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Justiça pede ajuda "multidisciplinar" para decidir destino de bebê Charlie

Charlie, filho de Connie Yates e Chris Gard - AP - AP
Charlie, filho de Connie Yates e Chris Gard
Imagem: AP

Do UOL, em São Paulo

13/07/2017 14h42Atualizada em 13/07/2017 14h54

A segunda audiência sobre o futuro de Charlie Gard ocorreu nessa quinta-feira (13) e o futuro do bebê continua incerto. O juiz, Nicholas Francis,  defendeu um encontro multidisciplinar em alguns dias para analisar a situação do bebê. O juiz também convidou especialistas a visitarem Charlie no hospital em Londres para fazerem uma reavaliação de sua condição.

Charlie sofre de uma síndrome rara e não consegue se mexer nem respirar sozinho. O caso é considerado incurável e os médicos ingleses pretendiam desligar os aparelhos que mantêm o bebê vivo.

O encontro multidisciplinar, segundo o juiz, seria uma forma de se buscar um melhor entendimento do ponto de vista de cada uma das partes do caso. Uma nova audiência foi marcada para esta sexta-feira (14) para se avaliar o quão próximo de um consenso estão as partes envolvidas.

O que leva o juiz a demorar para tomar uma decisão sobre o caso é a preocupação em garantir que exista algum tipo de tratamento que possa aumentar as expectativas de vida de Charlie.

O não desenvolvimento de seu crânio e o mal funcionamento cerebral foram os pontos mais abordados na audiência desta quinta-feira. Uma disfunção cerebral poderia ser potencialmente curada, já um dano cerebral é algo considerado "incurável" por especialistas. Por esse motivo, o juiz e as testemunhas da audiência concordaram em fazer uma avaliação final sobre as funções cerebrais de Charlie e realizar uma audiência em uma próxima data.

Connie Yates e Chris Gard - Peter Nicholls/ Reuters - Peter Nicholls/ Reuters
13.jul.2017 - Os pais de Charlie Gard, Connie Yates e Chris Gard, chegam ao tribunal em Londres
Imagem: Peter Nicholls/ Reuters

Durante o julgamento dessa quinta-feira (13), testemunhas --especialistas de Nova York-- foram ouvidas. Elas disseram que o tratamento experimental que pode ser realizado em Charlie, foi testado em outros pacientes e os tratamentos mostraram uma chance de melhora na força muscular de 11% a 56%, porém as pesquisas foram feitas sob condições diferentes da de Charlie, o que significa que nele podem não ter o mesmo efeito.

Além disso, os especialistas contrariaram a afirmação feita pelo hospital de que "existem sinais de deterioração" em Charlie e de que ele não tem nenhuma "perspectiva real de qualidade de vida", ao dizerem que "ninguém pode afirmar que os seus danos cerebrais são irreversíveis" e que pelas evidências fornecidas pelo hospital não "foram vistos sinais de dano na estrutura cerebral".

O julgamento foi marcado também por um desentendimento. Os pais de Charlie deixaram a Corte por alguns minutos, após discordarem do juiz a respeito da qualidade de vida do seu filho. Depois de um intervalo, tudo voltou ao normal.

A mãe de Charlie, Connie Yates, interrompeu o juiz quando ele disse que os pais tinham dito que eles não queriam prolongar a vida de Charlie nas atuais condições, apenas se houvesse chances de melhora. "Eu nunca disse isso", ela gritou do banco atrás de seu advogado. O juiz, então, tentou esclarecer o que um ou outro dos pais teriam dito, mas ambos haviam deixado o tribunal. Eles apenas voltaram para o tribunal após o intervalo para o almoço.

O pai de Charlie, Chris, socou a mesa e disse: "Eu pensei que isto [o julgamento] deveria ser independente".

Disputa na justiça

Na audiência de segunda-feira (10), a Corte britânica ofereceu aos pais do garoto a chance de apresentarem novas evidências que provem que o seu filho deveria receber um tratamento experimenta.

O juiz do caso, Nicholas Francis, insistiu que é preciso ter "novas e poderosas" evidências para reverter a decisão de impedir Charlie de viajar para o exterior para tratamento e a autorização para o hospital desligar os aparelhos que mantêm o bebê vivo. "Não há uma única pessoa que não queira salvar Charlie. Se há uma nova evidência, eu vou ouvir", disse.

Pessoas demonstram suporte ao tratamento que pode salvar a vida de Charlie - NEIL HALL/REUTERS - NEIL HALL/REUTERS
Pessoas demonstram apoio ao tratamento que pode prolongar a vida de Charlie
Imagem: NEIL HALL/REUTERS

Charlie Gard tem 11 meses de idade e sofre de síndrome de miopatia mitocondrial, uma síndrome rara que provoca a perda da força muscular e danos cerebrais. Com dois meses de idade ele precisou ser internado no Hospital Great Ormond Street, em Londres, onde permanece internado desde então.

O serviço de saúde pública do Reino Unido (NHS) disse que o bebê tem danos cerebrais irreversíveis, que o impedem de se mover, escutar, respirar e a sua respiração só funciona por meio de aparelhos.

Os tribunais anteriores haviam decidido que Charles não poderia receber um tratamento para sua síndrome e que os aparelhos que o mantêm vivo deveriam ser desligados, pois a posição anterior do hospital em que está internado era de que o tratamento experimental era "injustificado" e poderia causar a Charlie mais sofrimento para um caso onde não havia cura.

Porém na última sexta-feira (7) o hospital mudou de postura e pediu a reavaliação do Caso à Suprema Corte, após "novas evidências mostrarem um potencial tratamento para sua condição".

Sob as leis britânicas, é comum a corte intervir quando pais e médicos discordam sobre o tratamento de uma criança, como em casos onde as crenças religiosas dos pais proíbem transfusão de sangue.

Tratamento

Uma grande quantidade de apelos foi feita por apoiadores que se identificam com o caso e que defendem que o bebê pode ser salvo através de um tratamento experimental. O Hospital Pediátrico Bambino Gesú, que é de propriedade do Vaticano, enviou uma carta escrita por sete médicos, especialistas internacionais, para a Corte britânica dizendo que a nova droga utilizada no tratamento "pode funcionar".

De acordo com os primeiros estudos, essas moléculas podem superar a barreira hematoencefálica, que separam os vasos sanguíneos do cérebro, e assim ter impacto na miopatia mitocondrial - que é uma doença considerada incurável até o momento.

O caso ganhou atenção mundial após o papa Francisco declarar apoio aos pais de Charlie e disse que reza por eles, "na esperança de que seu desejo de acompanhar e cuidar do próprio filho até o fim não seja ignorado". 

O presidente dos EUA, Donald Trump, também se manifestou sobre o caso no Twitter e disse que gostaria de ajudar Charlie a receber tratamento.

"Se pudermos ajudar o pequeno #CharlieGard, como nossos amigos do Reino Unido e o papa, ficaríamos felizes em fazê-lo", escreveu Trump.

Em uma entrevista feita na BBC Radio 4, momentos antes do julgamento dessa segunda-feira, a mãe de Charlie, Connie Yates, chegou a afirmar que os comentários feitos pelo papa e por Trump "salvaram a vida" de seu filho e transformaram a luta por sua sobrevivência "em um problema internacional".

A tentativa de salvar o garoto Charlie mobilizou milhares de pessoas em todo o mundo e uma campanha organizada pelos pais de Charlie em um site de financiamento coletivo para custear o tratamento nos EUA conseguiu arrecadar 1,3 milhão de libras (cerca de R$ 5,5 milhões). Porém, eles não têm autonomia para transferir o bebê para os EUA enquanto a Suprema Corte britânica não determinar.