AM: indígenas e DPU denunciam omissão e pedem à Justiça ampliação de buscas
Entidades indígenas denunciam a omissão e a demora para agir nas buscas pelos desaparecidos na Amazônia. A Defensoria Pública da União (DPU) ingressou ontem com uma ação civil pública em conjunto com a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari), pedindo à Justiça que obrigue o governo federal a disponibilizar helicópteros.
Bruno Araújo Pereira, servidor licenciado da Funai (Fundação Nacional do Índio), e o jornalista Dom Phillips, correspondente do jornal britânico The Guardian, estão desaparecidos desde a manhã deste domingo (5) no Vale do Javari.
Na ação, a DPU diz que, até ontem, um dia após o desaparecimento, não havia buscas com helicóptero pela região, e solicitou reforço imediato.
"É fundamental ressaltar que a região do Vale do Javari é gigantesca, de modo que se impõe que as equipes de busca sejam imediatamente reforçadas não apenas em número de efetivo de pessoal, mas também com a disponibilização de barcos e helicópteros", solicita a Defensoria.
Uma nota em conjunto entre entidades indígenas enviada hoje citou a ação com a DPU e criticou a omissão nas buscas. "Com exceção dos seis policiais militares e de uma equipe da Funai, que iniciaram as buscas ainda ontem (6) com a equipe da Univaja, as informações acerca do cenário das buscas revelam a omissão dos órgãos federais de proteção e segurança", diz um dos trechos da nota.
As entidades também criticaram o Exército e a Polícia Federal.
O Exército brasileiro até o presente momento não disponibilizou nenhum efetivo para a operação. A Polícia Federal (...) deslocou um único delegado para Atalaia do Norte (...). Não foi constituída uma força-tarefa para as operações de busca"
Trecho da nota de entidades indígenas
O que dizem os órgãos de segurança
A Polícia Federal, que investiga o caso e participa de incursões, informou ter enviado mais uma aeronave com policiais federais e militares do Exército para a região. A Marinha informou ter enviado hoje um helicóptero, duas embarcações e uma moto aquática da Marinha para a região. Mas não confirmou se as equipes já participam das buscas.
Já a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas enviou hoje uma equipe formada por policiais civis, bombeiros e PMs para reforçar as buscas em Atalaia do Norte.
A equipe da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas se deslocou hoje de manhã de avião de Manaus para Tabatinga, a 1.108 km da capital do Amazonas. Em seguida, usará uma lancha blindada para chegar a Atalaia do Norte (AM).
"[Temos] uma equipe de especialista na área de selva e, também, mergulhadores, com o objetivo de reforçar a equipe que já temos em Atalaia do Norte, da segurança pública, nas buscas das duas pessoas desaparecidas", disse o general Carlos Alberto Mansur, secretário de Segurança Pública do Amazonas.
Indígenas participam de buscas
A Univaja está mobilizando indígenas para as buscas nos igarapés, lagos e igapós, onde pretendem achar vestígios da embarcação ou dos desparecidos.
Tamakuri Kanamari, presidente da Associação Kanamary (que representa o povo do Vale Javari e rio Itacoaí), relata que várias entidades se uniram para ajudar nas buscas. Contudo, há preocupação, diz, para ataques de piratas, que se escondem na mata fechada.
"É muito perigoso nosso rio com esses piratas. Por isso, estamos saindo com os barcos baleeiros com equipes das associações indígenas Kanamari, Mayoruna, Marubo, Univaja e Matsés", conta.
Ameaças de morte
Segundo a Univaja, Bruno vinha sendo alvo de ameaças de garimpeiros, madeireiros e pescadores. O MPF (Ministério Público Federal) abriu investigação do caso.
No Twitter, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse atuar junto da Marinha para encontrar Pereira e Philips.
Bruno é pai de três filhos. Dois deles com a antropóloga Beatriz de Almeida Matos, companheira do indigenista. "Ele precisa voltar para casa", disse à Folha de S.Paulo. "Eu conheço bem a região, sei que podem acontecer vários acidentes. Mas estou apreensiva por causa das ameaças que ele sofria", afirmou a antropóloga, que também atuou com povos indígenas.
Em carta reproduzida pelo jornal O Globo, pescadores prometeram "acertar contas" com o indigenista. Fabio Ribeiro, coordenador-executivo do OPI (Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato), confirmou que as buscas estão sendo priorizadas.
"Aquela região tem questões envolvendo o narcotráfico, a atividade de madeireira, de pesca ilegal e garimpo. E a organização indígena está nesse enfrentamento contra a invasão das terras", relatou.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o desaparecimento "expõe a fragilidade das ações de fiscalização e segurança na Amazônia". Um levantamento do fórum aponta crescimento de 9,2% na violência letal entre 2018 e 2020 em cidades de Floresta na região Norte do país.
"Pereira e Phillips navegavam em uma área que hoje é palco de disputa entre facções criminosas que se destacam pela sobreposição de crimes ambientais, que vão do desmatamento e garimpo ilegal a ações relacionadas ao tráfico de drogas e de armas, por meio do forte controle de rotas fluviais, terrestres e aéreas da região", diz o Fórum em nota.
Entenda o caso
Bruno Pereira e Dom Phillips foram vistos pela última vez por volta das 7h de domingo em um barco após saírem da comunidade Ribeirinha São Rafael, segundo nota em conjunto de entidades indígenas.
De lá, partiriam para a cidade de Atalaia do Norte, onde eram aguardados por duas pessoas ligadas à Univaja. Após um atraso de mais de duas horas, começaram as buscas, informaram as entidades indígenas.
"Essas duas pessoas ficaram esperando em uma balsa por mais de duas horas. Depois, tentaram localizá-los. Por volta das 16h, acionamos os órgãos de segurança para notificar o desaparecimento", informou Paulo Barbosa da Silva, coordenador-geral da Univaja.
As entidades indígenas informaram que Bruno Pereira e Dom Phillips se deslocaram inicialmente para visitar uma equipe de vigilância indígena próximo à localidade chamada Lago do Jaburu, nas imediações da base da Funai no Rio Ituí, para que o jornalista conversasse com indígenas no local.
As entrevistas, segundo as entidades, foram feitas na última sexta-feira (3). No retorno, ainda de acordo com os órgãos indígenas, a dupla foi à comunidade São Rafael, onde Bruno Pereira tinha reunião agendada com o líder comunitário conhecido como "Churrasco" para consolidar trabalhos conjuntos entre ribeirinhos e indígenas na região, afetada pela ação de invasores.
De lá, partiu em uma embarcação com o jornalista britânico Dom Phillips para Atalaia do Norte. Contudo, a dupla desapareceu antes de chegar ao destino combinado.
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