Topo

PT não espera ajuda em transição de governo e teme sabotagem de Bolsonaro

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) faz comunicado à nação após apuração dos votos, em São Paulo - NELSON ALMEIDA / AFP
O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) faz comunicado à nação após apuração dos votos, em São Paulo Imagem: NELSON ALMEIDA / AFP

Do UOL, em São Paulo

01/11/2022 04h00

O PT não espera uma transição tranquila entre a gestão Jair Bolsonaro (PL) e o futuro governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O partido não espera qualquer facilitação da gestão atual no acesso a dados e informações, e diz temer até sabotagem nestes dois meses até a posse.

Legalmente, o governo atual é obrigado por lei a designar uma equipe oficial para fazer a transição e inteirar o grupo eleito sobre as condições atuais de cada órgão. Receoso, o PT tem tomado a dianteira do debate e procurado representantes do governo, como o ministro Ciro Nogueira (PP), da Casa Civil.

O vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), deverá liderar o grupo petista. Mas, para o partido, a demora de Bolsonaro em admitir a derrota já indica que não será uma tarefa fácil.

Sem ajuda. Lula foi eleito no domingo (30) com 50,90% dos votos válidos, contra 49,10% de Bolsonaro. É a primeira vez que alguém chega ao terceiro mandato no Planalto.

O resultado foi oficializado pouco antes das 20h do domingo. Até a noite de ontem (31), Bolsonaro não havia reconhecido a derrota publicamente nem ligado para Lula. Para o PT, a demora de Bolsonaro é só o primeiro passo de um período conturbado de dois meses, mas não chega a ser exatamente uma surpresa.

Com Lula liderando as pesquisas desde o ano passado e as diversas ameaças do presidente em não aceitar o resultado, o partido se prepara há meses para fazer uma transição praticamente sozinho.

Para a cúpula petista, já está dado que Bolsonaro só deverá fazer o que a lei manda —e de jeito protocolar e mal feito. Petistas acham que as pastas não darão acesso a parte das informações.

Alguns ministérios podem ser pior do que outros, em especial os geridos por ministros ligados à chamada "ala ideológica" do governo, como Comunicações, Educação, Relações Exteriores e Defesa.

O UOL Notícias procurou o Planalto para saber sobre transição, mas não obteve retorno.

Jogando o jogo. Oficialmente, no entanto, o PT tem falado em fazer a transição da forma mais pacífica possível. Embora admita que possa haver dificuldades, a presidente petista, a deputada federal Gleisi Hoffmann, tem falado em esperar o governo.

Segundo Gleisi, a gestão atual tem 48 horas após a eleição para indicar um representante oficial para dialogar com o grupo petista. Se o prazo for seguido, acaba amanhã (2).

Nós vamos entrar em contato com eles. Eu acho que tem os representantes dos partidos políticos que apoiaram Bolsonaro. Temos responsabilidade com o país e queremos fazer com que a coisa seja mais tranquila e razoável possível
Gleisi Hoffmann, presidente do PT

"Nós, primeiro, queremos formar o nosso grupo de transição. E, aí, temos que pedir informações, saber como é que está", completou, descartando uma possível judicialização.

Medo de sabotagem. Nos bastidores, no entanto, há ainda um medo de que setores do governo atual façam um movimento de sabotagem deliberado: deixem a nova gestão no escuro ao máximo que puder e, em casos extremos, cheguem a apagar arquivos.

Para parte da cúpula, isso poderia se dar tanto para atrapalhar a gestão petista quanto para esconder possíveis desmandos do governo atual.

Com ajuda de servidores. Tentar minimizar os danos, o partido já tem articulado com servidores de carreira de diferentes ministérios —incluindo funcionários que estavam nas pastas desde as gestões petistas (2003-2016)— para saber a real situação dos órgãos.

Segundo fontes ligadas ao partido, isso tem acontecido desde o meio do ano de forma orgânica. Em grupos de WhatsApp, servidores preocupados têm procurado lideranças petistas para se oferecer para ajudar a evitar possíveis boicotes.

O objetivo do partido é que, até dezembro, eles tenham informações de todos os 23 ministérios caso a gestão Bolsonaro de fato complique.

Educação preocupa. Com diferentes trocas no comando e envolvido em supostos esquemas de corrupção, o MEC (Ministério da Educação) também levanta preocupação para o processo de transição. Entre os servidores de carreira, com perfil técnico, há receio de como as próximas etapas serão feitas e até mesmo se o trabalho será paralisado com o objetivo de atrapalhar o futuro governo.

Ao longo do governo Bolsonaro, especialistas apontaram desmonte na pasta e em outras áreas do ministério, como o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), responsável pelo Enem, e o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), responsável por orçamento bilionário.

Um servidor ouvido pela reportagem disse que "existe uma eletricidade no ar". No Inep, a preocupação é menor, porque o instituto é presidido atualmente por um servidor de carreira. O órgão é responsável por dados educacionais de todo o Brasil.

Sob o comando do vice. Para a formulação da transição, os dois grupos elegem um coordenador de equipe para concentrar o diálogo e fazer as tratativas. No PT, o nome mais forte é de Alckmin.

O ex-ministro Aloizio Mercadante (PT), que coordenou o plano de governo da campanha, também é cogitado, mas há a avaliação de que Alckmin, com seu perfil de centro, é a figura perfeita para representar o governo de coalizão que os petistas estão se propondo.

O nome deverá ser anunciado entre hoje e amanhã (2).