RJ: Milícia usa banco de dados da polícia para planejar homicídios, diz MP
A milícia conhecida como Bonde do Zinho usa bancos de dados oficiais do Rio de Janeiro para levantar informações de inimigos, planejar homicídios e extorquir dinheiro de comerciantes e moradores, segundo investigações do MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro). Operação deflagrada hoje contra o grupo —considerado a maior milícia do estado— cumpriu mandados de prisão contra ao menos oito suspeitos.
Mensagens de WhatsApp indicam que a milícia usa bancos de dados do sistema penitenciário, da Polícia Civil e outros órgãos do estado para obter informações privilegiadas, informou hoje Roberta Laplace, subcoordenadora do Gaeco (Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado) do MP-RJ.
"Eles têm acesso a informação privilegiada por conta dos agentes que eles corrompem, têm acesso a bancos de dados oficiais, a fotografias de bancos de dados oficiais."
Como exemplo, Laplace cita um episódio em que o grupo —comandado por Luís Antônio da Silva Braga, o Zinho— recebeu a foto de um traficante do Comando Vermelho que constava somente no banco de dados do sistema penitenciário. Os milicianos também assinavam, de acordo com a promotora, bancos de dados privados para complementar as informações.
Zinho, que tem contra ele ao menos quatro mandados de prisão, continua foragido.
O UOL procurou as polícias Civil e Militar, a Seap (Secretaria Estadual de Administração Penitenciária) e o governo do estado para obter um posicionamento sobre as denúncias.
A Polícia Civil destacou, em nota, o combate que trava contra milícias, dizendo ter prendido 1.200 milicianos nos últimos dois anos.
A Polícia Militar disse que todas as denúncias envolvendo PMs são apuradas quando chegam ao conhecimento da Corregedoria Geral da corporação.
A Seap e o governo do RJ não se manifestaram sobre a investigação.
'Propina aos baldes' a policiais, diz MP
Segundo as investigações, a prática de se levantar fichas criminais, endereço e outras informações que pudessem ajudar nos planos de homicídio e extorsão era rotina no Bonde do Zinho.
"[Há] corrupção de agentes da força de segurança. Havia pagamento de propina aos baldes", disse a promotora.
De acordo com ela, trocas de mensagem mostram o fluxo de pagamento da propina, como encontros marcados com policiais de batalhões da área dominada pelo Bonde do Zinho.
Ainda de acordo com Laplace, alguns dos homens da milícia comandavam ações de dentro da cadeia, como Roberto dos Santos, o Latrell. Considerado o "02" da organização criminosa, ele foi preso em março.
Apesar de a investigação indicar participação de agentes de segurança, Laplace afirmou que o fato de a operação de hoje ter sido deflagrada pela Polícia Federal não tem relação com o fato. "Foi uma questão de oportunidade e conveniência", disse.
Ela pontuou que o excesso de trabalho e falta de estrutura das polícias é um fator que contribuiu para a Polícia Federal atuar no caso, já que o órgão tem menos casos para lidar ao mesmo tempo.
Incômodo com Jerominho e ligação com morte
A investigação também indica ligação do Bonde do Zinho com a morte de Jerônimo Guimarães, o ex-vereador do Rio Jerominho, fundador da milícia Liga da Justiça.
Com base em troca de mensagens, Laplace diz que o incômodo dos milicianos era sobre a possibilidade "desses velhos", como se referiam ao grupo de Jerominho, tentarem dominar a área hoje comandada por Zinho.
Algumas mensagens indicam que o grupo de Jerominho planejava sequestrar uma das filhas de Zinho, mas não há provas concretas sobre o plano.
Ao UOL, o advogado Marcelo Cavalieri, que representou Jerominho, negou envolvimento do ex-vereador com grupos de milícia. De acordo com Cavalieri, Jerominho estava "feliz com a inauguração do centro social" e não andava com seguranças nem carro blindado.
A Operação Dinastia buscou identificar outros integrantes da milícia. Os suspeitos são investigados por organização criminosa, tráfico de armas de fogo e munições, além de extorsões e corrupção.
Foram expedidos 23 mandados de prisão, mas o Ministério Público não divulgou todos os nomes —não foi informado se, entre eles, há policiais da ativa. Os presos hoje foram Geovane da Silva Mota, Vanderlei Proença de Souza, Vitor Eduardo Cordeiro Duarte e Douglas de Medeiros Alves Rosa.
Geovane é conhecido como GG e tem 27 anos e foi preso em um hotel em Gramado (RS) durante uma viagem de férias com a família. As investigações apontam que GG atua na função que era de Latrel até março.
Os outros mandados cumpridos são de milicianos já presos: Luis Fillipe dos Santos Maia, Rodrigo dos Santos, o Latrell, Alexandre Silva de Almeida e André Costa Bastos. O UOL não localizou a defesa dos citados.
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