UOL vai ao STF contra censura, e André Mendonça será relator do caso
O UOL entrou hoje com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a decisão judicial que censurou as reportagens do site sobre as compras de imóveis da família do presidente Jair Bolsonaro (PL). O ministro André Mendonça, indicado por Bolsonaro ao STF, foi sorteado como relator do caso.
Na reclamação, o UOL pede que a decisão da Justiça de Brasília seja derrubada de forma liminar (provisória), antes do julgamento definitivo sobre o caso. Segundo a advogada Taís Borja Gasparian, que assina a peça, a censura é inconstitucional.
Mendonça, que foi indicado para o cargo de ministro do STF por Bolsonaro, assumiu a relatoria do caso por meio de sorteio, que é feito por um sistema eletrônico da Corte. Caberá a Mendonça decidir se acata ou não a reclamação do UOL.
Além da ministra Rosa Weber, presidente do STF, também foi excluído do sorteio o ministro Alexandre de Moraes, que comanda o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Conforme o regimento interno do Supremo, o presidente do TSE deve ficar de fora de sorteios em processos com pedido liminar — como é o caso da ação movida pelo UOL — nos três meses antes das eleições e um mês depois.
Por que as reportagens do UOL foram censuradas? Dois textos do UOL, que tratam do uso de dinheiro vivo em 51 dos 107 imóveis comprados pela família Bolsonaro nos últimos 30 anos, foram tirados do ar por uma decisão do juiz Demetrius Gomes Cavalcanti, do TJ-DFT (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios).
A pedido do senador Flávio Bolsonaro (PL), filho mais velho do presidente, Cavalcanti ordenou que o UOL removesse não apenas as matérias, mas também as postagens sobre o assunto de suas redes sociais. O UOL cumpriu a decisão, mas recorreu.
Em sua decisão, Cavalcanti afirma que a reportagem cita dados de investigação do MP (Ministério Público) do Rio que foram, em parte, anulados pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Por essa razão, segundo o magistrado, as informações não poderiam ter sido citadas em reportagem, mesmo que sejam verídicas e tenham tido origem e status de uso em processo judicial informados no texto publicado pelo UOL.
O que argumenta o UOL? A defesa pede que a decisão da Justiça de Brasília seja derrubada de imediato, mesmo antes do julgamento definitivo sobre a questão. Isso porque, segundo a defesa, há um risco de dano irreparável com a manutenção da censura, "pelo evidente prejuízo ao acesso, pelos cidadãos, de informações de interesse público, envolvendo a aquisição de imóveis com uso de dinheiro em espécie pela família Bolsonaro".
A reclamação é baseada, essencialmente, em três argumentos:
- Que as premissas da Justiça de Brasília sobre a reportagem, que foram usadas para aplicar a censura, são equivocadas.
- Que a decisão viola um entendimento do STF, firmado pela ADPF 130 (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental), julgada em 2009, que impede a censura à imprensa.
- Que o direito de defesa do UOL foi prejudicado, já que o processo na Justiça de Brasília tramita em sigilo e que a censura foi determinada antes que o site fosse ouvido.
Segundo a defesa do UOL, o Supremo estabeleceu "a impossibilidade de imposição de censura de qualquer natureza à imprensa, mesmo quando diante da possibilidade de eventual dano a direito personalíssimo".
O UOL agiu no regular exercício da liberdade de informação, amparado pela Constituição Federal que, cabe lembrar, veda qualquer restrição à liberdade de imprensa e, principalmente, proíbe qualquer forma de censura, quer prévia, quer posterior
Trecho da reclamação do UOL enviada ao STF
Com base em que fundamentos as reportagens foram censuradas? A decisão do juiz Demetrius Cavalcanti argumenta que o UOL "excedeu o direito de livre informar", por duas razões:
- Porque as reportagens teriam obtido algumas informações sigilosas contidas em investigação criminal anulada
- Porque os textos teriam vinculados fatos -- as compras de imóveis pela família Bolsonaro -- a "suposições" de que o dinheiro teria origem criminosa, uma afirmação que não teria respaldo da Justiça
Cavalcanti alegou, ainda, que havia urgência em censurar as reportagens porque a manutenção dos textos afetaria a "lisura do processo eleitoral", por levar prejuízos à "imagem e honra perante a opinião pública" de Bolsonaro e dos filhos.
Informações foram obtidas legalmente. O UOL sustenta que as premissas do magistrado estão equivocadas. Sobre a elaboração das reportagens, a defesa argumenta que os textos foram construídos com base em 1.105 páginas de 270 documentos públicos, coletados junto a cartórios, além de visitas dos jornalistas às cidades onde a maioria dos imóveis foi comprada.
As informações sobre as investigações contra a família Bolsonaro, citadas pela Justiça como argumento para a censura, "foram utilizadas como suporte e não como base da apuração jornalística". Além disso, o UOL informou todas as circunstâncias das investigações, inclusive o fato de que parte delas será refeita após decisão do STJ.
Toda a apuração objeto das matérias, de que parte das aquisições de 51 dos 107 imóveis da família se deu com dinheiro em espécie, foi feita com base em documentos públicos e em entrevistas realizadas com os envolvidos nas transações imobiliárias
Trecho da reclamação do UOL enviada ao STF
Não houve incriminação a Flávio Bolsonaro. Em um trecho da decisão, Cavalcanti alega que o UOL teria feito a "suposição" de que o dinheiro usado para comprar os imóveis teria origem criminosa. A afirmação, todavia, é incorreta: as reportagens não imputam qualquer crime a Bolsonaro e aos familiares.
Isso foi reconhecido inclusive pelo Ministério Público, ao se manifestar sobre o processo movido por Flávio Bolsonaro na Justiça de Brasília. Na manifestação, o MP afirma que "não restou demonstrada a prática dos delitos de calúnia e difamação; o conteúdo jornalístico não apresentou ofensa à honra e à dignidade do querelante".
De que tratam as reportagens censuradas? A primeira matéria, publicada em 30 de agosto, informou que o clã Bolsonaro usou R$ 13,5 milhões (R$ 25,6 milhões atualizados pelo IPCA) para comprar imóveis com dinheiro em espécie, total ou parcialmente, desde o início da década de 1990.
O segundo texto, publicado em 9 de setembro, detalha as evidências de uso de dinheiro vivo em cada uma das 51 transações relatadas pela reportagem, produzida durante sete meses e com base em informações colhidas em 270 documentos obtidos em cartórios.
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