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Justiça interrompe julgamento de Flordelis após MP citar trecho de livro

Do UOL, em Niterói (RJ)

09/11/2022 22h20

O júri popular que decidirá o destino da pastora e ex-deputada federal Flordelis foi interrompido na noite de hoje (9) após o MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) exibir um trecho de um livro-reportagem para insinuar que a advogada Janira Rocha —uma das defensoras de Flordelis— manipulou depoimentos de integrantes da família.

A menção ocorreu durante o depoimento de Raquel dos Passos Silva —neta afetiva de Flordelis. Ela havia relatado que Paula Barros, conhecida como Paula do Vôlei, que teria se apresentado como psicóloga, orientou os depoimentos de integrantes da família de Flordelis.

"A gente era obrigado a dar um falso depoimento para ela. Eu contava tudo que eu vivi na hora do crime. Aí, nessa parte do Ramon, ela falou: 'isso você não fala, não, porque vai atrapalhar. Você vai dizer que estava no quarto e não viu nada'", disse Raquel.

Em seguida, um dos promotores do MP-RJ exibiu um trecho do livro-reportagem "O Plano Flordelis - Bíblia, Filhos e Sangue", da jornalista Vera Araújo. Nele, é relatado que Janira Rocha contou que, com a ajuda de Paula do Vôlei, "usou a própria experiência de vida para persuadir algumas das "filhas" de Flordelis a tornar públicas as investidas supostamente promovidas pelo pastor. Para criar empatia, a advogada abordava o assunto com elas revelando que havia sofrido abuso por parte do avô aos 8 anos", relata a autora.

Diante da insinuação de que havia ajudado Paula a manipular os depoimentos, Janira Rocha perguntou a Raquel se ela já a havia visto ou falado com ela por meio de mensagens ou ligações telefônicas. A testemunha negou. Em seguida, com o depoimento encerrado.

Desde então, a defesa de Flordelis apresentou um requerimento para que a jornalista Vera Araújo seja ouvida no julgamento como testemunha referida. Caso isso não ocorra, a defesa de Flordelis ameaça a abandonar o júri.

"Eu posso falar com todas as partes do processo, sou advogada. Existe um provimento da OAB que diz que o advogado pode fazer investigação defensiva e conversar com todo mundo, porque precisa montar sua tese defensiva. O que não posso fazer é manipular testemunhas. Quem tem que provar que eu manipulei testemunhas é quem acusa. E eu duvido que alguém possa provar", disse ela.

"Eu acho normal o desespero do MP de querer me atacar em função do papel que estou fazendo nesse júri junto com o dr. Rodrigo Faucz e nossa equipe".

Ainda segundo a advogada Janira Rocha, a defesa de Flordelis cogita deixar o julgamento caso o pedido para que a jornalista seja ouvida acabe negado pela juíza Nearis dos Santos Carvalho Arce, titular da 3ª Vara Criminal de Niterói, que preside o júri popular.

"Se houver o indeferimento, se a gente sentir que houve uma manipulação que contaminou os jurados, aí a defesa vai ser obrigada a tomar uma posição mais radicalizada e vai estar em discussão se a gente continua ou não".

O advogado Rodrigo Faucz, que também integra a defesa de Flordelis, corroborou a intenção de interromper o julgamento nesse caso.

"Nós precisamos que seja um julgamento justo. A partir do momento que não existam condições de ter plena paridade de armas, inclusive com acusações levianas de membros da nossa própria equipe, não tem como continuar", completou.

O UOL Notícias tentou falar com o promotor Carlos Gustavo Coelho de Andrade, um dos responsáveis pelo caso de Flordelis, mas ele se recusou a dar entrevista.

Filha de Flordelis passa mal. Durante a discussão sobre a citação de Janira Rocha, Simone dos Santos Rodrigues, fiha biológica de Flordelis e uma das rés no processo, passou mal e foi retirada da sala de julgamento.

De acordo com Rodrigo Faucz, ela foi socorrida pelo SAMU (Serviço de Atendimento Médico de Urgência).

O julgamento. Além de Flordelis e Simone, serão julgadas por júri popular a neta Rayane dos Santos Oliveira e os filhos afetivos André Luiz de Oliveira e Marzy Teixeira da Silva.

A ex-deputada é ré por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio, associação criminosa, uso de documento falso e falsidade ideológica. Marzy, Simone e André Luiz responderão por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada; e Rayane, por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa armada.

Antes de Daiane, foram ouvidas outras sete testemunhas de acusação arroladas pelo MP-RJ e uma pelo assistente de acusação. Além delas, também foram convocadas outras quatro testemunhas de acusação, e 27 escolhidas pelas defesas dos acusados.

Não há prazo para que o julgamento seja encerrado. Fontes ligadas ao caso acreditam que os trabalhos devem continuar no fim de semana, mas não há confirmação oficial de que isso ocorrerá.

A magistrada indeferiu a convocação da jornalista Vera Araújo e decidiu que, caso os defensores de Flordelis —que também representam André, Rayane e Marzy— abandonem o plenário, será dado o prazo de 5 dias para a nomeação de novos advogados.

A juíza ainda afirmou em sua decisão que a conduta dos advogados demonstra "desdém" e estabeleceu multa de 15 salários mínimos para cada um dos sete advogados que representam Flordelis em caso de abandono causa.

Quem já foi ouvido no julgamento? Segunda (7), foram ouvidos os delegados Bárbara Lomba e Allan Duarte —responsáveis pela investigação do homicídio— e a comerciante Regiane Ramos Cupti Rabello, que empregou e cuidou de Lucas, um dos filhos de Flordelis envolvidos no crime.

Ontem, falou primeiro o policial civil Tiago Vaz de Souza. Em seguida, foi iniciado o depoimento de Alexsander Felipe Matos Mendes, o Luan, filho afetivo de Flordelis. Ex-vereador e filho afetivo Wagner Andrade Pimenta, conhecido como Misael, também foi ouvido — ele disse, em depoimento, que o pastor Anderson do Carmo sabia de um plano para assassiná-lo.

O que está em julgamento?

Começou segunda (7) o julgamento de Flordelis pela acusação de ter arquitetado o assassinato de seu marido Anderson do Carmo, morto em 16 de junho de 2019, em Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro. Outras quatro pessoas acusadas de envolvimento no crime também são julgadas. Ela terá seu destino decidido por um júri popular.

Além de Flordelis, são julgados sua filha biológica Simone dos Santos Rodrigues; a neta Rayane dos Santos Oliveira; e os filhos afetivos André Luiz de Oliveira e Marzy Teixeira da Silva.

O pastor Anderson do Carmo foi assassinado com dezenas de tiros quando descia do carro, no quintal de casa, no bairro de Pendotiba, em Niterói. Flordelis tinha entrado em casa momentos antes.

A ex-deputada --cassada em razão do envolvimento no caso-- é ré por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio, associação criminosa, uso de documento falso e falsidade ideológica.

Já Marzy, Simone e André Luiz responderão por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada; e Rayane, por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa armada.

Cassação e prisão. Flordelis está presa desde 13 de agosto de 2021. Dois dias antes, Flordelis havia perdido o foro privilegiado ao ter o mandato de deputada federal cassado por 437 favoráveis, 7 contrários e 12 abstenções.

O que diz Flordelis? Durante todo o processo, Flordelis negou ter qualquer ligação com a morte do marido. Em live realizada por ela horas antes de ser presa, a pastora e ex-deputada reafirmou sua inocência: "Caso eu saia daqui hoje, saio de cabeça erguida porque sei que sou inocente. Todos saberão que sou inocente, a minha inocência será provada e vou continuar lutando para garantir a minha liberdade, a liberdade dos meus filhos e da minha família, que está sendo injustiçada".

Os demais acusados também dizem que são inocentes.