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Como um iceberg pode ser a salvação da seca histórica da Cidade do Cabo

Cidade do Cabo

04/07/2018 04h01

"A ideia parece delirante", admite o capitão Nick Sloane, "mas, se olharmos de perto, não é algo tão maluco assim", afirma, ao comentar a proposta de rebocar um iceberg para prover de água a Cidade do Cabo, vítima de uma seca histórica.

Nick Sloane tem experiência em projetos fora do comum. Este sul-africano-zambiano de 56 anos, fundador da empresa Sloane Mearine Ltd, ficou conhecido ao levar à superfície o navio Concordia após seu naufrágio em frente às costas da Itália, onde morreram 32 pessoas, em 2012.

Foi seu maior desafio e êxito até hoje, mas não tão titânico como sua última aposta, que poderia fazer Nick Sloane passar à posteridade se atingir seu objetivo, sem precedentes no mundo.

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No extremo sudoeste da África do Sul, a Cidade do Cabo e seus 4 milhões de habitantes sofrem uma seca terrível.

Neste ano, a cidade escapou por pouco do "dia zero", quando a água para de sair da torneira, embora para isso tenha tido que se submeter a restrições drásticas de uso de água, que ainda estão em vigor.

Para salvar a Cidade do Cabo, Nick Sloane propõe ir buscar icebergs, imensos depósitos de água doce que flutuam a apenas 2.000 km das costas sul-africanas, na Antártida.

"A cada ano, milhares de icebergs se desprendem e vão à deriva para a Cidade do Cabo", explica.

Até hoje, ninguém realizou essa façanha.

"Na Rússia, empurraram icebergs à deriva para instalações petroleiras. Mas pesavam cerca de meio milhão de toneladas. Aqui falamos de (...) 100 milhões de toneladas", indica Sloane.

Icebergs - Alexandre Meneghini/Reuters - Alexandre Meneghini/Reuters
A proposta é usar icebergs de 850 a 1.000 metros de comprimento, cerca de 500 metros de largura e 220 de profundidade
Imagem: Alexandre Meneghini/Reuters

Cobertura gigante  

Os icebergs em questão têm entre 850 e 1.000 metros de comprimento, cerca de 500 metros de largura e 220 de profundidade. O iceberg ideal será identificado do céu com a ajuda de drones e imagens de satélite. Essa é a etapa mais simples da operação.

O gelo gigante coletado será embalado em tecido isolante e um reboque potente o guiará lentamente até a ponta sul do continente africano.

No entanto, a ideia de levá-lo até a Cidade do Cabo nem é considerada. A corrente lá é quente demais. Será rebocado a 150 km mais ao norte, na baía de Santa Helena.

O lugar ideal, segundo Sloane, seria onde a corrente fria de Benguela mantém a água a um dezena de graus, enquanto um antigo leito do rio submarino servirá de zona de armazenamento do iceberg.

O trabalho de coleta de água poderá então começar. A água procedente do gelo derretido será armazenada em um imenso recipiente construído para isso, e máquina empilhará o gelo.

A coleta durará um ano. A cada dia, serão recuperados cerca de 150 milhões de litros de água, que serão transportados em embarcações-cisterna até a Cidade do Cabo.

"Não vamos resolver a crise da água na Cidade do Cabo, mas forneceremos entre 20% e 30% das necessidades anuais de água" desta cidade, aponta o capitão Sloane. 

Cidade do Cabo  - João Silva/The New York Times - João Silva/The New York Times
A possibilidade da falta de água provoca pânico na população
Imagem: João Silva/The New York Times

Muito caro

O custo do projeto, obviamente, é descomunal: em torno de US$ 160 milhões de dólares por iceberg.

O vice-prefeito, Ian Neilson, que Sloane procurou em busca de financiamento, se mostra cético. "Parece que o recurso do lençol freático e dos projetos de dessalinização são mais baratos ou de um preço similar."

África do Sul - João Silva/The New York Times - João Silva/The New York Times
A capital da África do Sul escapou por pouco do "dia zero", quando a água para de sair da torneira
Imagem: João Silva/The New York Times
"Também nos perguntamos se é factível injetar água do iceberg à nossa rede de canalização", afirma à AFP. "Sem contar os riscos inerentes ao projeto, como o volume desconhecido de água que o iceberg poderá produzir realmente".

"Não é fácil pedir fundos públicos para uma primeira vez", reconhece Olav Orheim, especialista norueguês em icebergs, que estudou uma operação parecida há cerca de 40 anos, a pedido da Arábia Saudita.

"É um projeto louco, não há dúvidas disso", reconhece, enumerando as "incógnitas".

Nunca se arrastou uma massa tão pesada. O iceberg vai quebrar durante o transporte? Como se lidará com as correntes durante o reboque? Quanto gelo vai derreter?

Apesar de tudo, "o projeto não é tão irreal tendo em conta que o conhecimento evoluiu muito em 40 anos. É um projeto de alto risco, mas com uma bendita recompensa", afirma o especialista.