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Vereadores de Curitiba aprovam fim de uso do amianto; medida vai à sanção do prefeito

Trabalhadores da indústria de Amianto protestam contra a lei que proíbe o uso da substância, em frente à Câmara Municipal de Curitiba (PR) - Henry Milléo/Gazeta do Povo/Futura Press
Trabalhadores da indústria de Amianto protestam contra a lei que proíbe o uso da substância, em frente à Câmara Municipal de Curitiba (PR) Imagem: Henry Milléo/Gazeta do Povo/Futura Press

Rafael Moro Martins

Do UOL, em Curitiba

08/11/2012 07h00

A Câmara Municipal de Curitiba ratificou nesta quarta-feira (7), em segunda votação, projeto de lei apresentado pela vereadora Noemia Rocha (PMDB) que proíbe o uso de produtos contendo amianto na cidade. Graças a uma emenda apresentada na última hora por Sabino Picolo (DEM), haverá um prazo de três anos, a partir da sanção, para que a regra seja efetivamente colocada em prática.

Caso seja sancionada pelo prefeito Luciano Ducci (PSB), que é médico, a lei fará de Curitiba a 26ª cidade brasileira a banir o uso do amianto, também conhecido como asbesto, pelas contas de Fernanda Giannasi, fundadora da Abrea, organização que reúne vítimas de doenças causadas pelos asbestos. "Além deles, os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Mato Grosso também têm leis que vetam o uso do mineral", disse após acompanhar a votação do projeto de lei.

Auditora fiscal da SRT-SP (Superintendência Regional do Trabalho de São Paulo) e gerente do Programa Estadual paulista do Amianto do Ministério da Saúde, Fernanda tornou-se o nome mais conhecido no Brasil na luta pelo fim do uso do produto considerado potencialmente cancerígeno pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

O amianto é uma fibra mineral aplicada, principalmente, na produção de fibrocimento para telhas e caixas d'água (que consomem 97% do asbesto industrializado no país), graças à extrema maleabilidade (que lhe permite ser tecida), à resistência ao calor e à condução elétrica. Ela também está presente em centenas de outros produtos, além de ser um contaminante natural de materiais como talco e pedra-sabão.

Atualmente, uma lei federal permite apenas o uso do crisotila, ou amianto branco, extraído no Brasil de uma única mina localizada em Minaçu (GO) em quantidade suficiente para tornar o país o terceiro maior produtor, o segundo maior exportador e o quarto maior utilizador do mundo.  Apenas na Grande Curitiba, há três fábricas de telhas, caixas d'água e outros produtos de fibrocimento, ou cimento-amianto - uma está na capital, e as outras fábricas ficam em Colombo e São José dos Pinhais.

"O Paraná é o Estado que produz mais de 40% dos artefatos de cimento-amianto do País. A lei aprovada em Curitiba é emblemática neste sentido – mostra que a classe política se conscientizou de que o amianto faz mal e tem de ser banido", comemora Fernanda.

“Qualquer um corre risco”

Em documento publicado em 1998, a OMS afirma que a crisotila aumenta os riscos de asbestose (causada pela aspiração continuada do pó de amianto, que enrijece o tecido pulmonar), câncer de pulmão e mesotelioma, e que não há níveis seguros para a exposição à substância.

Das três doenças, a asbestose e o câncer de pulmão são mais comuns entre trabalhadores que lidam com o amianto. O mesotelioma, um tumor maligno e raro que atinge o mesotélio (membrana que reveste o pulmão), é a mais grave e fatal das três e pode afetar qualquer pessoa que respire fibras de amianto, mesmo que ocasionalmente ou em pouca quantidade.

"O amianto é cancerígeno em qualquer quantidade. Não há mais dúvidas técnicas ou científicas quanto ao risco que ele representa, nem tampouco limite seguro para exposição. Qualquer um de nós, exposto diariamente a telhas quebradas, às vezes abandonadas em quintais ou em caçambas de lixo, está correndo risco", explica o médico Elver Andrade Moronte, do MPT-PR (Ministério Público do Trabalho do Paraná), que há anos se dedica a analisar os danos causados à saúde pelos asbestos.

"O mesotelioma não é dose-dependente, ou seja, qualquer que seja a quantidade de fibra inalada pode causar a doença. É um câncer gravíssimo e fatal. A média de sobrevida dos pacientes, após o diagnóstico, é de seis meses a um ano", afirma Moronte. Apesar disso, a doença tem um período de latência muito longo, que varia de 30 a 50 anos, na maioria dos casos. 

"Todo material que contém amianto e foi danificado, como uma telha ou caixa d'água quebrada, pode liberar fibras, sob o efeito de vento, chuva. Na Itália, há inúmeros relatos de casos de mesotelioma em cabeleireiros que cuidavam dos cabelos de trabalhadores de minas, ou nas esposas, que lavavam as roupas deles", completa Fernanda.

Como o diagnóstico ocorre muitos anos depois da exposição, Moronte explica que o paciente tem dificuldade de relacionar o amianto com a causa da doença. A Fiocruz projeta até 2030 “um boom no número de casos de mesotelioma, a doença mais grave causada pelo amianto”, lembra o médico.

“É uma bomba-relógio prestes a estourar. A produção de amianto, por aqui, estourou nos anos 1970, e o mesotelioma demora de 30 a 50 anos para se manifestar. Então só vamos conhecer a real dimensão do problema de 10 a 20 anos. O pior está por vir”, lamenta Fernanda.