'Meu filho se afogou na casa onde eu trabalhava e vive em coma há 2 anos'

Arthur Rodrigues Miranda, 5, se afogou na piscina da casa onde a mãe trabalhava como diarista, em Iporá (GO). Ele vive em "coma vígil" há dois anos —uma condição em que a pessoa parece reagir a estímulos, mas não tem consciência do ambiente ao redor. A mãe dele, Karita Barbosa Rodrigues, conta ao UOL a rotina de tratamentos e a esperança de melhora.

"Era uma criança ativa e brincalhona"

"Eu trabalhava como diarista na casa de um professor e costumava levar o Arthur comigo. Ele era uma criança ativa e brincalhona, tinha três anos e meio quando tudo aconteceu, no dia 2 de julho de 2021.

Era uma sexta-feira, a piscina da casa tinha sido instalada recentemente e enchida naquela semana. Depois do almoço, Arthur ficou brincando com seus carrinhos na sala, perto do meu patrão, enquanto fui limpar a frente da casa, que era a última tarefa que faltava.

Alguns minutos depois, enquanto estava ocupada com a limpeza, abri a porta e perguntei: 'Arthur, está aí?'. Meu patrão respondeu que ele estava brincando na área com os cachorros. Quando cheguei à cozinha, vi que a porta que dava para a área estava aberta. Foi quando olhei para a piscina e vi o Arthur lá dentro.

Corri até ele e o encontrei boiando de barriga para baixo na água, com espuma ao redor da boca e do nariz. Estava pálido e começando a ficar com a pele roxa. Quando o peguei, parecia totalmente sem vida.

Criança passa por uma série de terapias para melhorar sua condição
Criança passa por uma série de terapias para melhorar sua condição Imagem: Arquivo pessoal

Reviver esse momento é muito doloroso. Mesmo no desespero, consegui ligar para os bombeiros. Eles chegaram em menos de dois minutos e fomos levados para a UPA de Iporá. Lá, nos disseram que levaram 15 minutos para reanimar o Arthur. Esperamos mais cerca de 20 minutos antes de nos deixarem entrar e ficamos angustiados, aguardando.

Lembro que, quando entrei na sala onde ele estava, na maca, ele deu um suspiro assim que me aproximei. Essa cena nunca sairá da minha memória, pois senti que ele sabia que eu estava lá e comecei a chorar.

Um helicóptero foi chamado, porque ele precisaria de assistência em um hospital maior. Decidiram levá-lo a Goiânia, que fica a 220 km de Iporá, e lá me explicaram que o quadro era delicado e havia riscos.

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O diagnóstico

Ele passou dois meses na UTI e um na enfermaria. No início, nos falaram que Arthur teve paralisia cerebral, mas, recentemente, nos disseram que ele está em coma vígil, o que nunca tínhamos ouvido falar.

Desde que o Arthur saiu do hospital, nossa vida tem sido uma jornada de aprendizado, amor e cuidados constantes. Tivemos de vender a casa onde morávamos em Iporá para mudar para Goiânia e, com o dinheiro, compramos um carro adaptado, o que nos permite levá-lo às terapias e consultas médicas.

Ele respira por conta própria, apenas utilizando a traqueostomia quando necessário. Temos um suporte de home care para cuidar do Arthur em casa, mas nem tudo é coberto pelo plano, e isso resulta em gastos adicionais.

O acompanhamento médico é constante: pediatra duas vezes por semana, fonoaudióloga disponível todos os dias da semana, fisioterapia diariamente e agora começou a terapia ocupacional.

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Hoje temos uma vaquinha online aberta para nos ajudar a comprar uma casa e sair do aluguel. Mudar para um lugar mais acessível e seguro para o Arthur é fundamental.

Para manter o Arthur em tratamento e levá-lo às terapias durante a semana, começamos a fazer rasteirinhas (sandálias) em casa e vendê-las em feiras duas vezes por semana aqui em Goiânia. Isso tem nos ajudado financeiramente.

Os goianos Karita e Rafael mudaram-se de Iporá para Goiânia para buscar tratamento para o filho
Os goianos Karita e Rafael mudaram-se de Iporá para Goiânia para buscar tratamento para o filho Imagem: Reprodução/Redes Sociais

Os avanços

Lidar com o que aconteceu não é fácil. No começo, era difícil falar sobre isso, especialmente por comentários negativos nas redes sociais. Cheguei a entrar em depressão durante um tempo por isso, mas hoje estou mais forte e consigo lidar melhor com o que escrevem.

Se alguém julga, tento conversar com a pessoa e explicar nossa situação.

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Durante todo esse processo, vimos avanços encorajadores no Arthur, principalmente devido à estimulação cerebral que ele estava recebendo. Ele movimenta a cabeça, mexe a língua e parece querer se comunicar. Por isso, temos esperanças de que o Arthur abrirá os olhos em breve. Eu sei que ele vai acordar."

Lesão por falta de oxigênio

O afogamento causa a "morte" de células e tecidos imprescindíveis para o funcionamento do cérebro. O órgão, ao parar de receber o oxigênio necessário, sofre o que se chama de hipóxia, explica o neurologista da Red D'Or, Sergio Jordy.

Quando a pessoa se afoga, o cérebro deixa de receber sangue oxigenado. Isso acontece porque a respiração é responsável por levar oxigênio para o cérebro. Como o cérebro é um órgão que consome muita energia, ele precisa de oxigênio para funcionar.
Sergio Jordy

A morte das células pode causar danos cerebrais, que variam de leves a graves. Os danos mais leves incluem falta de atenção, problemas de memória e coordenação motora. Os danos mais graves podem incluir coma, convulsões e morte cerebral.

O tempo de afogamento é um fator importante que determina a gravidade dos danos cerebrais. Quanto mais tempo a pessoa passar sem respirar, mais células do cérebro morrerão. Por isso, é importante que a pessoa seja resgatada e receba atendimento médico o mais rápido possível. Sergio Jordy

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Em alguns casos, os danos cerebrais por afogamento podem ser irreversíveis, mesmo com tratamento médico. Isso ocorre porque as células do cérebro podem morrer completamente após um certo período sem oxigênio.

No coma vígil, que é o caso de Arthur, a pessoa até pode abrir o olho e esboçar reações corporais, mas a consciência está ausente e, nesses casos, a chance de recuperação é extremamente baixa. E, mesmo que consiga atingir um certo nível de recuperação, as sequelas serão irreversíveis.

Pesquisas em andamento com neuroprotetores podem ajudar na recuperação de danos cerebrais causados por afogamento. No entanto, esses tratamentos ainda não estão disponíveis para uso clínico.

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