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Eólicas, carvão e a tragédia no Rio Grande do Sul

Mais de 100 pessoas mortas, quase 130 desaparecidas. Cerca de 1 milhão de afetados em mais de 400 cidades, além de 200 mil desalojados. Falta água potável, falta comida, falta eletricidade, falta sinal de telefonia para pedir socorro ou mesmo para apenas avisar que está vivo.

Os números, infelizmente, devem aumentar. Mas é sobre pessoas a pior tragédia climática do Rio Grande do Sul, com chuvas extremas que deixaram quase todo o estado submerso. Vidas perdidas, vidas arrasadas, histórias dramaticamente marcadas por chuvas extremas, na quinta emergência climática no território gaúcho em menos de um ano.

Não foi falta de aviso nem "culpa da natureza". Por mais que o El Niño, um fenômeno meteorológico natural, tenha contribuído, o que aconteceu — e vem acontecendo com cada vez mais frequência e intensidade — é efeito das mudanças climáticas. Que têm na queima de combustíveis fósseis sua principal causa.

A relação entre petróleo, gás e carvão e a crise climática já foi exaustivamente comprovada pela ciência. Até mesmo as maiores petroleiras privadas globais sabiam disso havia 50 anos, mostrou um relatório do Parlamento dos EUA. Mas, apesar da insistência científica em mostrar o óbvio, a cegueira predomina, chegando ao negacionismo. E em todas as esferas de poder.

Quando tragédias como a do Rio Grande do Sul acontecem, a busca por responsáveis é imediata, algo natural e necessário. Assim, os governos gaúcho e federal foram os primeiros a serem cobrados. Mas Marcio Astrini, secretário-Executivo do Observatório do Clima, colocou o dedo na ferida ao apontar o papel crucial de deputados e senadores nesta crise, ao aprovarem e proporem projetos de lei nocivos ao meio ambiente e ao clima.

A atuação parlamentar anticlimática chega ao cúmulo de incluir benefícios para combustíveis fósseis num projeto de lei para regulamentar eólicas offshore, uma fonte de energia renovável. Parece absurdo. E é.

O Rio Grande do Sul lidera o número de projetos eólicos offshore apresentados ao Ibama à espera da regulamentação. Mas hoje abriga termelétricas a carvão, que tiveram os maiores níveis de emissões entre usinas a combustíveis fósseis em 2022, mostrou o Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema). Assim, contribuíram bastante com a crise climática.

As eólicas offshore são uma chance de substituir a energia suja a carvão no estado. No entanto, dos 31 deputados gaúchos na Câmara, 27 votaram a favor do projeto de lei com os "jabutis" pró-combustíveis fósseis. Houve 3 abstenções ou ausências, e apenas 1 voto contrário, da deputada Fernanda Melchionna (PSOL).

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Há outro projeto (4.653/2023), proposto pelos senadores gaúchos Hamilton Mourão (Republicanos), Luiz Carlos Heinze (Progressista) e Paulo Paim (PT), que pretende fornecer subsídios ao carvão — quase R$ 1 bilhão/ano, segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e a outros combustíveis fósseis até 2040. Argumentam "preocupação" com os trabalhadores da indústria carbonífera do Sul. Mas o Dieese já constatou que fica mais barato — e limpo — requalificar profissionalmente e realocar essas pessoas em outras atividades.

As emergências climáticas — chuvas extremas, ondas de calor cada vez mais quentes, ciclones extratropicais incomuns — são uma realidade. As causas desses eventos extremos são conhecidas. E além dos governos federal e estaduais, os parlamentares têm responsabilidade nessa crise.

De nada adiantam ações de solidariedade e reconstrução se os congressistas continuarem afrouxando leis ambientais ou incentivando combustíveis fósseis. É a vida de seus eleitores que está em risco.

*Alexandre Gaspari é jornalista, mestre e doutor em ciências sociais e especialista em energia do Instituto ClimaInfo.

Opinião

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