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Falta de verba federal paralisa as 9 estações que monitoram deslizamentos

Estação Total Robotizada em Blumenau (SC) está parada por falta de recursos para manutenção - Divulgação/Cemaden
Estação Total Robotizada em Blumenau (SC) está parada por falta de recursos para manutenção Imagem: Divulgação/Cemaden

Ruben Berta

Do UOL, no Rio

23/02/2022 04h00

Nove equipamentos que foram instalados em 2016 pelo Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) para acompanhar em tempo real deslizamentos de terra estão parados desde janeiro de 2018 por falta de verba do governo federal para a manutenção.

Uma das ETRs (Estações Totais Robotizadas) deveria funcionar na cidade de Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, que vive a maior tragédia de sua história em decorrência de um forte temporal que atingiu o município no dia 15 deste mês.

De acordo com o Cemaden —órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações—, os equipamentos precisam ser calibrados e receber manutenção periódica em laboratório para que possam funcionar. No entanto, isso não ocorreu nos últimos anos por falta de recursos.

O menor orçamento da história

O Cemaden foi criado em julho de 2011 —após as chuvas que provocaram mais de 900 mortes na região serrana do Rio— para auxiliar no monitoramento e alerta de desastres naturais.

Em 2012, seu orçamento foi de R$ 90,7 milhões. Mas, desde então, não se manteve, chegando ao menor nível no ano passado (R$ 17,9 milhões), conforme mostrou reportagem da BBC Brasil.

O UOL questionou o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações, ao qual o Cemaden é subordinado, sobre o orçamento geral do órgão e as verbas para a manutenção dos equipamentos parados, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

Além de Petrópolis, outras duas cidades na região serrana do Rio deveriam contar com as estações: Nova Friburgo e Teresópolis. Angra dos Reis, no litoral do estado, também deveria ter o equipamento. Completam a lista Mauá e Santos (SP), Blumenau (SC), Recife (PE) e Salvador (BA).

mapa cidades equipamentos e monitoramento -  -

ETRs: para que servem e como funcionam

O pesquisador do Cemaden Rodolfo Mendes afirma que as ETRs exercem um papel complementar ao monitoramento pluviométrico e de umidade do solo, que é realizado pelo órgão.

Os equipamentos detectam deslizamentos que podem atingir imóveis em poucos minutos e, nessas ocasiões, não são tão eficientes para emissão de alertas a tempo de evitar um desastre. No entanto, as ETRs têm função importante para planejamento e pesquisa.

"A ruptura completa de uma rocha pode levar alguns minutos. Com as ETRs, saberíamos exatamente em que momento isso ocorreu, o que é muito importante para fins de pesquisa e também para planejamento."

No caso de Petrópolis, a estação —hoje inoperante— foi instalada na região do Alto Independência, que não está entre as mais atingidas pelas chuvas da semana passada.

O equipamento que está parado emite sinais em infravermelho que são refletidos em cem prismas (espécie de espelhos) instalados em encostas com risco de deslizamento. Por meio desse sistema, qualquer movimentação milimétrica no terreno é informada em tempo real para o Cemaden.

Caso os equipamentos estivessem em funcionamento e houvesse algum deslizamento nas áreas monitoradas, seria possível saber exatamente qual volume de chuva foi suficiente para a movimentação do terreno. Esse tipo de informação pode subsidiar ações de prevenção.

"Conhecer o exato momento faz uma grande diferença para estabelecer qual foi o limiar de um deslizamento e fazer uma análise, comparando com o volume de chuva e a umidade do solo", complementa Rodolfo Mendes.

Ainda que estejam instaladas em uma região específica, as ETRs podem municiar os pesquisadores com informações que se replicariam para outras áreas de uma mesma cidade com características geológicas semelhantes.

Ou seja, seria possível saber com mais precisão qual o volume de chuva necessário para que haja maior risco de deslizamento naquelas localidades.

No caso de Petrópolis, foi o Cemaden que deu os primeiros avisos de chuva forte, a partir dos quais são acionadas as Defesas Civis do estado e do município.

No dia da tragédia, choveu 250 mm num período de apenas três horas. A média para fevereiro na cidade é de 185 mm. Ou seja, choveu o equivalente a quase um mês e meio.

Foi a maior tempestade da história de Petrópolis desde que se iniciaram as medições em 1932. O recorde anterior ocorreu em 20 de agosto de 1952, quando foram registrados 168,2 mm em 24 horas.