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Ouvidoria vê "fortes indícios" de participação de policiais em chacina em Campinas (SP)

Eduardo Schiavoni

Do UOL, em Americana (SP)

14/01/2014 14h28Atualizada em 14/01/2014 16h07

A Ouvidoria das Polícias de São Paulo vê “fortes indícios” de que a chacina que deixou 12 mortos na madrugada de domingo (12) em Campinas (a 93 km de São Paulo) tenha sido cometida por policiais.

De acordo com o ouvidor Júlio César Fernandes Neves, “nove entre dez” depoimentos tomados até o momento apontam para a participação de policiais. 

“Os indícios são muito fortes. De cada dez pessoas que falam do caso, nove citam a participação de policiais”, adiantou Neves.

Entre esses indícios, segundo o ouvidor, estão declarações de familiares que deram conta de que os assassinos usavam sobretudo e coturno da polícia. Além disso, para o ouvidor, as características de ação de um grupo de extermínio fazem com que a Ouvidoria faça o acompanhamento dessas investigações "para que nada seja acobertado", afirmou.

Segundo Neves, o objetivo da investigação é determinar se houve alguma conduta ilegal de policiais paulistas e, se for o caso, determinar a punição, que pode incluir a expulsão da corporação, além da ação na esfera criminal e sua respectiva pena.

O ouvidor chegou à cidade na manhã de hoje para acompanhar o enterro de uma das vítimas, no cemitério dos Amarais, e chegou a conversar com o pai de Sérgio Donizete Silva Junior, 18, o último a ser morto no bairro Vista Alegre.

A reportagem do UOL falou com duas famílias de pessoas mortas na chacina. Em ambos os casos, as pessoas, que pediram para não serem identificadas, confirmaram a informação dada por Neves.

“Eu não estava presente, mas uma pessoa que viu o momento da abordagem me disse que quem atirou estava de farda. Para nós, foi a polícia que o matou”, disse a tia de uma das vítimas.

Segundo o relato de um amigo de outra das vítimas, que estava com ele no momento do assassinato, três homens chegaram em um Celta e colocaram todas as pessoas de costas.

  • Arte UOL

“Eles sabiam em quem iam atirar. Estávamos de costa e ouvimos três tiros. Nenhum errou. Ouvimos um grito que mandava a gente sair correndo, e foi o que fizemos”, disse a testemunha.

Do grupo, que tinha cinco pessoas, apenas uma foi alvejada.

O Secretário de Estado da Segurança Pública, Fernando Grella, deve fornecer detalhes sobre as investigações, que foram declaradas prioritárias pela polícia, na tarde desta terça-feira (14).

Chacina

Todos os mortos na chacina eram do sexo masculino, com idades entre 17 e 30 anos, e sete tinham passagens pela polícia. Os corpos começaram a ser enterrados nesta manhã.

 

Um outro corpo, carbonizado, foi encontrado na segunda-feira (13), e a polícia investiga se a morte estaria ligada à chacina.

A polícia também começou a tomar o depoimento dos familiares. Além da Ouvidoria, uma força-tarefa composta por delegados de São Paulo e de Campinas investiga as mortes.

O Ministério Público de São Paulo também participa das investigações O promotor responsável é Ricardo Silvares, que teve na tarde de segunda-feira uma reunião com os delegados da força-tarefa.

Ele foi procurado para comentar o caso, mas não foi localizado.

Toque de recolher

De acordo com a polícia, não está descartada a hipótese de que a onda de mortes tenha sido originada por conta do assassinato de um policial militar que acabou baleado, em sua folga, durante uma tentativa de assalto a um posto de combustível na região do bairro de Ouro Verde, um dos mais populosos e violentos de Campinas.

O acerto de contas entre quadrilhas rivais também é cogitado pela polícia, embora a hipótese tenha perdido força.

A PM informou, em nota, que a Corregedoria acompanha as investigações e que houve reforço de policiamento na região dos assassinatos.

Apesar disso, segundo parentes e amigos das vítimas, a região onde ocorreram as mortes está “tomada pelo medo” e é alvo de uma espécie de toque de recolher tácito.

“Estão falando que a coisa não vai ficar só nisso e que, para cada um dos mortos, 13 policiais vão morrer. Por isso, todo mundo está ficando em casa. Só sai quem tem que trabalhar, e as ruas estão vazias”, disse o amigo de uma das vítimas que pediu para não ser identificado. (Com Estadão Conteúdo)