Governo Milei fala em cerca na fronteira: isso é permitido? Qual o impacto?

A Argentina construirá um alambrado de 200 metros de arame na fronteira com a Bolívia e aumentará o controle nas fronteiras com o Brasil e com os demais países limítrofes.

A ministra de Segurança da Argentina, Patricia Bullrich, não descarta a possibilidade de novas cercas —ela deu o exemplo da fronteira entre Bernardo de Irigoyen, na província argentina de Missiones, e as cidades de Dionísio Cerqueira (SC) e Barracão (PR), do lado brasileiro

Mas, afinal, é permitido construir barreiras? Especialistas explicam as regras e alertam para impactos diplomáticos.

Quais as regras?

Especialistas apontam que uma eventual construção de barreira na fronteira da Argentina com o Brasil fere princípios do Mercosul. O bloco regional tem como base a integração e a livre circulação de pessoas. "Se a Argentina decidir construir um muro ou cerca, isso poderá gerar conflitos com os princípios da integração do Mercosul", afirma a advogada Talita Dal Lago Fermanian, especialista em relações internacionais.

Barreiras físicas unilaterais também violam princípios do direito público internacional, na opinião do advogado Nasser Judeh, especialista em direito migratório. "A construção de muros ou outras formas de barreira física entre países, quando decidida unilateralmente, além de ser contrária à convivência pacífica entre os povos, pode criar uma situação de criminalização da imigração."

Há risco de impacto diplomático caso o governo de Javier Milei siga com seu plano. O alerta é do professor de relações internacionais da Universidade Cruzeiro do Sul e pesquisador do Observatório de Regionalismo, André Araujo. Segundo ele, a Argentina sempre teve uma história de migração e um muro representaria uma ruptura simbólica. Para Flávia Carolina de Resende Fagundes, professora de relações internacionais do Centro Universitário da Serra Gaúcha e vice-presidente do Instituto Sul-Americano de Política e Estratégia, a medida unilateral da Argentina já causa instabilidade diplomática. "Buenos Aires já tem tensionado o Mercosul com sua aproximação unilateral com os EUA, e essa decisão pode agravar ainda mais as relações."

A instalação de uma barreira física tem um simbolismo que contrasta com a proposta integracionista.
André Araujo, pesquisador do Observatório de Regionalismo

A soberania da Argentina não é ilimitada no caso da construção de uma barreira entre países. Fermanian explica que tratados regionais impõem limites. "A Argentina tem soberania sobre seu território, mas há tratados internacionais e regionais que limitam certas decisões, especialmente no âmbito do Mercosul", explica.

Continua após a publicidade

Uma eventual construção de barreira pode ser levada a tribunais internacionais. A Corte Internacional de Justiça e a OEA (Organização dos Estados Americanos) poderiam ser acionadas. "Mas o ideal seria mesmo resolver isso por meio do diálogo antes de levar para tribunais internacionais", diz Fermanian.

Segurança e eficácia

Especialistas questionam a eficácia de barreiras físicas para conter crimes transnacionais. Fermanian afirma que muros não impedem tráfico de drogas e contrabando. "Se fosse tão simples, os Estados Unidos já teriam resolvido sua crise migratória", diz. O crime organizado encontra novas rotas, lembra Fagundes. Para ela, a solução está em ações conjuntas entre países. "Soluções como inteligência compartilhada e monitoramento eletrônico são muito mais eficazes do que um muro físico."

Barreiras geram disputas

Casos internacionais mostram que muros geram disputas, mas continuam existindo. A barreira de Israel, por exemplo, foi condenada pela Corte Internacional de Justiça, mas mantida pelo governo. "O governo argentino pode estar buscando uma solução imediata para questões que demandam estratégias mais abrangentes", avalia Fermanian.

Imigrante corre, depois de entrar nos Estados Unidos por meio de um buraco em uma parte do muro da fronteira EUA-México
Imigrante corre, depois de entrar nos Estados Unidos por meio de um buraco em uma parte do muro da fronteira EUA-México Imagem: REUTERS/Jose Luis Gonzalez
Continua após a publicidade

Historicamente, muros são usados para diferentes propósitos. O muro de Berlim, a barreira entre EUA e México e o muro entre Israel e Palestina são exemplos. "No caso argentino, essa proposta parece mais um gesto político do que uma resposta a uma ameaça concreta", analisa Fermanian.

As fronteiras são fechadas por diferentes tipos de barreiras: algumas utilizam tecnologia avançada, como radares e drones, enquanto outras combinam muros físicos e vigilância eletrônica, como nas fronteiras Israel/Palestina e EUA/México. Há também casos com barreiras simples, como cercas de arame farpado e grande efetivo militar, como na Índia e na fronteira Quênia/Etiópia. Na Europa, além de muros e cercas, fossos são usados para impedir a passagem, mas são alvo de críticas por causarem mortes entre imigrantes.
Flávia Carolina de Resende Fagundes, professora de relações internacionais

19 comentários

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.


Vanessa Rodrigues dos Santos

Quem que ser imigrante ilegal na Argentina!? kkkkk OH! Mania de grandeza desse Milei...não queremos imigrantes sendo miserável no meu país, esta condição é só para os argentinos. 

Denunciar

Newton Rafael Zuppo

Será que existe algum brasileiro maluco que queira migrar ilegalmente para a Argentina?

Denunciar

Milton Inacio

Que os argentinos construam sua barreira e que nós brasileiros construamis a nossa. 

Denunciar