Reino Unido: pelo menos 50 membros do governo renunciam; entenda a crise
O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, enfrenta mais uma crise pública: uma debandada de ministros e funcionários insatisfeitos com a postura do governo a respeito de denúncias de assédio envolvendo um parlamentar de grande importância para os Conservadores.
A postura do governo sobre o caso resultou na perda de confiança em Johnson. O movimento, que começou ontem com a saída quase conjunta dos ministros da Saúde e das Finanças, Sajid Javid e Rishi Sunak, se estendeu a cargos menores, como no caso de secretários particulares parlamentares, que auxiliam ministros de Estado em suas funções.
O secretário de Estado para a Infância e a Família, Will Quince, também anunciou a demissão e afirmou que "não tinha outra opção" depois de ter apresentado à imprensa informações proporcionadas pelo gabinete de Johnson "que se revelaram inexatas".
No total, são pelo menos 50 funcionários do governo até o momento que deixaram suas posições e um deles foi demitido, segundo o jornal britânico The Guardian.
Segundo um repórter da BBC, um grupo de ministros está prestes a pedir a Johnson que renuncie. Entre eles, está o chefe de gabinete que está encarregado de organizar o partido.
O procurador Alex Chalk, o segundo consultor jurídico mais importante do governo, disse que o efeito cumulativo de uma série de escândalos fez com que a população não acreditasse mais que o governo poderia manter os padrões esperados de franqueza. "Lamento que eu compartilhe esse julgamento", afirmou.
Perante o Parlamento, Boris Johnson disse ontem que não pretende renunciar ao cargo. "É exatamente o momento em que se espera que um governo continue com seu trabalho, não que renuncie", afirmou ao citar momentos difíceis na economia e a guerra na Ucrânia.
Em tese, o Partido Conservador não poderia mover novamente um voto de desconfiança em Johnson — uma medida prevista no parlamentarismo britânico para avaliar se o primeiro-ministro deve continuar no cargo após algum fato relevante que ponha em xeque a integridade do governo.
Johnson sobreviveu ao processo no mês passado em decorrência do processo do "partygate", que avaliou festas em Downing Street, sede do poder britânico, durante o lockdown nacional pela Covid-19. Por isso, Boris Johnson estaria imune a um novo voto de desconfiança por mais um ano, mas isso não isenta o premiê de sofrer pressões de todos os lados para renunciar.
Derrotas eleitorais recentes, como a de 23 de junho em duas legislativas parciais, estão convencendo um número crescente de rebeldes dentro do Partido Conservador de que Johnson não pode mais liderar o partido nas eleições gerais previstas para 2024.
A linha do tempo da crise
Boris Johnson escolheu o parlamentar conservador Chris Pincher em 2019 como "deputy chief whip", vice do posto que, no sistema político britânico, tem como atribuição garantir que parlamentares do partido no poder votem conforme a orientação das lideranças.
Pincher deixou o cargo no último dia 30 de junho, após relatos de que apalpou dois homens em um clube em 2019. Ao anunciar sua saída do posto, afirmou que havia "bebido muito" e "constrangido a mim e outras pessoas".
Ele já havia enfrentado outras acusações de abuso sexual, vindas de integrantes de seu partido.
Após o anúncio da demissão, o governo e uma série de ministros inicialmente negaram que Johnson estivesse ciente de acusações específicas contra o colega de partido antes de nomeá-lo para a posição.
Mas o ex-diplomata Lord McDonald acusou o governo de faltar com a verdade e afirmou que o primeiro-ministro foi comunicado "pessoalmente" sobre uma "queixa formal" a respeito do comportamento de Pincher em 2019. Na época, McDonald ocupava um cargo no Ministério das Relações Exteriores.
O governo agora diz que o primeiro-ministro foi de fato informado em 2019, mas não conseguiu "lembrar disso" quando novas denúncias surgiram na semana passada. Johnson confirmou a informação de seu gabinete e declarou que "lamenta amargamente" não ter agido com base no que sabia.
Em uma entrevista à BBC, o primeiro-ministro disse: "Houve uma queixa mencionada especificamente para mim... foi há muito tempo e foi dito para mim em uma conversa... mas isso não é desculpa, eu deveria ter feito algo sobre isso".
Johnson negou ter mentido para sua equipe sobre o briefing e acrescentou: "Estou farto de pessoas dizendo coisas em meu nome ou tentando falar sobre o que eu sabia ou não sabia".
*Com informações da AFP, Reuters e BBC
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