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Lula admite esquema na Petrobras, erro de Dilma e diz ter ciúme de Alckmin

Do UOL, em São Paulo

25/08/2022 20h38Atualizada em 26/08/2022 07h48

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tocou em temas espinhosos durante a sabatina do Jornal Nacional, da Rede Globo, na noite desta quinta-feira (25). Lula falou sobre casos de corrupção durante os governos petistas, defendeu sua gestão econômica e voltou a criticar a Operação Lava Jato.

Transmitida ao vivo, esta é a terceira entrevista de presidenciáveis no jornal neste ano e a primeira de Lula na emissora desde que saiu da prisão, em 2018. Em respostas aos apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos, o candidato elogiou ainda a aliança com o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), candidato a vice na sua chapa, e mandou indiretas ao presidente Jair Bolsonaro (PL), seu principal adversário na corrida ao Planalto.

Veja os destaques da entrevista, que durou 40 minutos:

  • Assumiu casos de corrupção na Petrobras, mas defendeu os mecanismos criados por seu governo
  • Defendeu Dilma Rousseff (PT), mas disse que errou na precificação da gasolina
  • Criticou a Lava Jato e afirmou que a operação "entrou no limite da política"
  • Brincou que tem "ciúme de Alckmin" por sua popularidade no PT
  • Fez indiretas a Bolsonaro e disse que não quer "amigo na PF"

O clima no estúdio: Lula estava descontraído. Sem mostrar qualquer descontentamento com a emissora, com a qual já teve atritos e que costuma criticar, o ex-presidente respondeu à maioria das perguntas com a variação entre humor e seriedade, muito usada em seus discursos, e soltou referências populares, como futebol e a comparação de Bolsonaro a um bobo da corte. Conforme o UOL havia adiantado, o petista se preparou para tocar em assuntos mais delicados e tinha como objetivo evitar confrontos.

Corrupção na Petrobras: Logo no início da sabatina, o ex-presidente falou sobre os casos de corrupção na Petrobras durante as gestões petistas. Confrontado por Bonner, Lula admitiu que houve crimes —já que teve confissão—, mas se defendeu ao afirmar que só houve delação porque o próprio governo estimulou investigação.

Você não pode dizer que não houve corrupção se as pessoas confessaram. O que é mais grave é que as pessoas confessaram, e por conta das pessoas confessarem, ficaram ricos por conta de confessar. Ou seja, foi uma espécie de uma delação premiada. Você não só ganhava a liberdade por falar o que queria o Ministério Público, como você ganhava metade do que você roubou. O roubo foi oficializado pelo Ministério Público."

A resposta de Lula, em uma espécie de morde e assopra, contempla críticas à forma como a Operação Lava Jato investigou o caso. "O correto era você fazer a investigação que tinha que fazer da forma mais correta possível, como fizeram no meu tempo que eu era presidente, e depois se a pessoa for inocente você absolve. Se a pessoa for culpada, você condena", completou.

Mais críticas à Lava Jato: Ainda sobre a operação, como tem feito em entrevistas desde que saiu da prisão em Curitiba, no fim de 2019, Lula teceu duras críticas ao ex-juiz Sergio Moro (União Brasil). Desde que ele foi considerado parcial e os processos, anulados, o petista tem subido o tom contra a operação e tratado do tema com mais naturalidade.

Lula, que já havia se preparado para falar do assunto, disse que, no julgamento, Moro levou uma "mentira que foi longe demais" e que sabia que seu julgamento "era parcial". A conclusão do Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) no mesmo sentido de parcialidade de Moro, em abril deste ano, tem sido usada como reforço no discurso lulista.

Se alguém comete um erro, um delito, investiga-se, apura, julga, condenou, absolve está resolvido o problema. O que foi o equívoco da Lava Jato? É que a Lava Jato enveredou por um caminho político delicado. A Lava Jato ultrapassou o limite da investigação e entrou no limite da política."

Defendeu sua gestão: Apesar de admitir os esquemas na Petrobras, Lula defendeu mecanismos de combate à corrupção, como o Portal da Transparência—criado em seu governo—, além de cutucar Bolsonaro ao falar que, na gestão petista, a Polícia Federal era independente e a lista tríplice na escolha da PGR (Procuradoria Geral da República) era respeitada. Lula, no entanto, citou como suas medidas anticorrupção criadas nos governos Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff.

Criamos o Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] para cuidar de movimentações financeiras atípicas e colocamos o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] para combater os cartéis. Ou seja, foram todas medidas no meu governo, além do que o Ministério Público era independente, além do que a Polícia Federal recebeu no meu governo mais liberdade do que em qualquer outro momento da história."

O tema corrupção não está entre os que mais preocupam os petistas —a avaliação, dentro do partido, é que ele já não é mais o centro da pauta, como foi no passado —em especial em 2018 —mas, quando for evocado, deve ser respondido na base jurídica. Ele ainda repetiu, na sabatina, que vai reforçar mecanismos contra corrupção.

Defesa e erro de Dilma: O petista elogiou a ex-presidente Dilma Rousseff, mas disse que, na sua avaliação, ela cometeu "um equívoco" em relação à precificação da gasolina. "Eu acho que cometeram equívoco na hora que fizeram R$ 540 bilhões de desoneração", apontou.

A Dilma fez um primeiro mandato presidencial extraordinário, porque crise se agravou, a crise internacional, mesmo assim ela se endividou para poder manter as políticas sociais e poder manter o emprego em 4.5% que foi o menor desemprego que nós tivemos na história desse país, era como se fosse o padrão Noruega, padrão holandesa."

Indiretas a Bolsonaro: Lula cutucou ainda a indicação de Augusto Aras na PGR (Procuradoria-Geral da República) —por parte do presidente Jair Bolsonaro (PL)— e os decretos de sigilo da atual gestão. Aras já arquivou mais de cem pedidos de investigação contra Bolsonaro encaminhadas pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

"Eu poderia ter escolhido um procurador 'engavetador'. Sabe aquele amigo que você escolhe que nenhum processo vai para frente? Eu poderia ter feito isso. Eu escolhi da lista tríplice", disse o petista.

Mas Lula foi questionado sobre o motivo pelo qual tem evitado responder se, caso eleito, irá ele próprio respeitar a lista tríplice feita pela ANPR (Associação Nacional de Procuradores da República) —e admitiu que faz uma provocação. "Porque eu quero que ele fique com uma pulguinha atrás da orelha. Não quero definir agora o que eu vou fazer."

Eu poderia por exemplo fazer decreto de cem anos, sabe decreto de sigilo hora está na moda agora? Eu poderia, para não apurar nada, decreto cem anos de sigilo para o Pazuello, ou poderia não investigar, pega um tapete e coloca em cima de qualquer denúncia e nada vai ser apurado e não vai ter corrupção."

Mensalão x Orçamento Secreto: Lula usou a estratégia de comparar aspectos de sua gestão à de Bolsonaro também quando foi confrontado com uma pergunta sobre o Mensalão, escândalo que envolvia pagamentos a deputados em 2005.

Na resposta, Lula trouxe à tona o orçamento secreto, esquema de transferência de emendas durante a gestão atual —essa também é uma estratégia da campanha, que eles chamam de "tratamento desproporcional aos casos".

Você acha que o Mensalão, que tanto se falou, é mais grave do que o orçamento secreto?"

Ainda falando sobre esse mecanismo, ele chamou Bolsonaro de "bobo da corte" e afirmou que não é o presidente que tem controle sobre sua gestão, mas o Congresso.

[Orçamento secreto] é usurpação do poder. Acabou o presidencialismo, o Bolsonaro não manda nada. O Bolsonaro é refém do Congresso Nacional. O Bolsonaro sequer cuida do orçamento, Renata, sequer cuida do orçamento. O orçamento quem cuida é o [presidente da Câmara, Arthur] Lira. Ele que libera verba. O ministro liga para ele, não liga para o Presidente da República."

Ciúme de Alckmin: Questionado por Bonner sobre a aceitação de Alckmin dentro do PT, Lula falou com entusiasmo da boa relação que tem estabelecido com o ex-tucano. "Eu estou até com ciúme do Alckmin. Você tem que ver que sujeito esperto", brincou.

Filiado ao PSB no início deste ano para integrar a chapa com Lula, o ex-governador paulista deixou o PSDB depois de 33 anos. A princípio, a união com o antes adversário gerou ruído dentro do PT, mas a união hoje é consenso dentro do partido.

O jornalista, no entanto, afirmou que uma ala do PT ainda tem resistência. "Nós não estamos vivendo no mesmo mundo", disse Lula.

Ele fez o discurso no dia 7 de maio, quando ele foi apresentado ao PT, que eu fiquei com inveja, ele foi aplaudido de pé. Pergunta para a esposa dele, para a dona Lu [Alckmin], que anda com a Janja [esposa de Lula], para ver como ela está gostando da coisa. O Alckmin já foi aceito pelo PT de corpo e alma."

Proximidade com o agro: O ex-presidente tratou ainda da reaproximação que a campanha tem procurado com o agronegócio. Recentemente, a equipe de Lula tem feito incursões no Centro-Oeste, polo do setor, em especial por meio de Alckmin.

O setor costuma ser ligado a Bolsonaro. Lula, porém, afirmou que o apoio se dá apenas por parte de armamentistas e empresários que são a favor do desmatamento ilegal, que cresceu na gestão atual.

O Bolsonaro está ganhando alguns fazendeiros porque está liberando arma, tem gente que acha que é bom ter arma em casa, que acha que 'eu vou matar alguém'. Não. O que nós queremos é pacificar esse país, porque o pequeno produtor rural e o médio tem que conviver pacificamente com o grande negócio."

Segundo o ex-presidente, "empresários sérios que trabalham no agronegócio" não querem desmatar, "querem preservar nossos rios, nossas águas e nossa fauna".

Agenda: A sabatina durou 40 minutos. No fim, o ex-presidente disse que o tempo passou rápido —um comentário semelhante foi feito por Bolsonaro, o primeiro presidenciável entrevistado por Bonner e Renata, na segunda-feira (22).

Ciro Gomes (PDT) participou da série na quarta (23). Amanhã, será a vez de Simone Tebet (MDB). A ordem foi definida por sorteio.

Veja tudo o que rolou na cobertura da entrevista de Lula no Jornal Nacional e as análises dos colunistas do UOL.