Infiltrado não atuou em gabinetes do PSOL, diz chefe de diretório no Rio

Apontado pela PF como agente infiltrado dos irmãos Brazão dentro do PSOL, Laerte Silva de Lima não desempenhou funções dentro do partido nem nos gabinetes de políticos ligados à sigla, segundo Juan Leal, presidente do diretório municipal no Rio.

O que aconteceu

Não há fotos ou outros registros de participação de Lima — filiado entre 2017 e 2020 em atividades realizadas pelo PSOL. Leal diz ainda não haver controle de quem participa eventos abertos, voltados a pessoas não filiadas à legenda. O presidente do PSOL no Rio afirma também que Lima nunca fez doações de campanha à sigla.

PSOL foi informado sobre vínculo de infiltrado com a milícia antes da desfiliação. Durante os preparativos para a Operação Intocáveis (realizada em 2019), a Polícia Civil do Rio informou ao partido sobre a situação e pediu que a legenda não fizesse movimentações em relação a Lima para não despertar suspeitas.

Após Operação Intocáveis, PSOL desfiliou Lima. O processo foi concluído em dezembro de 2020 pelo diretório nacional, como é de praxe em situações do tipo. A reportagem não conseguiu entrar em contato com a defesa de Lima no caso.

Quem é Lima?

Lima foi escolhido pelos irmãos Brazão, segundo a PF, para monitorar os passos de Marielle. A decisão foi tomada no segundo semestre de 2017, quando o homicídio começou a ser planejado. A vereadora e o motorista Anderson Gomes foram mortos em março de 2018.

Ele repassava informações, de acordo com a PF, para Edmilson Macalé e Ronnie Lessa, acusado de ter assassinado a vereadora a mando dos Brazão — o que os irmãos negam. Ainda conforme a PF, o delegado Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil do RJ, tinha garantido a impunidade aos assassinos — sua defesa diz que a acusação é 'fantasiosa'. A Polícia Civil não se manifestou até a publicação deste texto.

A participação de Lima foi crucial para a morte de Marielle e do motorista Anderson Gomes, segundo a investigação. Conforme a PF, ele contou aos irmãos Brazão que a vereadora era contrária ao desejo deles de destinar uma área da cidade à exploração imobiliária."[A infiltração] resultou na indicação de que Marielle pediu para a população não aderir a novos loteamentos situados em áreas de milícia", revela trecho do relatório policial sobre o papel de Lima.

Infiltrado foi preso em flagrante em 2019. Na ocasião, policiais encontraram uma pistola carregada com número de série raspado em seu apartamento — o que deu origem a um processo com documentação disponível para consulta no site do Tribunal de Justiça do Rio. A situação lhe rendeu em 2020 uma condenação de três anos de prisão, segundo a assessoria do tribunal.

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Denúncia do Ministério Público do Rio apontou posteriormente ligação de Lima com a milícia. De acordo com investigações, ele é suspeito de ser ligado, pelo menos desde 2015, à organização criminosa que atua em Rio das Pedras e Muzema, comunidades da zona oeste do Rio.

O que mais se sabe

Presidente do PSOL no Rio diz crer que Marielle foi morta pelo que representava e pelo enfrentamento do partido às milícias na cidade. "Nossa bancada toda sempre foi muito atuante em relação a temas urbanos e é difícil dizer que ela era mais atuante em relação a esse tema do que outros vereadores",afirmou.

Para Leal, monitoramento de outras figuras ligadas ao partido ratifica essa tese. De acordo com a Polícia Federal, o PM Ronnie Lessa fez consultas relacionadas a Isadora Freixo (filha do hoje deputado federal Marcelo Freixo), ao ex-vereador Renato Cinco e ao deputado federal Chico Alencar.

Oposição a interesses dos irmãos Brazão não era feita só pelo PSOL. Em discurso na tribuna da Câmara Municipal nesta terça (26), o vereador Paulo Pinheiro (PSOL) lembrou que Fernando William (vereador do PDT que morreu de covid-19 em 2021) foi um dos que mais brigaram contra o Projeto de Lei Complementar 174, de 2016.

Marielle tinha adversário na Câmara, mas nunca deixou passar a impressão de que tivesse inimigos. Muitas das respostas trazidas a público no último domingo são estarrecedoras
Paulo Pinheiro, vereador pelo PSOL

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O PLC 174/2016 era de autoria do então vereador Chiquinho Brazão (MDB). O texto flexibilizava exigências para regularizar imóveis na cidade, com exceção do centro e da zona sul — áreas sem presença de milícias. Segundo a Polícia Federal, aprovar o texto era prioridade para Chiquinho.

Marielle e o PSOL se posicionaram contra a medida. No entendimento da vereadora, o texto não atendia "áreas carentes", mas loteamentos e condomínios de classe média e alta em regiões controladas por milícias. Apesar da oposição, o texto foi aprovado em 23 de novembro de 2017, com 27 votos — apenas um a mais do que o mínimo necessário, o que enfureceu Chiquinho e foi, segundo a PF, um dos motivos para que ele e os irmãos encomendassem a morte de Marielle.

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