Como mulher de Queiroz, viúva de miliciano tem domiciliar concedida
O ministro Reynaldo Soares da Fonseca do STJ (Superior Tribunal de Justiça) concedeu ontem (26) prisão domiciliar, com uso de tornozeleira eletrônica, à viúva do miliciano Adriano da Nóbrega, morto em confronto com forças de segurança da Bahia em fevereiro do ano passado.
"A investigada somente poderá sair de sua residência, sem prévia autorização judicial, em caso de absoluta necessidade de saúde, com comunicação posterior e documental à Justiça", escreveu Fonseca, que é relator do processo.
Na decisão, o ministro cita o fato de Julia ser mãe de uma menina de 9 anos, que se encontra sob os cuidados de uma terceira pessoa, sem qualquer vínculo familiar. "A verdade é que a criança não está sob os cuidados de uma avó, de uma tia ou de um parente. O interesse que deve prevalecer é, portanto, o da criança. Prioridade absoluta [..] Assim sendo, a fim de proteger a integridade física e emocional da filha menor e pela urgência que a medida requer, mister autorizar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar".
Julia Emilia Mello Lotufo é considerada foragida pela justiça. No dia 22 de março, durante a Operação Gárgula - que investiga suposta organização criminosa responsável por movimentação financeira, lavagem de dinheiro e agiotagem do grupo chefiado pelo miliciano - a polícia tentou prendê-la, mas ela não foi localizada. Julia é acusada de ocultar o patrimônio da quadrilha até mesmo após a morte de Adriano.
A defesa da viúva nega que ela esteja foragida e diz que ela só não se entregou ainda por temer pela sua vida e de sua filha. "O pedido de revogação de sua prisão já foi feito e encontra-se no aguardo de decisão pelo Poder Judiciário. Nele foram levados ao conhecimento do juízo fatos que foram omitidos pelos órgãos investigativos no requerimento de prisão, os quais bem demonstram a fantasia em que se configura a acusação posta", afirmou a defesa em nota.
Acusações contra Julia
De acordo com o MPRJ (Ministério Público do Rio de Janeiro), Julia fazia parte de uma organização criminosa responsável pela movimentação financeira e lavagem de dinheiro obtido por Adriano da Nóbrega em seus crimes. Os denunciados praticaram crimes de agiotagem e lavagem de dinheiro em favor do miliciano.
As manobras procuravam a ocultação e dissimulação da origem do dinheiro ilegal. A denúncia do MPRJ, oferecida à Justiça em 20 de dezembro do ano passado, aponta que a partir de 2017 até 9 de fevereiro de 2020, Rodrigo Bittencourt, Julia, Carolina Nicolau, Daniel Haddad, Carla Fontan e Luiz Carlos Felipe Martins (PM morto no dia 21 de março) , sob as ordens de Adriano, atuaram na concessão de empréstimos a juros exorbitantes a terceiros (até 22%). Eles usavam empresas de fachada na atuação.
Era a Julia que Rodrigo, Daniel e Luiz Carlos se reportavam para prestar contas sobre os valores pertencentes do então chefe, que eram oferecidos nos empréstimos ou para a constituição de outra sociedade empresária, a Lucho Comércio de Bebidas, suspeita de ter sido utilizada para a lavagem de dinheiro, cujos sócios eram Rodrigo Bittencourt e Carla Fontan.
O MPRJ também diz que, alguns meses após a morte de Adriano, Rodrigo e Carla transferiram todo o capital social da Lucho a Lucas Lotufo e David Lotufo, irmãos de Julia. A alteração contratual evidencia, segundo os investigadores, que Julia permaneceu agindo para ocultar e administrar o patrimônio de Adriano, beneficiando-se diretamente do resultado dos crimes por ele praticados.
A investigação aponta também que Julia, assim como Luiz Carlos Felipe, atuou na dilapidação do patrimônio de Adriano com a venda imediata de ativos de alta liquidez.
Morte Adriano da Nóbrega
Adriano da Nóbrega foi morto em confronto com forças de segurança da Bahia em fevereiro do ano passado, em um sítio onde se escondia na cidade de Esplanada. Ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais), ele era tido como chefe do grupo de matadores de aluguel conhecido como "Escritório do Crime", que age em Rio das Pedras e adjacências, na Zona Oeste da capital fluminense.
Adriano já foi investigado por suspeita de envolvimento nas mortes da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. A linha de investigação, no entanto, não evoluiu. Em depoimento à Polícia Civil do Rio de Janeiro em agosto de 2018, disse "não se recordar ao certo" onde estava na noite de 14 de março daquele ano - data em que a vereadora e seu motorista foram mortos.
Adriano entrou para a PM fluminense no ano de 1996. Quatro anos depois, concluiu o curso de operações especiais do Bope. Na corporação, fez amizade com Fabrício de Queiroz, que trabalhou como assessor do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), quando este foi deputado estadual. Anos depois, Queiroz indicou a mãe e a mulher de Capitão Adriano para trabalhar no gabinete do filho mais velho do presidente da República, Jair Bolsonaro.
Segundo o MPRJ, Queiroz usou contas bancárias controladas por Adriano para lavar parte dos recursos obtidos em um suposto esquema de "rachadinha" no antigo gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio).
Adriano chegou a ser homenageado por Flávio Bolsonaro com a Medalha Tiradentes, a mais alta honraria da Assembleia Legislativa. Era o ano de 2005, e ele estava preso sob acusação de cometer homicídio.
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