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PT aposta na periferia de São Paulo para frear '"voto útil" em Boulos

Boulos e Tatto disputam o eleitor de esquerda na corrida pela Prefeitura de São Paulo em 2020 - Reprodução
Boulos e Tatto disputam o eleitor de esquerda na corrida pela Prefeitura de São Paulo em 2020 Imagem: Reprodução

Amanda Rossi e Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

12/11/2020 04h00Atualizada em 12/11/2020 08h10

A periferia de São Paulo se tornou um terreno de disputa da esquerda nas eleições 2020. De um lado, a campanha de Jilmar Tatto (PT) deposita todas suas fichas nos extremos da cidade, onde o partido obteve seus melhores resultados em eleições anteriores. De outro, a campanha de Guilherme Boulos (PSOL) precisa avançar nos bairros periféricos para tentar chegar ao segundo turno.

Na última pesquisa do Ibope, divulgada na segunda-feira (9), Boulos aparece com 13% das intenções de voto, mais que o dobro de Tatto (6%). No Datafolha, divulgado na noite de ontem, eles estão com 16% e 4%, respectivamente. O candidato do PSOL só está atrás do atual prefeito e candidato à reeleição, Bruno Covas (PSDB). O bom desempenho de Boulos frente a Tatto fez crescer o debate sobre um "voto útil" do campo da esquerda, favorecendo o PSOL em detrimento do PT.

Mas a campanha petista pretende contar com a periferia para frear a estratégia do "voto útil" em Boulos. Segundo as últimas pesquisas Ibope e Datafolha, Tatto se sai melhor entre pessoas de renda baixa, de menor escolaridade. Já Boulos tem maior apoio entre eleitores de renda mais alta e com ensino superior. O raciocínio petista é que esse cenário vai dificultar a penetração da campanha de Boulos na periferia.

"Eu estou na rua todos os dias e o perfil do meu eleitor é mais popular, mas não é o perfil do Boulos, que é mais escolarizado", disse Tatto pelas redes sociais, nesta quarta-feira. "A gente está muito tranquilo. Não tenho nada contra o Boulos. Costumo dizer que ele é meu irmão mais novo", emendou em entrevista para a rádio Bandeirantes, também ontem.

"A gente vê muito pouco a campanha do Boulos na periferia. São eleitores diferentes", diz Débora Pereira, da coordenação de campanha do vereador Alfredinho (PT), que tenta se eleger para um novo mandato para a Câmara de Vereadores da capital. A campanha de rua feita pelos candidatos a vereador do PT é considerada um dos principais trunfos do partido na disputa por votos para Tatto.

"A discussão de voto útil não é uma discussão da periferia, é uma discussão da rede social. É um debate muito presente na classe média, muito intelectualizada. Já o eleitor da periferia não tá preocupado em voto útil, e sim em construir afinidade com o candidato", continua Débora.

Estratégia na periferia

Desde o início de novembro, a agenda de campanha de Jilmar Tatto está focada em carreatas na periferia. "Eu me propus a fazer uma campanha direcionada para a periferia. Eu consegui colocar a periferia na pauta política dessa eleição. Aliás, os outros candidatos começaram a colocar imagem de periferia, fazer coisas na periferia", disse Tatto para o UOL, durante carreata no Grajaú, zona sul, nesta quarta-feira.

Já Guilherme Boulos dividiu a agenda entre eventos no centro expandido e bairros periféricos, mas deve intensificar caminhadas e caravanas pela periferia paulistana a partir de hoje. Questionado pelo UOL, Boulos disse que já observa um crescimento de sua candidatura na periferia.

"Eu tenho confiança de que, além do eleitorado que eu já tenho consolidado, é a periferia que vai levar a gente para o segundo turno", disse o candidato do PSOL, em agenda de campanha no centro de São Paulo ontem.

Para chegar à periferia, a campanha do PSOL aposta na figura da candidata a vice na chapa de Boulos, a deputada federal Luiza Erundina. Desde 31 de outubro, Erundina tem participando de agendas em regiões periféricas da capital paulista. Em razão da idade da parlamentar, 85 anos, e da pandemia do novo coronavírus, a campanha construiu um "Erundinamóvel" para que ela pudesse se conectar com o eleitorado, buscando a lembrança de sua gestão na prefeitura, entre 1989 e 1992.

"Voto útil"

Após a publicação de reportagem do jornal "O Globo", nesta quarta-feira, dizendo que o PT estaria pressionando Tatto a apoiar Boulos já no primeiro turno em razão do "voto útil", o petista foi às redes sociais dizer que a tese de abrir mão de sua candidatura não reta final "interessa apenas ao Bruno Covas". A presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann também disse que a campanha de Tatto "segue firme nesta reta final". A eleição acontece no próximo domingo (15).

Petistas consultados pelo UOL rejeitaram a tese de o partido abrir mão de Tatto em prol de um "voto útil" para Boulos. "Isso seria desastroso para o PT e para as eleições", disse um membro da campanha. "Movimentos assim [pró-"voto útil"] teriam que ser feitos muito antes para ter algum efeito esperado."

Se no PT a tese de "voto útil" é oficialmente descartada, no PSOL a expectativa é que isso aconteça. "Vai ter o 'voto útil'. Eu acho que o Tatto não tem condições, empuxo para se alçar ao segundo turno. Ele está um pouco distante disso", diz o deputado federal Ivan Valente, um dos membros históricos do PSOL. "Você não arranca os 6% [do Tatto], mas talvez metade. O que já é quase ir para o segundo turno."

A avaliação petista é que o período eleitoral conseguiu desidratar Russomanno, candidato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que estava em alta na periferia no início da campanha. Mas os votos dele acabaram indo para os candidatos "mais conhecidos e moderados", beneficiando principalmente Covas. Por isso, há também a dúvida se os votos de Tatto iriam para Boulos, caso o primeiro declarasse apoio ao segundo.