MP acusa Bolsonaro de discurso de ódio; defesa alega liberdade de expressão

Felipe Amorim e Gustavo Maia

Do UOL, em Brasília

Em sessão na 1ª Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) que julga o recebimento de denúncia pelo crime de racismo contra o deputado federal e candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL-RJ), o Ministério Público acusou o deputado de realizar um "discurso de ódio", enquanto a defesa dele afirmou que suas manifestações estão protegidas pela liberdade de expressão e pela imunidade do discurso parlamentar.

Nesta terça-feira, o STF vai julgar se recebe a denúncia da Procuradoria e torna Bolsonaro réu pelo crime de racismo, referente a afirmações do deputado sobre quilombolas, índios e estrangeiros durante uma palestra no Rio de Janeiro, em 2017.

A decisão será tomada pela 1ª Turma do STF, composta pelos ministros Marco Aurélio Mello, relator desse processo, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso.

Opinião de Bolsonaro é liberdade de expressão, diz advogado

Na fase de recebimento da denúncia, cabe à Justiça analisar se a acusação traz elementos suficientes para que seja dado prosseguimento à ação. Apenas ao fim do processo é que há julgamento sobre se o investigado é culpado ou inocente das acusações.

Falando pela acusação, o vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, afirmou que a fala de Bolsonaro contém um "discurso de ódio" ao comparar negros a animais.

"Em sua fala estão presentes todos os elementos de um discurso de ódio racial", disse Maia. "As expressões racistas evidenciam que seu autor equipara os membros de comunidades quilombolas a animais de abate", afirmou o procurador.

O advogado de defesa, Antônio Sérgio Pitombo, defendeu a "liberdade de expressão" do deputado e disse que o STF não pode limitar a atuação do discurso parlamentar.

"O que se estar a julgar não é o crime de racismo, é a liberdade de expressão como elemento da democracia", disse. "Ainda que o vocabulário seja horrível, toda a critica do discurso é voltada a políticas públicas", afirmou o advogado.

"Não estaríamos transformando o discurso de ódio em ódio ao discurso", perguntou Pitombo.

O advogado de Bolsonaro embasou a defesa na alegação de que o discurso do deputado foi centrado em críticas às políticas públicas de demarcação de terras quilombolas e indígenas e acusou o Ministério Público de "pinçar frases" sem contextualizá-las na denúncia.

"Lida da forma como foi, parece algo extremamente ofensivo", disse Pitombo.

O advogado pediu que os ministros rejeitem a denúncia por causa do "evidente papel parlamentar" das declarações. Os deputados são protegidos pela imunidade parlamentar, que impede processos por declarações feitas no exercício do mandato.

Mariz Maia, por sua vez, defendeu que o STF ponha "limites" ao "discurso de ódio".

"O discurso de ódio racista é essencialmente desumanizador, intrinsecamente antidemocrático, nega a igualdade e nega o reconhecimento do outro como pessoa merecedora dos mesmos atributos decorrentes da dignidade humana", disse. "Pôr limites ao ódio e ao discurso racial é modo de concretizar o ideal de construção de uma sociedade justa, fraterna, solidária e sem preconceitos", afirmou o procurador.

Os ministros ainda não proferiram seus votos no processo. A sessão foi interrompida para um breve intervalo e será retomada ainda na tarde desta terça-feira.

Wilton Junior/Estadão Conteúdo
No Rio, Bolsonaro se defendeu da acusação no STF usando palavrão

Mais cedo, em ato de campanha no Rio de Janeiro, Bolsonaro mandou um "recado" aos ministros do Supremo, usando um palavrão. "Quero mandar um recado para o STF: respeite o artigo 53 da Constituição que diz que eu, como deputado, sou inviolável por qualquer opinião. E ponto final, p...", declarou.

Entenda o processo

Bolsonaro foi acusado do crime de racismo por sua fala em palestra no Clube Hebraica do Rio de Janeiro, em abril de 2017. Segundo a Procuradoria, o deputado teria usado expressões de cunho discriminatório, incitando o ódio e atingindo diretamente vários grupos sociais.

A denúncia cita frases proferidas por Bolsonaro durante o evento de 2017, como essa sobre os quilombolas: "Isso aqui é só reserva indígena, tá faltando quilombolas, que é outra brincadeira. Eu fui em um quilombola [sic] em Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais. Mais de um bilhão de reais por ano gastado [sic] com eles".

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