Movimento negro protesta contra racismo em frente a livraria em João Pessoa
No fim da tarde de sexta-feira (4), em João Pessoa (PB), ativistas da Organização Bamidelê, ligada ao Movimento de Mulheres Negras, protestaram em frente à uma unidade da rede de livrarias Leitura, no Shopping Mangabeira, devido a um ato de racismo cometido nas dependências da loja, contra dois clientes negros na última quarta-feira (2).
A arqueóloga Ana Dindara, 25, e Lucas Mendes, cineasta e assistente social, entraram na livraria para fazer compras, na unidade do bairro de Mangabeira. Ana relatou ao UOL, que começou a ser perseguida por um vendedor de forma desrespeitosa. " Eu entrei na Leitura justamente para comprar livros falando sobre racismo e mulheres negras. Quando eu fui fazer o comparativo dos valores, abri a bolsa para pegar o celular, vi que na internet estavam muito mais baratos. Aí eu decidi comprar outras coisas, fui até o setor de papelaria e percebi que tinha um vendedor atrás de mim, me seguindo, me encarando, ficou aquele constrangimento. Olhei e vi que apenas eu estava sendo seguida, sempre que eu abria a bolsa para retirar o celular ficava aquele estresse, ele olhando fixamente para mim de braços cruzados e me seguindo."
Segundo ela, ao se dirigir até o caixa, o vendedor continuou seguindo-a. Ana pediu que o amigo permanecesse ao seu lado, que confirmou o desconforto com a atitude do funcionário. Um terceiro amigo, branco, foi bem atendido, segundo a vítima e não teve nenhum problema. Depois de realizarem o pagamento dos produtos, pediram para falar com um supervisor, foram informados que ele não estava, mas o coordenador os atendeu. Ao perguntarem qual era a política interna de treinamento dos vendedores com os clientes iguais a eles e explicarem o que estava ocorrendo, foram surpreendidos. "Gente como vocês são sujeitos assim, disse o coordenador. Dando a entender que pessoas negras, como a gente, poderiam roubar na loja e, por isso, o vendedor ficou atrás de mim", ressaltou Ana.
As vítimas sentiram que o coordenador estava concordando com a situação e não teriam nenhuma assistência. "O vendedor então veio para cima de mim, eu me afastei e o coordenador colocou a mão no peito dele, segurando para ele não avançar." Os clientes saíram da loja assustados e acionaram um advogado, que chegou prontamente. "Fora da loja, percebemos que os funcionários ficaram rindo e dando gargalhadas, um desrespeito enorme. Foi isso que me mobilizou a fazer um boletim de ocorrência", disse ela.
O boletim de ocorrência foi registrado na Delegacia de Polícia Civil da capital paraibana. De acordo com Ana, a Leitura entrou em contato e informou que esse não é o treinamento dado aos funcionários, mas não recebeu nenhum pedido de desculpas da rede. "A gente fez o boletim pois compreendemos que foi uma atividade racista, de constrangimento. Eu fui e voltei várias vezes pelos corredores para pegar vários objetos diferentes e ele ficou me coagindo a todo momento, até eu sair da loja."
As vítimas divulgaram o caso nas redes sociais, que ganhou repercussão nacional. Outros casos começaram a ser relatados nos comentários das postagens sobre situações semelhantes no local. "Precisamos ter mais respeito e igualdade. Para nós, que somos negros, é super comum entrarmos nos lugares e não sermos atendidos. É preciso conscientizar, as empresas devem criar projetos e compreender que as pessoas negras e LGBTQI+ devem ter um atendimento tão bom quanto os demais." Para finalizar, ela destaca que recebeu apoio do movimento negro, movimento das mullheres negras, comunidade LGBTQI+ e professores da UFPB.
Ontem à noite, a Livraria Leitura se manifestou através de nota:
"Sobre o episódio ocorrido e relatado por clientes no dia 02/12, em uma de nossas unidades, viemos a público nos pronunciar sobre o relato: a empresa lamenta profundamente o ocorrido e afirma que está à disposição das autoridades para auxiliar no esclarecimento dos fatos, inclusive com a liberação das imagens do circuito interno de câmeras. Afirma ainda que decidiu por afastar, temporariamente, o funcionário diretamente envolvido para que seja garantida a total isenção da apuração. A leitura atua há 53 anos com transparência e total respeito aos seus clientes, no mercado que, acima de tudo, busca o aperfeiçoamento do ser humano, por meio de educação, formação e leitura, como o próprio nome da rede de lojas diz. Ao longo de todos os seus anos de existência, a Livraria Leitura construiu uma política de absoluto respeito à igualdade racial. Lamentamos que avaliações precipitadas cheguem ao público sem que antes todos os fatos tenham sido esclarecidos. Por fim, afirmamos nosso total respeito a todos os nossos clientes e parceiros".
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