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Autores de estudo citado na ONU desmentem Temer sobre queda no desmatamento da Amazônia

19.set.2017 - Presidente Michel Temer discursa na abertura do Debate Geral da 72ª Sessão da Assembleia Geral da ONU  - Beto Barata/Presidência da República
19.set.2017 - Presidente Michel Temer discursa na abertura do Debate Geral da 72ª Sessão da Assembleia Geral da ONU Imagem: Beto Barata/Presidência da República

Ricardo Senra

Enviado da BBC Brasil a Nova York

19/09/2017 17h47

"Trago a boa notícia de que os primeiros dados disponíveis para o último ano já indicam diminuição de mais de 20% do desmatamento naquela região. Retomamos o bom caminho e nesse caminho persistiremos", afirmou o presidente Michel Temer, em seu discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, nesta terça-feira (19).

O problema é o que autores dos dados usados pelo presidente negam a informação.

O governo cita levantamento do instituto de pesquisa Imazon, que realiza levantamentos mensais sobre tendências de crescimento ou queda do desmatamento na Amazônia.

À BBC Brasil, um dos pesquisadores do instituto disse que a informação apresentada a líderes mundiais por Temer é "imprecisa" e "inadequada", e que políticas recentes do governo federal na realidade tenderiam a aumentar a destruição na Amazônia.

"Os dados que o Imazon mede mensalmente podem indicar uma tendência. Portanto, é possível que o desmatamento caia. Mas não podemos dizer 20% porque não temos a precisão que essa afirmação exige", diz o engenheiro florestal Paulo Barreto, pesquisador associado do Imazon.

"Estes não são dados oficiais. Os dados do governo ainda não foram divulgados e parece que o presidente está comparando dados oficiais do ano passado com os nossos, de agora, sendo que as metodologias são totalmente diferentes", afirmou.

Além disso, Barreto aponta que uma eventual redução não seria fruto de políticas públicas para a preservação do meio ambiente, como sugeriu o presidente.

"O governo mandou projetos de lei para o Congresso para reduzir áreas de conservação. Nossos estudos mostram que as taxas dobram com reduções como esta", afirma o pesquisador.

"Vários fatores contribuem com o desmatamento, desde politicas públicas até a economia e o mercado. Há uma relação histórica entre o preço do gado e as taxas de desmatamento. O aumento de preço aumenta o desmatamento, e vice-versa. E a crise econômica vem gerando uma queda neste preço."

O desmentido também foi apontado por outros pesquisadores do Imazon consultados pela BBC Brasil. Procurada, a Secretaria de Comunicação da Presidência da República confirmou que Temer se baseou em dados do Imazon, mas não comentou as críticas até a publicação desta reportagem.

Estratégia

Em seu discurso de abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, Temer destacou o "desenvolvimento sustentável" do país e ressaltou a "preocupação do governo com o desmatamento".

Ao citar a suposta "diminuição de mais de 20% no desmatamento da Amazônia", Temer afirmou que "nessa questão temos concentrado atenção e recursos".

"Na verdade, o governo está fazendo coisas que vão gerar aumento futuro no desmatamento", comentou o pesquisador do Imazon, usado como fonte por Temer na ONU.

A inclusão destes pontos no discurso na ONU, segundo fontes próximas ao presidente, seria uma estratégia para reverter a má impressão causada pela extinção da Reserva Nacional do Cobre e Derivados (Renca) e pelos cortes no financiamento de países como Dinamarca e Alemanha ao Fundo Amazônia, dedicado a financiar a preservação da floresta.

Em 2016, o desmatamento na região teve um aumento de 58%, o que levou países, personalidades e entidades internacionais a repreenderem publicamente o governo brasileiro.

Durante o pronunciamento a líderes de quase 200 países, Temer também reiterou o apoio brasileiro ao acordo de Paris, que visa reduzir as mudanças climáticas e o aquecimento global.