Bolsonaro recicla mentiras, nega erro na pandemia e reforça conservadorismo
O presidente Jair Bolsonaro (PL) adotou um discurso conservador e repetiu mentiras e distorções em sabatina à Rede TV!, na noite de hoje. Na entrevista de 30 minutos —gravada pela manhã—, o chefe do Executivo foi pouco pressionado nas perguntas e teve espaço para reforçar discursos de campanha sobre temas como economia, educação, segurança pública e meio ambiente.
Em várias respostas, Bolsonaro enfatizou benefícios que seu governo teria proporcionado às mulheres, fatia do eleitorado no qual tem enfrentado mais resistência. Logo na primeira resposta, o presidente afirmou que sancionou mais de 60 projetos em defesa do público feminino, uma afirmação falsa, e também mentiu ou distorceu dados ao tratar de armas, conflitos no campo e desmatamento na Amazônia.
Políticas para as mulheres. Na primeira pergunta da entrevista, Bolsonaro foi perguntado sobre a dificuldade em conquistar o voto feminino. Em resposta, o presidente afirmou que essa rejeição é parte de "uma narrativa", porque ele trata as mulheres "com carinho e consideração" e o governo é responsável por "mais de 60 projetos sancionados" em defesa do público feminino.
A afirmação, que foi feita no debate presidencial do último domingo (28), é falsa. Conforme mostrou o UOL Confere, Bolsonaro sancionou 46 projetos ao longo do mandato, e nenhum deles foi de autoria do seu governo. Além disso, o presidente derrubou seis propostas, duas das quais passaram a valer após o Congresso derrubar os vetos.
O presidente também atribuiu outras medidas do governo como benéficas ao público feminino, tais como a Lei da Liberdade Econômica (porque teria permitido, por exemplo, que mulheres levem menos tempo para "abrir uma salão de beleza") e titulações de terras para pequenos proprietários rurais, porque a maior parte desse contingente seria formado por mulheres.
Erros sobre armas e violência no campo: Bolsonaro fez afirmações equivocadas ao tratar dos temas de segurança pública e conflitos na zona rural. Primeiro, voltou a relacionar a queda no número de homicídios desde 2019 à queda no controle sobre armas de fogo no mesmo período. É uma relação enganosa, segundo pesquisadores, que apontam outros motivos para a redução de mortes violentas.
Bolsonaro disse também que a violência no campo teria caído porque os proprietários rurais foram autorizados a circularem armados por toda a propriedade, e não mais apenas dentro de casa.
Você pode ver, a violência no campo caiu assustadoramente. Porque nós aprovamos no Congresso um projeto que visava dar a posse estendida da arma de fogo. Antes o fazendeiro, sitiante, só podia ter arma dentro da sua casa, ele agora pode montar um cavalo, bicicleta, uma motocicleta, ou um carro e andar armado em todo o perímetro da sua propriedade. E isso inibe a violência no Brasil
Jair Bolsonaro (PL), em sabatina à Rede TV!
Além de não haver dados que sustentem essa afirmação, o relatório anual da CPT (Comissão Pastoral da Terra), apresentado em maio, aponta que em 2021 houve um aumento de 75% no número de assassinatos em conflitos no campo na comparação com 2020. Foram 35 homicídios no ano passado, contra 20 no ano anterior.
Discurso conservador. Ao ser questionado sobre educação, Bolsonaro atribuiu problemas na área à politica adotada em governos anteriores que, segundo ele, dariam a espaço a questões como "ideologia de gênero" em detrimento do ensino de disciplinas tradicionais. O presidente afirmou que os livros didáticos foram alterados em seu governo para eliminar este tipo de conteúdo.
Em suas considerações finais, Bolsonaro afirmou que seu governo não está aberto a discussões como a legalização do aborto e das drogas e, mais uma vez, citou a ideologia de gênero, assunto com o qual encerrou a participação na sabatina:
O grande patrimônio nosso são os nossos filhos. Nós queremos que nossos filhos frequentem a escola atrás de conhecimento, e não de certas práticas, conhecidas como ideologia de gênero, onde se bota na cabeça da criança que se ele é menino hoje pode ser menina amanhã, e vice-versa.
Jair Bolsonaro (PL), em sabatina à Rede TV!
Erros na pandemia? Bolsonaro foi questionado se teria cometido erros na pandemia, mas negou: "Eu não posso falar em erros, que a gente sempre procurou conversar com muita gente, de forma rápida, para tomar decisões. Temos acertos", afirmou. Em outro trecho da resposta, o presidente reconheceu que "pode ter acontecido um equivoco ou outro", mas que nenhum passava pela cabeça dele naquele momento.
Ao falar sobre o assunto, Bolsonaro voltou a jogar a responsabilidade sobre os problemas "à política do fique em casa", culpou governadores e o STF (Supremo Tribunal Federal) e governadores, além de exaltar a recuperação econômica do país após o período mais agudo de contágio da doença.
"Com a política do fique em casa que a economia a gente vê depois, que eu fui contrário, e o Supremo disse que isso competia também aos governadores e prefeitos, e eles poderiam tomar medidas mais rígidas do que eu, basicamente a minha função foi entregar dinheiro para estados e municípios", declarou.
Desmatamento na Amazônia Questionado sobre meio ambiente, o presidente fez uma comparação à qual tem recorrido nas últimas semanas: de que o desmatamento na Amazônia nos primeiros três anos de governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi o dobro do registrado no mesmo período da gestão Bolsonaro.
O dado bruto está correto: segundo os números do PRODES, sistema de monitoramento do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a área desmatada no bioma nos primeiros três anos sob Lula (2003-05) foi de 72.128 km². Como afirma o presidente, foi mais do que o dobro da perda de vegetação de 2019 a 2021, quando foram desmatados 34.018 km².
Bolsonaro omite, porém, que a taxa registrada em 2002, que o petista herdou ao assumir o poder, havia sido quase o triplo da registrada em 2018, quando o atual presidente foi eleito. Além disso, o índice de desmatamento amazônico tem aumentado ano a ano sob a atual gestão, mas no governo Lula o número começou a cair a partir de 2005.
O presidente disse ainda que a Amazônia não pega fogo, o que não é verdade. No mês passado, o bioma registrou recorde de queimadas em 24h superando o episódio que ficou conhecido como 'dia do fogo' em 2019, quando fazendeiros e empresários orquestraram ação coordenada para provocar incêndios na região.
"Não pega fogo na floresta amazônica, isso é uma mentira "
No último dia 22 de agosto, foram registrados 3.358 focos de incêndio, segundo o Inpe, o maior número para o mês em cinco anos. A Amazônia é uma floresta úmida e o fogo natural não é comum no bioma, ou seja, os focos de queimadas são, em geral, provocados por ação humana, de acordo com o Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.