Dupla desapareceu em barco inadequado, diz Univaja: 'Totalmente esquisito'
Primeira organização a alertar sobre o desaparecimento do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista britânico Dom Philips no Vale do Javari (AM), a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari) concedeu hoje (7) uma coletiva onde afirmou que as circunstâncias do sumiço foram estranhas e que descartam a hipótese de que a dupla tenha se perdido na mata.
Pereira e Philips foram vistos pela última vez por volta das 7h de domingo (5) em um barco após saírem da comunidade ribeirinha São Rafael. Os dois seguiam em direção à cidade de Atalaia do Norte, onde eram aguardados por duas pessoas ligadas à Univaja.
Em coletiva concedida no início da tarde de hoje em Manaus, Yura Marubo, assessor jurídico da Univaja, disse que Bruno já havia trabalhado anteriormente com povos indígenas isolados no Vale do Javari e, por isso, era um exímio conhecedor da área.
"Não podemos descartar alguma outra hipótese. Mas desconhecimento de área por alguma fatalidade, errou o caminho, coisa do tipo que sempre acontece, isso está descartado, porque o Bruno era um exímio conhecedor tanto da caminhada em mata quanto em caminhadas de barcos", disse.
'Totalmente esquisito'
Para Yura, ainda há muitos pontos a esclarecer sobre o desaparecimento. O principal, mencionado por ele mais de uma vez na coletiva, foi a embarcação utilizada no trajeto, um barco de motor 40HP: "Não se usa esse tipo de embarcação."
"Não é possível você caminhar no Vale do Jaguari com um motor de 40HP, isso é impossível. Os barcos da nossa instituição são de 200HP. Isso [200HP] é veloz, é rápido, é uma questão de segurança e de prioridade à vida dos nossos profissionais dessa área", observou.
Segundo Yura, no barco de 40HP o trajeto era previsto para durar cerca de duas horas. Em um de 200HP ou 300HP, a estimativa seria de meia hora. "O que está acontecendo é que o Bruno e o Dom Philips estão desaparecidos em um trajeto rápido, a meu ver, nesse processo de retorno", afirmou.
"Da forma como foi, está totalmente esquisito", acrescentou.
Ameaças
O assessor também declarou que as questões indígenas no Brasil não são levadas a sério e que a Funai (Fundação Nacional do Índio) está "obsoleta, sucateada e ao mesmo tempo falida". Além disso, ele disse que Bruno sofria ameaças desde quando foi coordenador da Funai em Atalaia do Norte — cargo que exerceu por mais de uma década e deixou em 2016.
Como exemplo, ele citou o caso de outro indigenista da Funai que atuava na área, Maxciel Pereira dos Santos, assassinado em 2019 em Tabatinga (AM).
"Eram ameaças diretas, não mais veladas como acontecia outrora. Tanto que o funcionário da Funai, Maxciel, morreu em 2019 assassinado por conta desse mesmo trabalho que o Bruno fazia: apreensão, detenção, apresentação, queimar equipamentos, prender material de pesca e caça. Ou seja, não é um trabalho dessas instituições porque é um trabalho de polícia, e por conta disso criou-se ódio e muitos inimigos."
Uma carta reproduzida pelo jornal O Globo mostra pescadores prometendo "acertar contas" com o indigenista. Companheira de Bruno, a antropóloga Beatriz de Almeida Matos disse à Folha de S.Paulo que estava preocupada com as ameaças que ele vinha sofrendo.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, houve um crescimento de 9,2% na violência letal entre 2018 e 2020 em cidades de floresta na região Norte do país. O desaparecimento, de acordo com o Fórum, "expõe a fragilidade das ações de fiscalização e segurança na Amazônia".
Mais cedo, Eliésio Marubo, procurador da Unijava, disse que a Marinha havia enviado equipamentos "inadequados" para a busca por Bruno e Dom Philips.
O Ministério da Defesa, em nota publicada na noite de hoje, disse ter iniciado as atividades de busca por Bruno e Dom assim que foram divulgadas as primeiras informações sobre o desaparecimento.
O texto afirma que uma equipe de Busca e Salvamento (SAR) da Marinha percorreu, também ontem, os rios Javari, Itaquaí e Ituí. Hoje, ainda segundo a pasta, foram disponibilizados um helicóptero, embarcações e uma moto aquática.
De acordo com a Defesa, o Exército colabora com 150 militares especialistas em operações em ambiente de selva e disponibilizará um helicóptero para auxiliar nas buscas.
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