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Bolsonaro volta a atacar reportagem sobre imóveis: 'Não tenho nada a ver'

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

26/09/2022 22h20Atualizada em 26/09/2022 23h27

O presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a atacar hoje, em entrevista ao Jornal da Record, a reportagem do UOL que mostrou que quase metade do patrimônio em imóveis do candidato à reeleição e de seus familiares foi adquirido, total ou parcialmente, com uso de dinheiro em espécie nas últimas três décadas.

Apuração dos jornalistas Juliana Dal Piva e Thiago Herdy mostrou que, desde os anos 1990, o presidente, irmãos e filhos negociaram 107 imóveis, dos quais pelo menos 51 foram adquiridos com uso de dinheiro vivo. Os textos chegaram a ser censurados pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, mas o ministro do STF André Mendonça derrubou a censura. (Para ler as reportagens, clique aqui e aqui)

Membros da família Bolsonaro no levantamento. "Nesse bolo entrou cinco irmãos, duas ex-mulheres, minha mãe falecida, um ex-cunhado e mais algumas pessoas. O que eu tenho a ver com a compra de imóveis por essas pessoas? Eu não tenho nada a ver com isso. Eu estou longe do Vale do Ribeira há muito tempo. Ao longo de 32 anos esse ex-cunhado, que tem o maior número de imóveis comprados, ele tem umas 30 lojas comerciais no Vale do Ribeira, entre móveis e material de construção. Tem compra de lote dele, com imóveis, de R$ 3 mil", disse o presidente à Rede Record.

Porém, o presidente erra ao citar a quantidade de imóveis que pertencem ao cunhado José Orestes Fonseca e sua irmã, Maria Denise Bolsonaro. De acordo com o levantamento patrimonial realizado pelo UOL, 8 dos 51 imóveis pagos em dinheiro foram comprados por este braço da família.

Maria Denise, irmã de Bolsonaro, e José Orestes se casaram em 1980, sob o regime de comunhão universal. Atualmente os dois vivem separados, mas ainda brigam pela divisão dos bens.

Até que a disputa se resolva, do ponto de vista legal, o patrimônio ainda pertence a ambos —incluindo bens que tenham sido adquiridos recentemente.

O patrimônio abrange quase uma dezena de lojas, uma casa de veraneio à beira-mar em Cananéia, no litoral sul paulista, com lancha e jet-ski, e duas mansões localizadas dentro de uma área de mais de 20 mil metros quadrados no centro de Cajati, no interior de São Paulo.

Ao contrário do que diz Bolsonaro, matéria cita venda de imóveis. "A matéria do UOL não diz os imóveis que foram vendidos. O meu filho Flávio só tem um imóvel e está na conta dele 15 imóveis. Ele comprou na planta duas no passado, barato, e revendeu na frente com um pouco de lucro, depois revendeu tudo e comprou uma casa muito boa em Brasília com metade de financiamento, é entra na conta nossa como se nós tivéssemos... como se fosse um grande propinoduto da minha parte para abastecer familiares. Mas não aponta de onde poderia vir possivelmente esses recursos."

A primeira reportagem do caso, publicada em 30 de agosto, cita que até 1999, a família Bolsonaro havia adquirido 12 imóveis e, nos anos seguintes, uma parte seria vendida, outra comprada. Em 2022, a família seguia proprietária de 56 dos 107 imóveis transacionados nas últimas décadas.

Matéria explica o que é "moeda corrente". "Você só pode ser um criminoso, praticar corrupção se tiver cargos, nunca tive um cargo no governo Fernando Henrique. Obviamente, não tive de Lula, nem Dilma. Nunca tive um cargo por mais humilde que seja em qualquer Ministério, em qualquer estatal, em qualquer governamental, por que essa acusação barata? E lá diz dinheiro vivo. Qualquer transação se você for olhar na escritura está escrito 'moeda corrente'. O que é moeda corrente? Moeda corrente é naquela época."

As compras registradas nos cartórios com o modo de pagamento "em moeda corrente nacional", que é a expressão padronizada para repasses de valores em espécie, totalizaram R$ 13,5 milhões. Em valores corrigidos pelo IPCA, este montante equivale, nos dias atuais, a R$ 25,6 milhões, apontam as reportagens do UOL.

Algumas das escrituras consultadas pela reportagem trazem expressões ainda mais precisas sobre o uso de dinheiro vivo, como moeda "contada e achada certa" ou "em espécie". A reportagem também se baseia em entrevistas com parte dos vendedores e consultas aos próprios cartórios de notas.

STF negou pedido de senador. "Agora pegar imóveis desde 1990 e botar na minha conta? Por que não fez com os demais candidatos? Por que para cima de mim? E agora esse assunto foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal como sendo um assunto criminoso e mentiroso."

No sábado (24), o ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), negou pedido apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) para investigar operações imobiliárias do presidente Jair Bolsonaro e sua família. A petição rejeitada tinha como base a matéria do UOL.

Na decisão, Mendonça — que foi indicado ao STF por Bolsonaro — argumenta que as imputações apresentadas pelo senador foram extraídas apenas das reportagens. "Sem que tenham sido apresentados indícios ou meios de prova minimamente aceitáveis que corroborem as informações contidas na referida matéria jornalística".

Apesar da decisão do ministro, os textos publicados pelo UOL foram construídos com base em 1.105 páginas de 270 documentos públicos, coletados junto a cartórios, além de visitas dos jornalistas às cidades onde a maioria dos imóveis foi comprada.

A reportagem "Clã Bolsonaro: as evidências de dinheiro vivo em cada um dos 51 imóveis" ainda traz informações de cada um dos imóveis, a data de transação, valor e a explicação sobre o uso dinheiro vivo, além de imagens com trechos das escrituras.