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André Santana: Morte de congolês põe em evidência tragédias sociais do país

Colaboração para o UOL, no Rio

02/02/2022 09h20Atualizada em 02/02/2022 10h28

O colunista do UOL André Santana lamentou, no UOL News desta manhã, a trágica morte do congolês Moïse Mugenyi Kabagambe, 24, no Rio de Janeiro, na noite do último dia 24 de janeiro. Para ele, o espancamento do jovem revela que o Brasil não é um país amável para os imigrantes e não tem sido uma "mãe" para sua população negra.

A fala de André se relaciona ao desabafo desesperado de um parente de Moïse, que disse, após o assassinato do congolês, em entrevista ao SBT, que o "o Brasil é uma mãe, abraça todo mundo".

"É revoltante, é um soco no estômago, muito triste isso. Infelizmente o que temos a dizer para esse familiar do Moïse é que o Brasil não tem sido uma mãe para as pessoas negras", disse André à apresentadora do Canal UOL Fabíola Cidral.

O Brasil não é um país amável para pessoas imigrantes, principalmente quando essas pessoas são de origem africana. Nunca foi. É preciso lembrar que os africanos foram sequestrados e trazidos para o Brasil como escravos da pior forma e isso não mudou, não houve nenhuma política de Estado de acolhimento dessas pessoas
André Santana

Moïse foi morto após ser espancado por pelo menos três homens em um quiosque onde trabalhava servindo mesas na praia da Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio.

O congolês chegou ao Brasil como refugiado quando tinha 11 anos de idade e morava com a mãe, irmãos e primos em um bairro da zona norte carioca. Ele tinha seis irmãos —cinco moram no Brasil e outro na França. O pai morreu em situação de guerra no Congo.

"É um absurdo e o mínimo que a gente pode fazer é não naturalizar esse caso. A gente precisa dar repercussão necessária, exigir justiça, mas exigir também principalmente que a sociedade encare de frente esse problema. Essa morte brutal nos coloca muito evidente nas grandes tragédias que o Brasil vive hoje. Tragédias sociais que se relacionam", afirmou André Santana.

Racismo e xenofobia

Para o colunista, a morte de Moïse tem o racismo e a xenofobia como pano de fundo. Ao dizer que o congolês foi agredido após uma cobrança por um serviço prestado no quiosque, ele ainda critica as relações de trabalho no país.

O congolês era pago por dias trabalhados e, segundo a família, o quiosque Tropicália —onde foi assassinado— devia a ele R$ 200, referentes a duas diárias por serviços prestados.

"Há uma relação aí que a gente precisa discutir urgentemente porque o Brasil ainda quer permanecer sobre a égide do trabalho escravo, sem valorização, e isso está muito evidente neste caso", diz André.

Até a noite de ontem, três pessoas haviam sido detidas pela morte de Moïse. Nesta manhã, a Justiça aceitou o pedido de prisão temporária dos três por homicídio duplamente qualificado (impossibilidade de defesa e meio cruel).

De acordo com um deles, o congolês teria tentado agredir um funcionário dentro do quiosque e três pessoas intercederam para evitar, o que deu início ao espancamento. As imagens da câmera de segurança do quiosque mostram, no entanto, que os três agressores batem na vítima mesmo ela estando imobilizada no chão.

Esse caso do Moïse é muito dramático, brutal, e atinge a todos, mas principalmente a gente precisa colocar essas questões. A gente não pode naturalizar, tem que olhar para esses grandes dramas sociais, e como agem juntos, como nesse caso, vira essa tragédia brutal
André Santana