Quem são as testemunhas de Jeová, consideradas 'seita extremista' na Rússia
A Rússia anunciou nesta terça-feira (7) que quatro membros do grupo cristão Testemunhas de Jeová foram condenados a seis anos de prisão por "extremismo". Desde 2017, o país classifica o movimento como uma seita totalitária e ordena a sua dissolução, alegando que a organização promove suas crenças como superiores a outras religiões.
Calcula-se que existem 175.000 testemunhas de Jeová na Rússia, que são igualadas pelas autoridades locais a membros de organizações terroristas, como grupos neonazistas e Estado Islâmico.
Aqueles acusados de participar das Testemunhas de Jeová podem pegar até seis anos de prisão, e os organizadores até 10 anos. Muitas vezes, apenas o fato de orar em grupo pode ser suficiente para a polícia acusar uma pessoa.
Há denúncias de torturas contra os membros da religião por forças de segurança russa, segundo denunciou reportagem da ABC News.
Não se sabe ao certo o motivo dessa perseguição contra o grupo. Mas, vale lembrar que a vida religiosa na Rússia é dominada pela Igreja Ortodoxa, comandada por Cirilo 1º, também conhecido como "o papa de Putin".
O Ministério da Justiça russo já chegou a afirmar que o movimento distribuía panfletos que incitavam o ódio a outros grupos. Um desses panfletos citava o escritor russo Leon Tolstói descrevendo a Igreja Ortodoxa russa como superstição e feitiçaria.
Especialistas acreditam que a perseguição poderia ser por conta do seu tamanho do grupo religioso, conhecido por buscar ativamente novos convertidos e possuir forte vínculo com os Estados Unidos.
Alexander Verkhovsky, diretor do Centro Sova de Análises, que estuda o extremismo na Rússia, disse à ABC News que a recusa de interagir com os governos também pode ser uma explicação. A religião proíbe que seus adeptos ingressem nas forças armadas ou ocupem qualquer cargo no governo.
As testemunhas de Jeová se dizem politicamente neutras e não participam assiduamente da vida política. Ou seja,
- não fazem lobby
- não votam em candidatos políticos
- não concorrem a cargos políticos
- rejeitam o serviço militar
- não cantam hinos nacionais ou saúdam a bandeira de qualquer nação, porque veem isso como um ato de adoração
A primeira condenação do tipo aconteceu em 2019, quando o dinamarquês Dennis Christensen foi preso após um julgamento que durou dez meses em Oriol, uma pequena cidade que fica 400 km ao sul de Moscou. Ele é casado com uma russa e mora há muitos anos no país.
Em outro caso, de fevereiro de 2019, policiais armados e agentes de inteligência invadiram a casa do advogado Timofey Zhukov em Surgut, uma cidade petrolífera no oeste da Sibéria, derrubando-o no chão e revistando seus pertences. Ele contou à Reuters que um grupo de ao menos 20 testemunhas de Jeová foi interrogado e acusado naquele dia.
As autoridades russas não responderam às perguntas da Reuters sobre o assunto, na época, enquanto Zhukov disse que a organização foi encerrada depois que a proibição entrou em vigor, "mas continuamos acreditando, independentemente de haver uma entidade legal".
Seu nome entrou para o registro de "terroristas e extremistas", pode viajar para fora da cidade sem permissão e chegou a ser internado à força em um hospital em Ecaterimburgo, a 1.000 km de distância, para se submeter a um exame psiquiátrico.
Quem são as testemunhas de Jeová
As Testemunhas de Jeová surgiram no final do século 19, por volta de 1870, na Pensilvânia, nos EUA, e têm sede mundial em Warwick (próximo à Nova York). O movimento religioso cristão prega a não-violência e propaga a palavra de Deus de casa em casa.
Fazem parte de uma organização religiosa internacional que compartilha preceitos de outras correntes do cristianismo, mas baseia suas crenças numa interpretação própria da Bíblia e se considera a única que pode restituir o "cristianismo original".
Com frequência, são acusadas de desvios sectários por causa de seus rigorosos preceitos.
Para eles, Deus, cujo nome é Jeová, é o único Deus verdadeiro. Jesus Cristo é seu primogênito designado para julgar cada ser humano e decidir seu destino. Já o Espírito Santo é o nome da força ativa de Deus no mundo e não faz parte de uma Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo).
O grupo acredita que a Bíblia é a principal maneira pela qual Deus comunica sua vontade aos seres humanos e a interpreta literalmente, exceto passagens simbólicas ou poéticas. Qualquer ideia ou ensino religioso que não concorde com a Bíblia é considerado errado.
Seus seguidores reconhecem o sacrifício de Jesus, que "veio à Terra para servir de exemplo aos homens, e depois de morto passou a governar o reino de Jeová (Deus) nos céus", mas não o adoram.
As 'testemunhas' entendem que Jesus não morreu em uma cruz, mas em uma única estaca —crença baseada em palavras gregas usadas na Bíblia para a cruz, nas quais a tradução literal é "estaca" e "árvore".
Embora tenha sido aceita pelo movimento até 1931, as testemunhas "modernas" consideram a cruz como um símbolo pagão.
Para esta religião, quando uma pessoa morre sua existência acaba completamente, uma vez que, segundo a Bíblia, não temos uma alma imortal que sobrevive quando o corpo morre. Dessa forma, também não creem no inferno.
Também se opõem a algumas práticas médicas por acreditarem violar as escrituras, como, por exemplo, as transfusões de sangue, por causa da advertência bíblica contra o consumo de sangue.
Perseguição política
As organizações de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch e Anistia Internacional denunciaram uma campanha de "perseguição religiosa" contra este movimento na Rússia.
Quando Christensen foi condenado, a Anistia Internacional declarou que a sentença era a "encarnação da injustiça do sistema judicial russo". "É uma pena severa para um homem que não cometeu nenhum crime segundo as convenções internacionais", declarou à AFP Alexander Artemev, diretor da ONG.
A Rússia, observa a Human Rights Watch, é obrigada a proteger os direitos de liberdade religiosa e de associação por ser país membro do Conselho da Europa e signatário da Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
A organização russa de defesa dos direitos humanos Memorial considera 19 membros das Testemunhas de Jeová como "presos políticos".
(Com agências internacionais)
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