reuters

Colunista do UOL

27/06/2023 16h14

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Especialistas internacionais em geoestratégias do crime organizado ainda relutam em aceitar a versão apresentada pelo presidente russo Vladimir Putin.

Para Putin, no episódio do final de semana, houve tentativa de golpe de estado e consumado crime de alta traição. Tudo em face da ação orquestrada pelo oligarca Yevgeny Prigoshin, dono da Wagner, uma milícia privada, sucessora da Slavonics, fundada pelo sanguinário Dmitrij Utkin.

A Wagner, nome escolhido em homenagem ao compositor, maestro e ensaísta alemão Richard Wagner, começou a operar em 2013. Sua sede é em São Petersburgo. A Slavonics possuía uma sede de fachada em Hong Kong,

O sócio capitalista da Wagner começou como vendedor de hot-dog em São Petersburgo, sua cidade natal, depois de ter cumprido pena por crime de furto.

Prigozhin, nascido em 1961, progrediu para dono de restaurantes. O mais famoso, frequentado por Putin, atendia num barco ancorado no célebre rio Neva, terceiro maior rio europeu em volume de água e foz no golfo da Finlândia

Em Moscou e em São Petersburgo, onde também nasceu Putin, o oligarca Prigozhin é apelidado de "chefe de Putin".

Para o padrão Putin de eliminação dos causadores de incômodos, o acordo de pacificação soa estranho. E coube ao capacho de Putin, que preside Belarus, a sua costura, com concessão de anistia ampla. E, também, a continuação dos contratos com a Wagner, com foco principal na África como informou o ministro das relações exteriores Sergey Lavrov.

Tudo igual a antes, como se nada de grave tivesse acontecido.

Para muitos, não houve tentativa de golpe, mas encenação, com Putin e Prigozhin, velhos amigos, a jogar de mão.

A marcha rebelde da Wagner sob ordens de Prigozhin, restou interrompida quando estava próxima a Moscou, cerca de 200 km. A partida foi de Rostov, onde funciona uma espécie de observatório da guerra da Ucrânia.

A real meta da marcha seria fazer pressão e criar um clima para a queda do ministro da defesa, Sergei Shoigu.

A lembrar que a estratégica tomada da cidade ucraniana de Bakhmut, com atrocidades a violar as regras do Direito Internacional, deveu-se à ação da Wagner. E a Wagner já carregava o prestígio de atuação fundamental da Síria, na manutenção do ditador sírio.

Logo depois do sucesso em Bakhmut, que virou terra arrasada, Prigozhin, em discurso a correspondentes de guerra, atacou o ministério da defesa russo. Chamou de corruptos todos os membros da pasta.

Na mesma entrevista, Prigozhin atacou, ainda, os integrantes do estado maior das Forças Armadas russas atribuindo a eles a responsabilidade do envio ao campo de batalha de jovens e destreinados soldados.

A cogitada armação serviu, segundo propala-se, para Putin se mostrar como líder forte, a ganhar força para num futuro próximo demitir Shoigu.

No momento, Prigoshin saiu de cena. Deixou São Petersburgo num automóvel e ninguém sabe para onde se deslocou. Na partida, foi aclamado nas ruas como herói e como candidato à sucessão de Putin, em 2024.

Prigoshin poderá já estar no Sudão, onde a sua empresa Meroe Gold explora minas de ouro. Minas dadas em pagamento pela proteção da Wagner. Os contratos envolvem segurança a empresas e aos empresários envolvidos no ramo da mineração.

Financiada pelo Kremlin, a Wagner mantém mercenários no Mali, Sudão, Burkina Faso e Moçambique. A saída dela significaria um duro golpe à influência de Putin na África.

Nesse "perdido" dado por Prigoshin, a Wagner continua as suas ações bélicas comandadas pelo "ministro da defesa", Dmitri Utkin, um siberiano sanguinário e nazista. É íntimo de Putin e possui tatuado na pele símbolos nazistas. Como frisado acima, Utkin, de 52 anos, fundou a Slavonics Corps.

Uma das desculpas esfarrapadas dadas por Putin para invadir a Ucrania foi a de proteger, na região do Dombass, os russos e os filorussos de ataques de organização nazista apoiada pelo presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. Para Putin, o presidente Zelensky é nazista. Não lhe informaram ser Zelensky um judeu.

O dissidente russo Ilya Panomarev, que fugiu para a Ucrânia em 2016 e fundou a chamada "Legião para a libertação da Rússia", sustenta ter havido uma encenação de golpe promovida pela dupla amiga Putin-Prigozhin. Segundo Panomarev, encenação para a Russia "sair do pântano ucraniano e migrar aos poucos para lutas em Mali e na República Centro-Africana"

Toda a milícia privada que atua sob o manto protetor de uma empresa contratada por estado nacional, representa espécie do gênero crime organizado.

A Wagner é uma organização criminosa que afronta o direito internacional público, chamado de direito das gentes, e viola os direitos naturais dos seres humanos pelas suas atrocidades.

Quando esse tipo de milícia privada passa a vender proteção no estrangeiro, quer para proteger ditaduras, quer para manter exploração extrativa de poderosos, quer para as guerras de conquistas imperialistas como a de Putin na Ucrânia, o caso passa a ser de crime organizado transnacional.