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"Líbios estão redescobrindo o que significa ser um povo", diz escritor

  • AFP

    "Revolução não é sobre a remoção de Gaddafi, o que está acontecendo é que os líbios estão redescobrindo o que significa ser um povo e uma sociedade", diz o escritor

    "Revolução não é sobre a remoção de Gaddafi, o que está acontecendo é que os líbios estão redescobrindo o que significa ser um povo e uma sociedade", diz o escritor

O pai do autor líbio Hisham Matar está preso há anos pelo regime de Muammar Gaddafi. Matar falou ao “Spiegel Online” sobre o futuro do seu país, o papel da Europa ao apoiar a ditadura de Gaddafi e a necessidade de verdade e reconciliação na Líbia, se o déspota cair. Quando os protestos na Líbia começaram, vocês montaram uma espécie de sala de notícias em seu apartamento em Londres. O que vocês estão fazendo ali? Hisham Matar: é uma rede de amigos, de líbios exilados. Fazemos uma dúzia de ligações por dia para a Líbia. Estamos tentando coletar, corroborar e publicar os relatos das testemunhas. Descobri que os médicos são fontes particularmente boas: estão acostumados a ter certo distanciamento emocional. Como está o humor entre seus amigos? Matar: Nos primeiros dias, houve muita ansiedade sobre o que aconteceria. Quando as coisas começaram a avançar tão rapidamente, surgiram aspirações e esperanças. Agora, a única questão que resta é quanto tempo vai levar até que Gaddafi desista –e quantas outras pessoas terão que morrer. Em que ponto vocês tiveram certeza de que este seria o fim de Gaddafi? Matar: Senti no sábado da semana passada, quando Benghazi ficou totalmente sob o controle dos manifestantes. Foi um ponto de virada, porque é a capital do Leste e tradicionalmente a parte mais politicamente ativa do país. A sua família fugiu da Líbia quando o senhor tinha 15 anos de idade. O senhor então se mudou para o Cairo, e daí foi para a faculdade em Londres. O seu pai, diplomata e empresário, foi sequestrado e preso pelos homens de Gaddafi em 1990. Que papel Gaddafi teve em sua vida? Matar: Ele roubou o meu pai de mim. Ele prendeu meus parentes, ele matou muitos dos meus amigos. Ele é meu inimigo. Contudo, pior do que minhas perdas pessoais, foi ele ter mantido todo o país atrasado e forçado o povo líbio a viver em permanente estado de loucura. Ele representa um tipo de pesadelo para a Líbia do qual estou começando a acordar. Um pesadelo que parecia não ter fim... Matar: Todo mundo ficou surpreso com os eventos, até as pessoas que passaram a vida inteira estudando a Líbia. Mas quando os protestos começaram, foi surpreendente como de fato não eram surpreendentes. Sinto nas vozes dos líbios que conheci toda minha vida. Parecem diferentes, seus pescoços livres das amarras. Gaddafi foi a pessoa sob a qual todos nós sofremos. Estamos todos unidos em nosso sofrimento sob seu regime. O que o senhor pensou quando viu os governos ocidentais em 2003 declarando parceria com Gaddafi e seduzindo-o desde então? Matar: Achei asqueroso. Afinal, não estamos falando de um pobre país africano que precisa urgentemente de dinheiro líbio e faz vista grossa para a ditadura. Estamos falando sobre a Europa e os EUA, os países mais ricos da Terra. Quando começam a fazer vista grossa para essas coisas, isso abala sua fé na humanidade.

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