Lama invade rio em Mato Grosso do Sul e coloca em risco o turismo da região
Desde a última sexta-feira (16), os moradores da cidade de Jardim, região oeste de Mato Grosso do Sul, convivem com um forasteiro inconveniente. O rio da Prata, que cruza a cidade e é conhecido pelas águas cristalinas, tem tonalidades turvas, amarronzadas por uma lama que não se sabe bem de onde veio. A Polícia Militar Ambiental do estado afirmou que a lama partiu de uma fazenda de cultivo de soja da região, que escorreu para o rio por conta de uma chuva torrencial na última semana, mas não deu mais informações.
O rio não corta somente a pequena cidade de pouco mais de 24 mil habitantes. As águas do Prata são um afluente do rio Miranda, que percorre quase 500 quilômetros para desembocar em Corumbá, na fronteira com o Paraguai. Também atravessa Bonito, cidade sul-mato-grossense que alavanca o turismo do estado, justamente pelas águas transparentes do rio. Até outubro deste ano, mais de 160 mil pessoas haviam visitado a cidade, segundo boletim divulgado pelo governo de Mato Grosso do Sul.
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Quando viu o tom marrom-escuro da água do rio, Diego Scherer se assustou. “Tinha visto o rio assim só uma vez, no começo deste ano”, disse ao UOL. Scherer, que se dedica há sete anos ao Seu Assis Camping e Balneário, criado por seu bisavô, trabalha diariamente na beira do rio da Prata. “Meu bisavô construiu, mas foi minha avó quem transformou em um lugar turístico”, conta à reportagem.
Scherer afirmou que, por mais que as chuvas sejam constantes em determinados períodos do ano, as águas do rio nunca adquirem tal turbidez. A lama, além de denunciar que a biodiversidade e a qualidade de vida do rio podem estar comprometidas, afetou os rendimentos do camping. “Quando as pessoas viram que a água estava suja, começaram a ir embora. Mais ou menos umas 150 pessoas saíram daqui, e estávamos com tudo reservado para o feriado”, diz Scherer.
O camping do Seu Assis é uma referência no turismo de Mato Grosso do Sul. A propriedade está lá há mais de cinco décadas, adquirida por Francisco de Assis Scherer em 1965 e foi citada pelo Ministério do Turismo, no ano passado, como modelo de ecoturismo. “Na cidade de Jardim, tranquilidade, silêncio e um mergulho no rio são opções de quem escolhe esse acampamento. Durante o dia, o visitante pode participar de jogos na quadra de vôlei de areia ou se aventurar na tirolesa das águas banhadas pelo rio da Prata”, diz o texto.
De onde veio, para onde foi
Dois dias depois da mudança de cor do rio, a Polícia Militar Ambiental de Mato Grosso do Sul vasculhou a região com drones e descobriu que a chuva havia feito transbordar uma represa de uma fazenda. O governo do estado então criou um comitê envolvendo vários órgãos da Secretaria de Meio Ambiente, como a Agraer (Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural), Fundação de Turismo e Imasul, e também a Agesul (Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos), além das prefeituras de Bonito e Jardim.
Em nota, a Secretaria do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul informou que notificou duas fazendas, nesta quinta (22), suspeitas de serem responsáveis pela lama do rio. As duas propriedades passaram por mudanças recentes no solo para o plantio de soja, porém os proprietários não construíram curvas de nível, o que pode ter refletido nos sedimentos que desaguaram no rio.
O texto ainda informa que uma equipe da secretaria sobrevoou a região na quarta e gravou imagens que serão utilizadas para estabelecer diretrizes para que “fato semelhante não se repita”. Segundo a secretaria, as duas fazendas terão de executar as obras “imediatamente”. “Não vamos fazer, vamos orientar, a obrigação de construir as barreiras de contenção é do proprietário”, afirmou o secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar, Jaime Verruck.
Scherer contou à reportagem que ainda não obteve nenhum retorno das autoridades em relação às condições do rio. “Tomo conhecimento de tudo pelas reportagens, ninguém ainda veio falar comigo. Até fui na Polícia Militar Ambiental para ver o que poderia ser feito, mas eles me informaram que a polícia de Bonito que está cuidando desse assunto”, disse ele.
A grande preocupação de Scherer e de quem usufrui do rio da Prata é o impacto das plantações de soja da região no ecossistema. Os plantios costumam seguir um modo de operação de desmatamento da mata ciliar, a vegetação situada próxima a cursos d’água. “Essas plantações são bem comuns por aqui. Não sou biólogo, mas sei que existem reflexos no rio”, diz Scherer. O responsável pelo camping, por outro lado, afirmou que não avistou peixes ou animais mortos, o que seria um sinal de problemas graves no rio.
O problema das plantações chegou a influenciar até deputados estaduais de Mato Grosso do Sul. Um projeto de lei do deputado Paulo Corrêa (PSDB), que visa controlar de forma mais rígida a construção de empreendimentos próximos aos rios e nascentes, chegou a ser aprovado na Assembleia Legislativa em julho, mas ainda não foi regulamentado.
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