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Ele perdeu a filha por Samu atrasar transferência: "Não fizeram esforço"

Heloisa Mathias Lisboa, de 1 ano, morreu após demora na transferência de hospital - Arquivo pessoal
Heloisa Mathias Lisboa, de 1 ano, morreu após demora na transferência de hospital Imagem: Arquivo pessoal

Aline Torres

Colaboração para o UOL, em Florianópolis

06/03/2019 04h00

"Eles nunca vão sentir nossa dor, mas esperamos por justiça". A frase dita por Alexandro Lisboa, 33 anos, em entrevista ao UOL mostra o alívio sentido após a Vara Criminal de Mafra, em Santa Catarina, acatar a denúncia contra nove profissionais do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) que foram responsabilizados pela morte de Heloísa, de 1 ano, filha de Alexandro, em junho de 2017.

O alívio pela decisão judicial ajuda a diminuir a indignação que sente pelas circunstâncias da morte da filha. Na manhã de 8 de junho de 2017, o Hospital São Vicente de Paulo, em Mafra (SC), solicitou que o Samu transferisse Heloisa Mathias Lisboa com urgência para a UTI do Hospital Infantil de Joinville, a 130 quilômetros de distância. Ela estava com complicações no tratamento para broncopneumonia.

A equipe do Samu, porém, alegou que não faria a transferência por falta de combustível na ambulância. Tanto os pais de Heloisa quanto a direção do São Vicente de Paulo ofereceram dinheiro para abastecer o veículo. Mas o Samu recusou, segundo os familiares.

Sem infraestrutura hospitalar, o quadro clínico dela piorou. Às 17h, Heloisa precisou ser entubada e recebeu ventilação mecânica. Perto da meia-noite foi iniciada a transferência da bebê, mas a ambulância não tinha combustível suficiente para fazer todo o trajeto e houve uma nova parada após 45 km. 

O veículo parou em um posto de combustível em Rio Negrinho e uma ambulância, vinda de Jaraguá do Sul, chegou apenas às 3h, mais de 15 horas após o pedido de urgência para internação. A bebê chegou muito debilitada a Joinville e não resistiu após sofrer três paradas cardiorrespiratórias em 10 de junho de 2017.

Segundo o laudo do serviço de medicina pericial do Ministério Público (MPSC), que fez a denúncia, os riscos para Heloisa seriam mínimos caso a transferência tivesse sido feita, enquanto ela apresentava quadro estável, antes da ventilação mecânica.

No total, nove profissionais do Samu foram denunciados por homicídio com dolo e omissão, pois assumiram o risco da morte da criança. São réus quatro dirigentes do Samu (que recusaram o dinheiro para o abastecimento da ambulância), dois médicos socorristas e três médicos reguladores regionais (que podiam pedir recursos e serviços públicos ou privados em uma emergência e não fizeram). Os servidores têm dez dias para apresentar a defesa.

Após o anúncio da Justiça de Santa Catarina, Alexandro explicou que a família ainda tenta se recuperar da perda de filha.

A Helô faz parte da nossa vida. A Manuela (de 6 anos, filha mais nova do casal) reza por ela todas as noites, fala que a mana foi morar com Jesus

Alexandro Lisboa, pai de Heloisa

O pai explica que Manuela sofre de bronquite, a mesma doença que fez com que Heloísa fosse internada em junho de 2017, e, por isso, o casal não demorou a perceber que algo estava errado com a filha mais nova.

"Ela (Heloisa) tinha algumas crises, mas tratávamos com os remedinhos dela e inalação. Naquela madrugada, cheguei do trabalho de madrugada e achei ela ruinzinha. Minha mulher tinha seguido o tratamento, mas achamos melhor ir para o plantão, em Mafra. Só que não imaginávamos que fosse acontecer essa tragédia. É uma dor que vamos carregar pela vida inteira. Não existe recuperação", disse. 

Além de Manuela, o casal ainda tem mais um filho: Raul, de 12 anos. Alexandro espera que os réus sejam condenados num caso que entendem como de "absoluta negligência". "Não fizeram nenhum esforço pela vida dela", diz.

Outro lado

O UOL procurou as assessorias dos hospitais São Vicente de Paulo, em Mafra (SC), e Infantil de Joinville, a assessoria de imprensa do Samu de Santa Catarina e as defesas dos nove citados no processo, mas não houve resposta até a publicação da matéria. Se os posicionamentos forem enviados, a reportagem será atualizada.