Jingle gospel e sem cervejinha: Encontro de Lula com evangélicos vira culto
Oração conjunta, louvores, leitura de versículos bíblicos e uso de vocabulário cristão. O encontro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com evangélicos hoje em São Gonçalo ganhou ares de culto. O município da região metropolitana do Rio de Janeiro é o segundo maior colégio eleitoral do estado.
Realizado para aproximar a campanha petista do eleitorado cristão —grupo em que o presidente Jair Bolsonaro (PL), seu principal adversário, está mais bem consolidado—, o evento teve apresentação de jingles gospel e a leitura da Carta de Evangélicos a Lula.
Aceno aos cristãos. Lula procurou mostrar proximidade com a religiosidade evangélica e que acredita em Deus. Ele reforçou o compromisso com a liberdade religiosa, disse que pretende "fazer um governo para todos" e voltou a reforçar que o Estado é laico —tudo isso sem deixar de cutucar Bolsonaro.
Eu aprendi que o Estado não deve ter religião, não deve ter igreja, deve garantir o funcionamento da igreja. Eu posso dizer para vocês, eu admito um ser humano normal mentir, mas não é aceitável um pastor que diz que fala em nome de Deus, mentir. Ninguém deve utilizar o nome de Deus em vão."
Lula, em São Gonçalo (RJ)
O voto evangélico é um dos redutos mais sólidos do presidente nesta eleição e Lula tem tentado se aproximar. A campanha, no entanto, evita entrar nas chamadas "pautas de costume" —algo que, no entendimento petista, seria uma guerra perdida.
Se não pretende entrar em temas conservadores, foca no bolso e tenta desmentir fake news relacionadas a religião, como o boato sobre o fechamento de igrejas. Hoje, a campanha pretendeu dialogar em especial com as pequenas igrejas, que consideram de entrada mais fácil.
Leitura de versículos e vocabulário cristão. Em clima de culto, o palco do evento contou, inclusive, com leitura bíblica. Uma representante subiu ao púlpito e leu um trecho do livro bíblico de Isaías, capítulo 58, a partir do versículo 3.
Os políticos presentes pontuaram suas falas por jargões e termos comumente atribuídos aos cristãos. O deputado estadual André Ceciliano (PT-RJ), candidato ao Senado, comparou Bolsonaro aos "ímpios", pessoas contrárias à Lei de Deus.
Já o deputado federal Marcelo Freixo (PSB-RJ), candidato ao governo estadual, iniciou sua fala dizendo que iria "dar um testemunho", termo também utilizado pelo candidato à vice-presidência Geraldo Alckmin (PSB).
Em sua fala, Freixo exaltou e enfatizou o trabalho social feito por lideranças evangélicas, em especial dentro das penitenciárias.
Sem cervejinha. O tom das falas do ex-presidente também sofreu mudanças sutis e pontuais. Frase comum em seus discursos, Lula alterou o "churrasquinho e cervejinha" para dialogar melhor com o público, suprimindo a bebida alcoólica.
Quando eu falo de churrasquinho, não estou brincando. Eu falo porque sei que no Rio de Janeiro o povo adora se reunir no fim de semana para comer um churrasquinho, reunir a família e repartir o pão."
Lula, a evangélicos
Economia sempre. Como previsto, o viés econômico foi mantido. Embora o discurso tenha sido moldado ao público, não houve embate por costumes conservadores e sim foco em temas comuns como renda, poder de compra e inflação, caros especialmente às classes média e baixa, absoluta maioria do público.
"Pobre não pode viajar, não tem que comer em restaurante. É mentira! Ninguém vai por opção ser pobre. Todo mundo quer comer carne de primeira, todo mundo quer ir para restaurante, todo mundo quer ter casa, todo mundo quer ter computador", declarou o ex-presidente, em fala recorrente, mas que, neste contexto, alinhada com o discurso da prosperidade cristã.
Gospel lulista. O evento teve ainda a apresentação de dois novos jingles, promovidos pela frente evangélica, de apoio a Lula. Com lançamento de vídeo, que deve ser usado pela campanha, as letras dizem que não é pecado votar em Lula e que "não é para promover a morte".
O crente deve, sim, em Lula votar
Ele deve, sim, não é pecado, não
Ele pode, sim, a vida festejar e crer que dias melhores virão"
Jingle evangélico para Lula
As músicas foram recebidas com entusiasmo pelo público, que cantou e dançou acompanhado pelo folheto distribuído com a letra do louvor.
O jingle tradicional, "Sem Medo de Ser Feliz", reedição da campanha de 1989, foi deixado de lado. Geralmente apresentada por Janja da Silva, esposa do ex-presidente, que canta e dança enquanto o clipe é transmitido —sempre antecedendo as falas de Lula—, dessa vez a música ficou para o fim do evento, sem imagens.
Contra armas. Alckmin também focou sua fala no apelo social e criticou Bolsonaro pelo viés armamentista do governo, que vem flexibilizando posse e compra de armas. Ele disse que o seu "testemunho" era o que tem ouvido na campanha de eleitores, que querem Lula de volta.
Jesus disse: amai-vos uns aos outros, ele nunca disse armai-vos uns aos outros. Um milhão de armas. Metade das mulheres mortas [é] por armas de fogo. Quando a mulher é ameaçada, a família é ameaçada. Por isso, é uma alegria estarmos juntos. A política bem feita, com amor ao próximo."
Geraldo Alckmin, a evangélicos
"Quem tá comprando arma é algum trabalhador aqui? Alguma trabalhadora? Algum pastor? Para que um pai de família quer uma arma dentro de casa?", completou Lula, durante sua fala. Na carta lida para a campanha, a frente evangélica também prega o desarmamento.
Oração final. Ao fim do discurso de Lula, uma das pastoras voltou ao palco para abençoar o ex-presidente. Em sua fala, ela pediu: "Senhor, desfaz as obras contra a vida deste homem". Ao longo de dois minutos, a pastora também pediu bênçãos para que Lula "possa governar com inteligência e sabedoria".
"Cubra ele com teu sangue, Senhor, e que a glória da última casa seja maior do que a da primeira", disse, em alusão a outra passagem bíblica —momento em que a plateia reagiu.
Reduto petista. São Gonçalo é o segundo maior colégio eleitoral do estado do Rio de Janeiro com 665.212 eleitores, segundo informação do TRE-RJ (Tribunal Regional Eleitoral) relativa a maio.
Apesar de ter sido derrotado na eleição à prefeitura em 2020, o PT esteve à frente nas pesquisas durante a campanha e obteve votação expressiva em São Gonçalo.
A disputa no segundo turno foi acirrada. O atual prefeito Capitão Nelson (Avante) recebeu 50,7% dos votos, e seu adversário Dimas Gadelha (PT), 49,2%, segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Nelson se aliou a bolsonaristas e usou o antipetismo em sua campanha.
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