Vídeo engana ao dizer que Lula pode perder candidatura
Não é verdade que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pode perder a candidatura à Presidência em 2022 por causa de uma denúncia da Operação Lava Jato, como sugere um post no TikTok. A postagem, que usa um vídeo de 2016, engana ao afirmar que Lula é acusado de corrupção e pode ficar inelegível. Lula foi condenado e preso no âmbito da Lava Jato em 2018, mas foi solto no ano seguinte. Em 2021, teve as condenações anuladas e hoje não é mais alvo de processos da operação. Em 2022, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou a candidatura do petista, dizendo que não há causa legal que o impeça de concorrer.
Conteúdo investigado: Post no TikTok diz que Lula pode perder a candidatura à Presidência antes do segundo turno e mostra um vídeo do ex-procurador da República e hoje deputado federal eleito Deltan Dallagnol (Podemos), que coordenou a força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba de 2014 a 2020. No vídeo, Dallagnol diz que Lula comandou o esquema de corrupção descoberto pela operação e mostra a apresentação de slides que ficou conhecida como "PowerPoint do Lula". Os slides mostram um gráfico com o nome de Lula no centro e setas apontadas para ele, indicando sua suposta relação com evidências levantadas pela Lava Jato.
Onde foi publicado: TikTok.
Conclusão do Comprova: É enganoso vídeo que usa declarações do ex-procurador da Operação Lava Jato Deltan Dallagnol para afirmar que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) "pode perder sua candidatura antes do segundo turno".
A gravação de Dallagnol é de 2016, quando ele fez uma apresentação com um slide que ficou conhecido como "Powerpoint do Lula". Ou seja, o conteúdo verificado tira as declarações do ex-procurador de contexto. Lula já foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá, em São Paulo. Ficou preso de abril de 2018 a novembro de 2019, tendo sido impedido de disputar a eleição presidencial de 2018. Mas, em 2022, ele está apto a concorrer, diferentemente do que afirma o conteúdo verificado.
Não há mais processos que o impeçam de se candidatar, uma vez que, em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou todas as condenações do petista no caso. O ministro Edson Fachin entendeu que Lula não teve seus direitos respeitados já que as decisões não poderiam ter sido tomadas pela vara responsável pela Lava Jato, a de Curitiba, e que o caso deveria ser reiniciado no Distrito Federal. Mas a Justiça do local reconheceu a prescrição dos crimes, e Lula não responde mais por eles.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: A postagem verificada havia registrado 179 mil visualizações, 13,4 mil curtidas, mais de 5,5 mil compartilhamentos e mais de 800 comentários no TikTok até a tarde de 5 de outubro. No dia 6, foi retirada do ar.
O que diz o autor da publicação: O TikTok não permite envio de mensagens privadas entre usuários que não se seguem mutuamente. O Comprova buscou o nome do autor da postagem verificada em outras redes sociais e encontrou no Instagram um perfil com a mesma descrição da conta investigada no TikTok. Contatado, o autor não respondeu à mensagem do Comprova até o fechamento desta verificação.
Como verificamos: Para descobrir a data do vídeo publicado no TikTok, o Comprova fez buscas no Google usando as palavras-chave "Dallagnol", "Lula" e "PowerPoint". Notícias recentes sobre o episódio dizem que o vídeo é de 2016. Fazendo novas buscas, mas limitando os resultados a 2016, o Comprova encontrou notícias da época confirmando que Dallagnol fez naquele ano a denúncia mostrada no vídeo.
Sabendo que o vídeo é antigo, o Comprova buscou novas informações para entender qual foi o desfecho dos processos contra Lula na Lava Jato. O objetivo dessa etapa da verificação foi descobrir se há alguma ação pendente que possa impedir o petista de concorrer à presidência em 2022, mesmo depois de seis anos da denúncia citada no post verificado.
Outro passo da verificação foi buscar, também no Google, informações sobre o status da candidatura de Lula em 2022. Todas as candidaturas submetidas à Justiça Eleitoral passam pelo julgamento da corte e precisam ser aprovadas antes do 1º turno da eleição. Na busca, o Comprova localizou uma notícia do site do TSE informando que, em setembro, o tribunal aprovou o registro da candidatura de Lula ao Planalto.
Vídeo é de 2016
Dallagnol apresentou a denúncia citada na postagem verificada no dia 14 de setembro de 2016. Na época, coordenador da Lava Jato em Curitiba, ele anunciou em um evento aberto à imprensa que o Ministério Público Federal (MPF) acusava Lula de ser o "comandante máximo do esquema de corrupção" identificado pela operação na Petrobras. Segundo Dallagnol, o petista poderia ter interrompido o esquema, mas não o fez.
A denúncia protocolada pelo MPF naquele dia acusava Lula, na verdade, de ter recebido da construtora OAS R$ 3,7 milhões em propina como parte de um acordo de contratos na Petrobras. O valor correspondia a um apartamento tríplex no Guarujá, no litoral paulista. A defesa do ex-presidente disse na época que não havia provas da ligação de Lula com o tríplex.
Lula criticou a apresentação na época. Segundo a defesa do petista, o conteúdo da denúncia protocolada naquele dia havia se perdido "em meio ao deplorável espetáculo de verborragia" de Dallagnol.
Lava Jato e Lula
Alvo da Lava Jato por suspeitas envolvendo um tríplex em Guarujá e um sítio em Atibaia (ambos em São Paulo), o ex-presidente foi condenado em julho de 2017 pelo então juiz Sergio Moro (recém-eleito senador pelo partido União Brasil) a nove anos e seis meses de prisão pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex.
Em janeiro de 2018, os três desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre, votaram para manter a condenação e ampliar a pena para 12 anos e um mês de prisão. Lula sempre se declarou inocente.
Mas ele só foi preso em abril de 2018, após o STF decidir que réus condenados em segunda instância pudessem cumprir pena. Assim, não pôde disputar a eleição presidencial daquele ano, vencida por Jair Bolsonaro, hoje no PL.
Em novembro do ano seguinte, o órgão mudou a jurisprudência, decidindo que esses réus têm direito a aguardar o fim do processo em liberdade, e Lula foi solto, depois de 580 dias.
Em março de 2021, o STF anulou as condenações do petista na operação por entender que ele não teve seus direitos respeitados. Segundo o órgão, os processos não podiam ter tramitado na Justiça de Curitiba. Como mostrou a Folha, "segundo os magistrados, a competência de Moro era restrita a esquemas diretamente relacionados à Petrobras e as acusações contra Lula envolvem outros órgãos públicos que vão além da estatal petrolífera". Em junho do mesmo ano, o tribunal decidiu também que Moro foi parcial em seu julgamento.
Sergio Moro teve diálogos particulares com Dallagnol divulgados pelo The Intercept. Neles, segundo a BBC, o juiz adotava condutas ilegais em parceria com o Ministério Público Federal.
Até então, Lula ainda poderia responder pelas acusações em novos processos, se tramitassem no Distrito Federal. Mas, como mostra a BBC, "esse retorno à estaca zero acabou provocando a prescrição da pretensão punitiva" e Lula, embora não tenha sido julgado inocente, "não pode mais ser julgado nos casos do triplex e do sítio de Atibaia".
Justiça aprovou candidatura de Lula em 2022
O TSE aprovou no dia 8 de setembro o registro da candidatura de Lula à Presidência em 2022. O plenário também deferiu o registro de Geraldo Alckmin (PSB), candidato a vice do petista. O ministro Carlos Horbach disse na ocasião que os dois preenchem as condições de elegibilidade exigidas pela Constituição e pela lei eleitoral e que não há nenhuma causa legal que os impeça de concorrer à eleição.
Antes de examinar os pedidos de registro, Horbach, que foi relator dos processos, rejeitou impugnações (petições) que haviam sido propostas ao TSE contra a candidatura de Lula. Entre elas, estava a de um eleitor que dizia que os efeitos da condenação do ex-presidente no caso do sítio de Atibaia deveriam permanecer, apesar de o Supremo ter anulado o caso em 2021. O tribunal julgou o pedido improcedente.
Outras impugnações foram dos políticos Fernando Holiday e Lucas Pavanato, ambos do partido Novo. Os dois disseram que Lula cometeu abuso de poder ao ser beneficiado por manifestações favoráveis à sua candidatura em shows que haviam acontecido antes da campanha. Horbach rejeitou as petições, dizendo que o julgamento do registro de candidatura não era a via correta para julgar aquele tipo de acusação.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam na internet relacionados às eleições presidenciais de 2022, à pandemia e às políticas públicas do governo federal. Conteúdos falsos, enganosos ou fora de contexto sobre os candidatos tentam manipular a decisão do voto e prejudicam eleitores que buscam ter acesso a informações verdadeiras antes de se dirigir à urna.
Outras checagens sobre o tema: O Comprova verificou outros conteúdos suspeitos sobre os candidatos que disputam a Presidência em 2022. Entre eles, está o que mente ao afirmar que Lula propõe fechar igrejas; o que diz, também de forma mentirosa, que o petista quer abrigar famílias sem teto em casas já com dono; e o vídeo que distorce uma declaração antiga do presidente Jair Bolsonaro sobre direitos trabalhistas.
Este conteúdo foi investigado por Nexo, Folha e Correio do Estado. A investigação foi verificada por GZH, Alma Preta, Plural, CBN, Piauí, O Dia, CNN e O Popular. A checagem foi publicada no site do Projeto Comprova em 6 de outubro de 2022.
O Comprova é um projeto integrado por 40 veículos de imprensa brasileiros que descobre, investiga e explica informações suspeitas sobre políticas públicas, eleições presidenciais e a pandemia de covid-19 compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens. Envie sua sugestão de verificação pelo WhatsApp no número 11 97045 4984.
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