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Fiéis vão a igrejas na fase vermelha em SP: 'Espiritualidade acima de tudo'

Templo cristão recebeu fiéis no primeiro sábado da fase vermelha no estado de São Paulo - Anahi Martinho/UOL
Templo cristão recebeu fiéis no primeiro sábado da fase vermelha no estado de São Paulo Imagem: Anahi Martinho/UOL

Anahi Martinho

Colaboração para o UOL, em São Paulo

06/03/2021 22h18

Fiéis foram a igrejas da cidade de São Paulo hoje, primeiro dia em que todo o estado está na fase vermelha do Plano São Paulo, de controle da pandemia do novo coronavírus. A reportagem acompanhou atividades em quatro igrejas cristãs na capital e notou que alguns cultos e missas apresentam alto risco de contágio pela covid-19. Os responsáveis pelos protocolos nos templos afirmaram ao UOL que estavam cumprindo todas as determinações do governo estadual.

Na nova fase vermelha, as atividades religiosas foram liberadas, depois que o governador, João Doria (PSDB), as incluiu na categoria "serviços gerais", junto com bancos, lotéricas e hotéis. As celebrações devem acontecer mediante restrições, sendo a principal delas operar com apenas 30% da ocupação.

Na Igreja da Consolação, no centro da capital, que tem capacidade para 500 pessoas, pouco mais de 30 fiéis estavam sentados em bancos intercalados na missa do meio-dia, rezada pelo padre Assis.

A catedral, datada de 1799, tinha álcool gel na entrada e na comunhão, medição de temperatura na porta e adaptação de alguns rituais. O Pai Nosso, por exemplo, foi rezado sem dar as mãos, como normalmente ocorria nas celebrações antes da pandemia, e o momento de saudar a comunidade com a "paz de Cristo", em que todos se abraçam, foi suspenso.

O membro da pastoral Edson Silva afirmou que as missas estão limitadas a 120 fiéis. "Se quiser vir na de domingo, tem que chegar cedo. É triste, mas somos obrigados a fechar a porta", afirmou. "Enquanto a pandemia durar, não vamos ver essa igreja cheia."

Na Igreja de Nossa Senhora Aparecida, em Moema, zona sul, cerca de 80 fiéis assistiram à missa da tarde, com três assentos de distância entre cada um, álcool gel e aferição de temperatura. A igreja tem capacidade para 550 pessoas.

Arlete Lencioni, 72, moradora do bairro, afirma que tem ido à igreja duas vezes por semana. "É atividade essencial, sim, principalmente neste momento. A espiritualidade tem que estar acima de tudo", diz.

Na saída da missa, outra fiel da mesma faixa etária reclamava com o padre Sidney, dizendo que "[com o padre] de máscara, não dá para ouvir a Palavra".

"Infelizmente, tenho que rezar a missa de máscara, não tem outro jeito", disse o pároco, que encerrou a celebração pedindo a Deus por "imunização rápida e para todos". A mulher retrucou: "só estou sendo sincera, não dá para ouvir nada".

Marcos Alberto, funcionário da paróquia, que atuou no cumprimento dos protocolos, afirma que a igreja é fechada após atingir o limite máximo de 140 fiéis. "Se chegar mais, não entra. Estamos cumprindo as determinações."

Bispos em casa

Segundo a coluna Monica Bergamo, da Folha de S. Paulo, apesar de as igrejas estarem abertas, a Arquidiocese de São Paulo fechou os escritórios da cúria, onde ficam os bispos e o arcebispo dom Odilo Scherer. A medida teria deixado padres indignados, uma vez que membros da alta cúpula estão sendo preservados, enquanto eles seguem se arriscando com as igrejas abertas.

Segundo a CNBB, 1.455 padres já tiveram covid-19 e 65 morreram. "Fechamos a cúria para preservar a saúde dos trabalhadores e mantivemos igrejas e expedientes paroquiais abertos para servir o povo e socorrer pobres e enfermos", afirmou dom Odilo à coluna.

Fonte de informação e convicção

A Renascer Arena, sede da igreja Renascer em Cristo, abriu o culto de sábado para 1.200 fiéis previamente cadastrados. A capacidade total da arena é de 5.000 pessoas. Para entrar, além de máscaras, álcool gel e temperatura aferida, era preciso ter pulseira e nome na lista. A reportagem foi barrada.

Apesar de todos os cuidados e da boa ventilação natural da arena, foi possível notar que alguns protocolos foram descumpridos. Havia muita movimentação, fiéis em pé, colados uns nos outros e até uma equipe fazendo coreografias na frente do palco. O protocolo sanitário do governo para atividades religiosas afirma que "todas as pessoas devem estar sentadas" e que os "coros devem ser temporariamente suspensos".

Segundo o porta-voz da Renascer em Cristo, o advogado Roberto Ribeiro Jr., o culto de sábado, que costuma ser o mais lotado, teve o horário alterado e a duração reduzida. O evento costuma começar às 17h e terminar às 22h, mas devido à fase vermelha foi iniciado às 16h30 e encerrado às 20h.

"É uma atividade essencial para o ser humano. Assim como o pão é alimento para o corpo, a igreja é para a alma. Nós prestamos um grande serviço ao trazer consolo e conforto. E a igreja é também uma fonte de informação e de convicção", disse o porta-voz.

"Somos a favor da vacinação e os próprios líderes postam fotos, vídeos de parentes tomando a vacina. Estamos incentivando os fiéis a se vacinarem", afirmou.

Após se identificar e conversar com Ribeiro Jr., a reportagem foi impedida de tirar fotos e teve que deixar o local.

Bíblia em mãos

No Templo de Salomão, sede da Igreja Universal do Reino de Deus, com capacidade para 9.549 pessoas, os fiéis estavam mais organizados.

No culto "Reunião do Espelho", ministrado pelo Bispo Júlio Freitas, havia pouca movimentação e os fiéis permaneceram sentados na maior parte do tempo, em poltronas intercaladas.

Mulheres vestidas com túnicas brancas trabalhavam na aferição de temperatura, distribuição de álcool gel e faziam o controle de acesso, acomodando os fiéis nos assentos disponíveis.

Mas, ainda que operando com 30% da ocupação máxima, a nave central de 70 mil metros quadrados não tem janelas nem nenhuma ventilação natural.

Durante o culto, o Bispo Júlio Freitas orientou que os fiéis andem sempre com a bíblia em mãos, caso sejam abordados por policiais.

"Neste momento de lockdown, venha sempre com a sua bíblia em mãos, pois ao ser abordado por uma autoridade, você vai dizer: 'estou vindo da casa de Deus, e indo para a minha casa'. E assim nenhuma autoridade vai desconfiar da sua saída", disse.

Recorde na média de mortes

O Brasil atingiu nesta semana mais de 10 mil mortes por causa da covid-19. Foram contabilizados 10.939.320 casos e 264.446 mortes desde o início da pandemia, segundo dados do consórcio de imprensa do qual o UOL faz parte, consolidados às 20h de hoje.

O país registrou 1.498 mortes pela covid-19 em 24 horas. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil nos últimos sete dias chegou a 1.455, a maior desde o começo da pandemia.

A fase vermelha em todo o estado de São Paulo vale inicialmente até o dia 19, mas a medida pode ser prorrogada. O objetivo é controlar os números de casos e mortes em território paulista e desafogar o sistema de saúde. Hoje, 79,5% dos leitos de UTI do estado estavam ocupados —um novo recorde da pandemia.