Mulher é denunciada por injúria racial após atacar cabelo de meninas negras

Duas crianças de dois e nove anos foram vítimas de injúria racial ao serem agredidas por meio de mensagens compartilhadas nas redes sociais. Uma mulher resolveu responder à postagem da mãe delas de que as crianças teriam cabelos de "raiz dura", "ruim", além de dizer que a mãe seria feia e "precisa se cuidar". O caso ocorreu no último dia 2, em São Gonçalo (RJ) e foi registrado em ocorrência policial.

A autora dos comentários foi identificada como Érica Gomes de Andrade. Ela chegou a dizer que as crianças precisariam ser levadas a um salão de beleza para "tirar as melecas". Ninguém ainda foi intimado para prestar depoimento sobre o episódio, que está sendo investigado pela 72ª delegacia da Polícia Civil do Rio de Janeiro, no bairro Mutuá.

Relacionadas

Racismo no Leblon: 'Dor enorme', diz jovem negro após Justiça arquivar caso

Entidades denunciam racismo após pastor demonizar imagens de religião afro

Movimento negro sofre ataque virtual com símbolos nazistas e racismo, em SC

A psicóloga Roberta Guilherme Massot, 36, contou que publicou um vídeo nos stories em uma rede social mostrando a filha de dois anos dizendo que gostaria de ir para a escola, pois a irmã, que tem nove, estava indo à unidade escolar. No dia seguinte, ao acordar, Massot foi surpreendida com as mensagens agressivas.

A mãe chegou a explicar que o cabelo da filha é crespo, mas recebeu ofensas insistentes: "a raiz dela é dura mesmo. Não é crespa, não", escreveu a agressora. Massot respondeu que "por essas e outras, precisamos falar sobre racismo, para pessoas como você aprenderem a ser mais sensíveis e menos inconvenientes." Érica Andrade teria seguido afirmando que "se está nas redes sociais eu falo o que eu quiser. (...) Leve suas filhas ao salão e aproveita e tira a meleca delas. Suas filhas são feias, melequentas e raiz de cabelo ruim. (...) Vai se cuidar também que você não é nada bonita".

A psicóloga disse que a mulher não faz parte de seu ciclo de amizades, mas que a conheceu na igreja que frequenta. Ela diz que há cerca de dez anos, a agressora deixou de ir ao local. "Acho que ela passou a me seguir logo depois que a conheci na igreja, mas não temos amizade. Nunca fomos de trocar conversa", explicou em entrevista ao UOL.

Roberta Massot diz ter ficado em "choque", que tentou responder, mas quando percebeu que as ofensas não pararam, resolveu bloquear o contato. "Parece que congelei. Veio uma mistura de revolta, a ficha foi caindo e veio a tristeza. Foi quando resolvi postar a conversa para expor a situação. Eu ainda pensei em não levar o caso à polícia, mas o apoio das pessoas me deu coragem para fazer a denúncia", conta.

A psicóloga disse que teme pela vida dela e das filhas dela porque acredita que seu caso não seja o único. "Pelo menos cinco pessoas entraram em contato comigo relatando que ela as agrediu pela internet cometendo injúria racial, gordofobia e fez outras humilhações", destacou. "Registrei a ocorrência por todas as pretas que não tiveram coragem de denunciar o crime que sofreram. Também para que vítimas tenham coragem de se posicionar e não deixem passar esse tipo de situação, por mais que doa".

A advogada de Massot, Michelle Avelar Vargas, destaca que injúria é um crime contra a honra assegurado como inviolável. "Cabe ação de indenização para reparação dos danos morais e materiais sofridos. Agora vamos ingressar com processo na esfera cível, de reparação e ressarcimento de danos morais e materiais. O processo na esfera criminal será tocado pela delegacia que abriu inquérito", explicou.

O registro de ocorrência foi feito como injúria por preconceito, de acordo com o artigo 140, inciso 3º do Código Penal Brasileiro. A Polícia Civil do Rio de Janeiro informou que o caso está sendo investigado e que os envolvidos serão intimados para prestar depoimento. Caso a investigada seja indiciada, o caso será remetido ao Ministério Público Estadual e caberá ao órgão ofertar ou não a denúncia à Justiça. Em caso de condenação na Justiça, o artigo 140 prevê detenção de um a seis meses, ou multa.

O UOL tentou contato com Érica Gomes de Andrade por telefonemas e mensagens de texto, que foram visualizadas, mas não respondidas. Ao menos uma das contas nas redes sociais pertencentes à suspeita foi desativada. O espaço segue aberto para esclarecimentos e será atualizado tão logo o contato seja realizado.