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Juristas pedem o afastamento imediato do juiz responsável pelo caso Samarco

O juiz Mário de Paula Franco Júnior, responsável pelo caso do desastre de Mariana (MG) - Reprodução de vídeo
O juiz Mário de Paula Franco Júnior, responsável pelo caso do desastre de Mariana (MG) Imagem: Reprodução de vídeo

Maurício Angelo

Do Observatório da Mineração

28/04/2021 14h50

Mais de cem juristas, pesquisadores e políticos assinam uma carta aberta em que pedem o afastamento imediato do juiz substituto Mário de Paula Franco Júnior do caso Samarco.

A carta cita as revelações feitas pelo Observatório da Mineração e pelo UOL em março de 2021 que motivaram o pedido de suspeição do juiz formalizado por cinco instituições - Ministério Público Federal, Ministério Público de Minas Gerais, Defensoria Pública da União, de Minas e do Espírito Santo - no fim do último mês.

"A gravidade dos fatos revelados à sociedade brasileira sobre a condução processual neste caso impõe que as condutas sejam apuradas com seriedade, sendo de imediato nomeado um juiz ou uma juíza substituto/a ao caso, tendo em vista o premente perigo de danos irreparáveis a essas já cansadas vítimas", afirma a carta, que também foi assinada por mais de 20 instituições, incluindo movimentos sociais, ONG's, centros de pesquisa e organizações jurídicas.

Os vídeos das reuniões publicados pelo Observatório, dizem os juristas, mostram o juiz de primeira instância "orientando advogados, advogadas e segmentos das comunidades atingidas em como atuar no caso, a fim de que adotassem o modelo indenizatório sugerido pelas empresas. Tal procedimento destoa dos previstos nos acordos judiciais que levaram anos de mesa de negociação, bem como viola nitidamente o art. 145 do Código de Processo Civil".

Assinam a carta, entre outros, Carlos Frederico Marés de Souza Filho, respeitado jurista e ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Fernando Haddad, ex-ministro da Educação e professor da USP, Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça, Jacques Alfonsin, procurador do RS aposentado reconhecido pela defesa de direitos humanos, Gilberto Bercovici, professor da Faculdade de Direito da USP, dezenas de advogados populares e dezenas de pesquisadores de universidades federais de norte a sul do Brasil.

"Desde o início do processo, em 2015, a gravidade da ausência de imparcialidade pelo juiz do caso vem sendo progressivamente constatada", afirma a carta, que prossegue dizendo que "cabe lembrar que no Sistema de Justiça não deve haver heróis e justiceiros, mas sim funcionários públicos submetidos ao ordenamento jurídico brasileiro, e não acima dele".

O pedido de afastamento do juiz feito pelas cinco instituições mencionadas precisa ser, inicialmente, respondido pelo próprio juiz federal, que deve reconhecer ou não a sua suspeição no caso.

E Mário de Paula Franco Júnior, em sua defesa assinada em 25 de abril, não reconheceu a sua parcialidade e remeteu os autos para o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que ficarão princípio nas mãos da desembargadora Daniele Maranhão, que já decidiu a favor de Mário de Paula em outras ocasiões.

Em sua defesa, de 333 páginas, Mário de Paula ataca diretamente os Ministérios Públicos e Defensorias autores do pedido de suspeição, ataca diversas vezes a imprensa, incluindo as matérias divulgadas e ataca os próprios atingidos que não concordam com o novo sistema indenizatório proposto pelo juiz e pelas mineradoras Vale e BHP.

Mário de Paula, que se negou por três vezes a conceder entrevista para esclarecer o conteúdo dos vídeos e responder a perguntas necessárias sobre a sua atuação no caso, em sua defesa, invocou, entre outros, apoio dos próprios advogados que ingressaram no novo sistema após reuniões orientadas por ele. Nas ocasiões em que foi procurado, o juiz se limitou a dizer, via assessoria do TRF1, que "em razão de impedimentos legais, a Justiça Federal não comenta processos em andamento".

Como o juiz Mário de Paula determinou que os advogados devem receber 10% de cada ação no novo sistema, estes mesmos advogados que saíram em sua defesa já embolsaram cerca de R$ 100 milhões de reais em honorários do R$ 1 bilhão que a Fundação Renova pagou até o momento.

"O sistema de justiça brasileiro precisa ter a confiança de seus cidadãos e suas cidadãs como elemento fundamental da democracia. Não podemos seguir admitindo irregularidades graves, que violam garantias constitucionais, em nome de uma resolução momentânea", diz a carta.

No texto em que pedem o imediato afastamento do juiz Mário de Paula, os mais de cem juristas e 20 instituições afirmam que, mais de 5 anos depois do rompimento da barragem de Mariana, em novembro de 2015, propriedade de Vale e BHP, a reparação não progrediu, nenhum reassentamento foi construído e os envolvidos não foram responsabilizados criminalmente.

Diante dos fatos, afirmam os signatários, "nós, juristas brasileiros(as) e organizações subscritas abaixo, exigimos que a denúncia de parcialidade seja plenamente investigada e seja garantido o devido processo legal na ação de reparação das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão".

Leia na íntegra a carta em PDF.