Post tira de contexto decisão do TCU sobre joias recebidas por Bolsonaro
É enganoso post que afirma que o Tribunal de Contas da União (TCU) teria autorizado em 5 de abril o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a ficar com as joias recebidas como presente de líderes estrangeiros e trazidas para o Brasil sem declaração à Receita Federal. Em 24 de março e em 3 de abril, a defesa de Bolsonaro entregou os pacotes com os bens à Presidência, seguindo determinações da corte.
Conteúdo investigado: Vídeo compartilhado no TikTok em 6 de abril reproduz trecho de matéria exibida no "Jornal da Cultura", da TV Cultura, que apresenta o seguinte título: "TCU: Bolsonaro pode ficar com as joias". Sobre a imagem, está escrito: "TCU decidiu quinta 05/04 que Bolsonaro pode ficar com as joias" e outro texto com: "Bora que ainda tem quatro anos".
Onde foi publicado: TikTok.
Conclusão do Comprova: Diferentemente do que diz um conteúdo viral, o Tribunal de Contas da União (TCU) não permitiu em 5 de abril que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ficasse com as joias que recebeu como presente de líderes internacionais enquanto estava em viagem oficial.
Ao Comprova, o Tribunal esclareceu que "não há decisão do TCU nesse sentido" e destacou que a determinação da corte foi de que as joias fossem devolvidas à Secretaria-Geral da Presidência. A decisão foi cumprida em 22 de março e 4 de abril.
Para embasar o conteúdo enganoso, o desinformador utilizou reportagem do "Jornal da Cultura", da TV Cultura, de 9 de março. Na matéria, é noticiado que o ministro do TCU Augusto Nardes decidiu que Bolsonaro poderia ficar com o segundo pacote recebido da Arábia Saudita sem o direito de usá-lo ou vendê-lo.
Essa informação é verdadeira e, inclusive, foi noticiada pelo TCU. Na ocasião, o ministro decidiu que o antigo chefe do Executivo ficasse com as joias, sem vendê-las ou usá-las, "até apreciação definitiva da matéria pelo Tribunal".
Entretanto, em 15 de março, o próprio Augusto Nardes sugeriu alterar a medida cautelar antes publicada, para determinar a devolução das joias por parte de Bolsonaro. Em julgamento na mesma data, foi decidido pela entrega não só das joias, mas, também, das armas recebidas como presente.
Em 22 de março, o TCU determinou por unanimidade que Bolsonaro deveria entregar as joias em agência da Caixa Econômica Federal e as armas - que recebeu dos Emirados Árabes Unidos - à diretoria de Polícia Administrativa da Polícia Federal (PF). Os pertences foram entregues pela defesa do ex-presidente em 24 de março.
Em 4 de abril, o terceiro pacote de joias também foi devolvido pela equipe jurídica de Bolsonaro. A entrega foi feita depois de o Tribunal de Contas da União expedir em 29 de março um alerta ao antigo chefe do Executivo brasileiro para que ele devolvesse "imediatamente" os bens, sob pena de sanção jurídica.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. No TikTok, o conteúdo investigado teve cerca de 50,1 mil curtidas, 11,1 mil compartilhamentos e outros 2,6 mil comentários até esta 5ª feira (20.abr.2023).
Como verificamos: O primeiro passo foi analisar as informações compartilhadas na publicação. A primeira inconsistência que pode ser notada -a data da suposta decisão do TCU- está no conteúdo escrito na imagem.
Além disso, é possível identificar que a matéria usada é do "Jornal da Cultura", da TV Cultura, porque aparece a logo do canal no canto superior direito e a do programa no canto inferior esquerdo.
Em seguida, buscamos no Google por "TCU: Bolsonaro pode ficar com as joias" + "TV Cultura" e encontramos a reportagem original.
Depois, o Comprova entrou em contato com o Tribunal de Contas da União para esclarecer a informação de que o ex-presidente poderia ficar com as joias. A Corte de Contas negou. Também foram procuradas as notícias mais recentes sobre o caso na mídia profissional.
Os presentes de Bolsonaro
Uma série de reportagens do Estadão, publicadas no mês de março, revelaram que três caixas de joias, dadas de presente para Jair Bolsonaro pelo regime da Arábia Saudita, foram levadas pelo ex-presidente ao fim de seu mandato. As 14 peças têm valor estimado entre R$ 17 milhões e R$ 18 milhões, no mínimo.
Conforme o Estadão, em outubro de 2021, um pacote contendo um colar, um anel, um relógio e um par de brincos de diamante, da marca suíça Chopard, avaliados em R$ 16,5 milhões, foram apreendidos pela Receita Federal no aeroporto de Guarulhos depois de terem sido encontrados na mochila de um militar, assessor do então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque.
As joias foram um presente para o então presidente e a ex-primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Os itens permaneceram sob a guarda da Receita Federal, que não cedeu às diversas tentativas do governo de reavê-las.
"À época, até o comando da Receita entrou na força-tarefa para liberar as joias. Mas os servidores do órgão, que têm estabilidade na função e são funcionários de Estado, resistiram às pressões e fizeram valer a lei", diz a reportagem.
Um segundo pacote - também de joias dadas pelo regime saudita - foi entregue pessoalmente para Bolsonaro. O estojo, que chegou ao Brasil pelas mãos da comitiva de Bento Albuquerque, continha um relógio com pulseira em couro, um par de abotoaduras, uma caneta rosa gold, um anel e um masbaha rose gold (um tipo de rosário islâmico). Os itens, avaliados em torno de R$ 1 milhão, são da marca Chopard.
Documentos oficiais confirmam que os itens foram entregues para o ex-presidente no Palácio do Alvorada, em 29 de novembro de 2022, e permaneceram com ele até 24 de março. Na data, o advogado Paulo Amador da Cunha Bueno levou as joias até uma agência da Caixa, localizada na Asa Sul, região central de Brasília, seguindo determinação do Tribunal de Contas da União.
Além disso, a defesa de Bolsonaro fez a entrega de duas armas, um fuzil e uma pistola, dadas de presente pelos Emirados Árabes Unidos em 2019. Na ocasião, Bolsonaro retornou ao Brasil em um avião da Força Aérea Brasileira.
"As armas chegaram à Polícia Federal nas mãos do segundo-tenente Osmar Crivelatti, que foi assessor de Bolsonaro durante seu governo. O advogado Paulo Amador da Cunha Bueno também estava presente no ato da entrega", disse a reportagem do Estadão.
Um terceiro pacote de joias foi levado por Bolsonaro ao final de seu mandato. Assim como os anteriores, o presente foi dado pelo regime saudita.
O Estadão apurou que os itens inclusos são um relógio da marca Rolex, de ouro branco e cravejado de diamantes; uma caneta da marca Chopard prateada com pedras incrustadas; um par de abotoaduras em ouro branco com um brilhante cravejado no centro; um anel em ouro branco com um diamante no centro e um masbaha de ouro branco com pingentes cravejados em brilhantes.
Juntas, as peças são avaliadas em torno de R$ 500 mil. Ainda que semelhante aos itens do segundo pacote, são conjuntos diferentes.
Ao contrário dos outros dois pacotes, este foi recebido em mãos por Bolsonaro quando ele esteve em Doha, no Catar, e em Riade, na Arábia Saudita, em outubro de 2019. Um ano e oito meses depois, em junho de 2022, documentos oficiais confirmam que as joias estavam "sob a guarda do Presidente da República".
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova tentou entrar em contato com o perfil @sergiotoledo83 por meio do TikTok, porém, a rede social não permite que usuários que não se seguem mutuamente enviem mensagem um para o outro. Não foi possível localizar outros endereços para contato.
O que podemos aprender com esta verificação: É preciso sempre buscar os fatos mais atualizados e recentes. Desinformadores costumam selecionar informações que contribuem para suas falsas narrativas e que não consideram os desdobramentos dos episódios.
Nesse caso, por exemplo, de fato, o TCU determinou, ainda em março, que Bolsonaro poderia manter a posse das joias até futura decisão sobre o processo. Entretanto, logo depois, a Corte de Contas emitiu nova decisão sobre o assunto: o ex-presidente precisou entregar todos os presentes, contrariando o que diz a publicação investigada neste texto.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: Em março, por conta do caso envolvendo Bolsonaro e também seus antecessores, o Comprova publicou um Comprova Explica para ajudar os leitores a entenderem o que diz a lei brasileira sobre presentes dados aos presidentes da República.
Este conteúdo foi investigado por Poder 360 e Correio de Carajás. A investigação foi verificada por Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, Plural Curitiba e UOL. A checagem foi publicada no site do Projeto Comprova em 20 de abril de 2023.
O Comprova é um projeto integrado por 40 veículos de imprensa brasileiros que descobre, investiga e explica informações suspeitas sobre políticas públicas, eleições presidenciais e a pandemia de covid-19 compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens. Envie sua sugestão de verificação pelo WhatsApp no número 11 97045 4984.
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