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Polícia tem 24 h para dizer se mantém presa acusada de queimar Borba Gato

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

29/07/2021 19h27Atualizada em 30/07/2021 15h58

A juíza Gabriela Marques da Silva Bertoli, do Departamento de Inquéritos Policiais da Capital, decidiu dar um prazo de 24 horas para a Polícia Civil se manifestar sobre a necessidade de manter Géssica de Paula Silva Barbosa atrás das grades. Presa desde ontem, Géssica é acusada de ter participado do incêndio à estátua de Borba Gato em Santo Amaro, zona sul de São Paulo.

Géssica é companheira de Paulo Roberto da Silva Lima, ativista conhecido como Galo, detido ontem após se apresentar à polícia afirmando ter sido um dos autores da ação. Juntos, eles têm uma filha de 3 anos. Por isso, a defesa pediu a conversão da prisão temporária dela em domiciliar.

"Não há previsão legal para consulta do delegado no caso de uma liberdade", disse ao UOL o advogado André Lozano, que a defende. Procurado pela reportagem, o Tribunal de Justiça de São Paulo afirmou que o processo tramita em segredo de Justiça.

"Géssica é uma mãe com uma filha de 3 anos, cuida do irmão de 9 anos, e existe já uma decisão do STF [Supremo Tribunal Federal], existe lei dizendo que ela deve ser solta. Que ela deve ser, no mínimo, colocada em prisão domiciliar. E ela continua presa por mais 24 horas. Com isso, a polícia tenta retardar a sua soltura

O defensor se refere a decisão da Corte de 2018 que veda prisões de mulheres responsáveis legais por criança menores de 12 anos. À época, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal determinou que elas fossem soltas e cumprissem prisão domiciliar enquanto aguardavam julgamento.

Estátua do Borba Gato foi queimada por manifestantes no útimo sábado - Gabriel Schlickmann/Ishoot/Estadão Conteúdo - Gabriel Schlickmann/Ishoot/Estadão Conteúdo
Estátua do Borba Gato foi queimada por manifestantes no útimo sábado
Imagem: Gabriel Schlickmann/Ishoot/Estadão Conteúdo

De acordo com a defesa, Géssica foi presa porque o telefone utilizado por Galo está no nome dela. No pedido de HC, o advogado argumenta que ela não estava presente no momento em que a estátua foi incendiada.

Na manhã de hoje, Jacob Filho impetrou um pedido de Habeas Corpus para o casal no Departamento de Inquéritos Policiais da Capital e no Tribunal de Justiça do estado. "Não há qualquer indício capaz de ligar Géssica à manifestação política que ateou fogo à Estátua Borba Gato", diz trecho do documento.

Para Jacob Filho, a prisão usou como base o compartilhamento de uma postagem no Instagram com a frase: "Toda revolução é necessária para que o povo entenda que não devemos nos calar diante ao opressor!".

Sobre Galo, o advogado argumenta que o ativista se apresentou espontaneamente antes da expedição do mandado de prisão, entregando inclusive o seu aparelho celular para "cooperar com as investigações".

Paulo Roberto da Silva Lima se apresentou à polícia ontem - Herculano Barreto Filho/UOL - Herculano Barreto Filho/UOL
Paulo Roberto da Silva Lima se apresentou à polícia ontem
Imagem: Herculano Barreto Filho/UOL

Morador do Jardim Guarau, na zona oeste da capital, Galo ganhou o apelido por conta de uma moto 7 Galo que usava para trabalhar como motoboy. Em março de 2020, denunciou as condições de trabalho da categoria durante a pandemia, de onde surgiu o coletivo Entregadores Antifascistas.

"O ato foi para abrir um debate. Em nenhum momento, foi feito para machucar alguém ou querer causar pânico. Que as pessoas agora decidam se querem ter uma estátua de 13 metros de altura que homenageia um genocida e um abusador de mulheres", disse ontem ao se apresentar à polícia.

Borba Gato

Estátua de Borba Gato, em Santo Amaro, também amanheceu coberta de tinta em 30 de setembro de 2016 - Reprodução/Twitter - Reprodução/Twitter
Estátua de Borba Gato, em Santo Amaro, também amanheceu coberta de tinta em 30 de setembro de 2016
Imagem: Reprodução/Twitter

Inaugurada nos anos 1960 a estátua de Borba Gato gera polêmicas desde que foi instalada na Praça Augusto Tortorelo de Araújo, no bairro de Santo Amaro.

O monumento homenageia Borba Gato, do grupo de bandeirantes paulistas que exploraram territórios no interior do país, escravizando indígenas e negros entre os séculos 16 e 17, segundo obras como "Vida e Morte do Bandeirante", de Alcântara Machado, de 1929.

Em 2016, a estátua foi atacada com um banho de tinta. No ano passado, em meio aos protestos #BlackLivesMatter lançarem ao rio uma estátua de um traficante de escravos em Bristol, no Reino Unido, o debate ganhou força nas redes sociais brasileiras pelo histórico do bandeirante.

À época, a subprefeitura de Santo Amaro solicitou a instalação de gradis e vigia 24 horas pela Guarda Civil Metropolitana.