Leia a transcrição da entrevista de Randolfe Rodrigues à Folha e ao UOL
O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), integrante da CPI do Cachoeira, participou do "Poder e Política", projeto do UOL e da Folha conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 5.jul.2012 no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
Leia a transcrição da entrevista:
Randolfe Rodrigues – 6/7/2011
Narração de abertura: Randolph Frederich Rodrigues Alves tem 39 anos. Filiado ao PSOL do Amapá, é o senador mais jovem da atual legislatura.
Nascido em Garanhuns, em Pernambuco, Randolfe trocou o “ph” do final de seu nome por um “fe” quando resolveu disputar eleições.
Formado em direito, o senador começou a vida política no movimento estudantil. Liderou o “Fora Collor” em seu Estado no início da década de 90. Agora, 20 anos depois, tornou-se colega de Fernando Collor no Senado.
Duas vezes deputado estadual no Amapá pelo PT, Randolfe Rodrigues entrou para o PSOL em 2005. Elegeu-se senador em 2010. Em 2012, tem se destacado como integrante da CPI do Cachoeira não alinhado ao governo nem à oposição.
Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um "Poder e Política – Entrevista".
Este programa é uma realização do jornal Folha de S.Paulo e do portal UOL. E a gravação é realizada sempre aqui no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
O entrevistado desta semana é o senador Randolfe Rodrigues, do PSOL do Amapá.
Folha/UOL: Olá, senador, muito obrigado por sua presença aqui.
Randolfe Rodrigues: Olá, Fernando.
Folha/UOL: Eu começo fazendo uma pergunta bem amena para o sr.: o sr. disse uma vez que achou até simpático ser apelidado de Harry Potter do Senado. Há alguma característica desse personagem de ficção que agrada ao senhor?
Randolfe Rodrigues: Sabe, Fernando, eu não sabia nada de Harry. Eu aprendi com meu filho. Tive que contratar consultoria de Gabriel, que tem 17 anos, para me contar um pouco do personagem. E aí ele me levou para assistir ao último filme da saga.
Folha/UOL: O senhor se achou parecido?
Randolfe Rodrigues: Pois é, eu não me achei. Mas todo mundo diz que se colocar os óculos redondos fica muito parecido. É o que todo mundo diz, então eu acato.
Folha/UOL: Como é que o senhor avalia, agora falando da CPI do Cachoeira, os trabalhos que foram feitos até agora? Mais para o positivo ou negativo?
Randolfe Rodrigues: Eu diria que a CPI começou na 5ª feira [5.jul.2012], com as deliberações que tomou. É verdade que foi importante é termos avançado dos negócios da organização contraventora no estado de Goiás, no envolvimento do senador Demóstenes [Demóstenes Torres, de Goiás], de agentes políticos daquele estado, inclusive do governador Perillo [Marconi Perillo, do PSDB-GO]. Mas nessa 5ª feira a CPI se nacionalizou. A CPI começou a ter coragem que é necessária para qualquer comissão de investigação.
Folha/UOL: Até este momento, estamos aqui no início de julho, a CPI era uma CPI mais “chapa-branca”?
Randolfe Rodrigues: Eu diria que era uma CPI que sofria daquela síndrome do cidadão que vai para o aeroporto pegar um avião e tem medo de embarcar porque tem medo de andar de avião. A CPI estava padecendo do medo de dar o próximo passo. Ou seja, a CPI sabia para onde ia mas tinha medo de avançar. Na 5ª feira nós avançamos nesse sentido.
Folha/UOL: Então, recapitulando, na 5ª feira, dia 5 de julho, foram aprovadas as convocações de várias personalidades, entre outras: Fernando Cavendish, dono da Delta, Raul Filho, prefeito de Palmas em Tocantins que é do PT, Paulo Vieira de Souza, o chamado Paulo Preto, que foi da Dersa [Desenvolvimento Rodoviário S/A, empresa de economia mista cujo principal acionista é o Governo de São Paulo], teve relações aí com a Delta, o Pagot, que foi do Dnit [Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes].
Randolfe Rodrigues: Eu queria acrescentar a essas os sócios de Cavendish. Essas votações que você citou foram unânimes. [O requerimento para convocar] os sócios de Cavendish não teve unanimidade. E era algo que não estava, digamos, no script do que devia ser aprovado.
Folha/UOL: Agora, nada impede que todos esses convocados compareçam à CPI e permaneçam em silêncio. Se eles assim o fizerem, por que é importante, então, tê-los convocados?
Randolfe Rodrigues: Em relação ao Cavendish, eu espero que o Supremo Tribunal Federal dê ganho de causa ao mandado de segurança interposto pelo deputado Onyx [Lorenzoni, do DEM-RS] que pede que sejam asseguradas as prerrogativas de nós, parlamentares, de perguntarmos, de inquirirmos. A CPI também aprovou isso. Que, se alguém arguiu o direito constitucional de permanecer em silêncio, seria dispensado logo em seguida. O sr. Cavendish tem o direito de ir e permanecer em silêncio, e nós temos a prerrogativa de poder perguntar.
Folha/UOL: Qual é a vantagem de perguntar e não ouvir resposta?
Randolfe Rodrigues: Primeiro é cumprir um papel de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que é inquirir. As pessoas terem conhecimento do que pesa sobre ele. Além disso, o mais importante não foi somente a vinda do sr. Cavendish. Será a vinda do sr. Pagot, que já disse, claramente, que quer falar. E a vinda dos sócios do sr. Cavendish, que também se manifestaram favoravelmente a falar.
Folha/UOL: Mas deixe-me explorar mais um pouco quando o depoente fica em silêncio. O fato de os deputados e os senadores fazerem as perguntas e não obterem respostas representa um ganho em que sentido objetivo?
Randolfe Rodrigues: Representa um ganho porque se torna público qual a linha de investigação que os membros da CPI querem apresentar. Aonde se quer chegar e sobre aquele que ali está utilizando o direito constitucional de permanecer em silêncio está sendo acusado e investigado. E, em especial, Fernando, serve para, concretamente, explicar didaticamente para a opinião pública porque aquele cidadão está ali utilizando do direito de permanecer em silencio. Via de regra, quem utiliza o direito de permanecer em silêncio é porque não quer revelar o que já é notório, óbvio, do que está sendo acusado.
Folha/UOL: Ainda assim, em contrapartida, ao fazer todas as perguntas para um depoente que se mantém em silêncio, a CPI não está, ao mesmo tempo, oferecendo a ele informações valiosas sobre o que se pretende investigar a respeito dele?
Randolfe Rodrigues: Bom, se ele é réu, e isto está na condição de réu, e o sr. Fernando Cavendish tem todas as razões para estar colocado na condição de réu, de investigado dessa Comissão Parlamentar de Inquérito, de uma forma ou de outra ele vai ter acesso, porque também um direito constitucional dele. Então é importante que todos saibam qual é a linha que nós queremos chegar investigando esse sr. e outros.
Folha/UOL: Teve um momento que vários integrantes da CPI, o senhor incluso, cogitavam a hipótese de eventualmente fazer quase que uma CPI Paralela. Se não é esse o termo é algo parecido, tomando depoimentos em separado. Esse tipo de estratégia ainda existe ou, a partir de agora, não é mais necessária?
Randolfe Rodrigues: Digamos que ela está, por enquanto, congelada. Não seria assim propriamente paralela porque cada um de nós, imbuídos do dever de investigar, dever fundamental em um parlamento e uma democracia. Em uma democracia o parlamento tem que representar, legislar e fiscalizar. E fiscaliza através de Comissões Parlamentares de Inquérito. Então esse dever fundamental é dever de todos membros da CPI. Realizar a investigação. Lógico que o status quo anterior é a omissão da investigação. O status quo atual é querer avançar na investigação.
Folha/UOL: Por que houve essa mudança?
Randolfe Rodrigues: Eu diria que tem duas razões especiais. A primeira razão, obviamente, é a proximidade das eleições municipais. Ia ficar difícil para parlamentares, senadores e deputados, irem pedir votos para seus candidatos ou se apresentarem como candidatos. E, aqui em Brasília, no que deveria ser o seu papel e sua atuação, estarem blindando aqueles que eles deveriam investigar. Segundo é, em especial, a pressão da opinião pública. Essa CPI está sob os holofotes e, como diz um escritor norte-americano, não há detergente melhor do que a luz do Sol, do que a pressão da opinião pública para tornar inevitável o que nós aprovamos na última 5ª [feira, 5.jul.2012].
Folha/UOL: O sr. diria que nesta 5ª feira (5.jul.2012) quando foram aprovadas essas convocações todas, a CPI renasceu, deixou de ficar moribunda?
Randolfe Rodrigues: Eu até diria que ela iniciou de fato. Nós tivemos algumas investigações e dados importantes anteriormente. A vinda do governador Perillo [Marconi Perillo, do PSDB-GO], os dados bancários já foram levantados, a coincidência das relações entre a empresa Delta e o seu Carlos Cachoeira foi importante. Mas a CPI estava se omitindo a dar o próximo passo, na 5ª feira, nós demos esse próximo passo.
Folha/UOL: Esse próximo passo implica em ampliar o escopo da investigação, é isso?
Randolfe Rodrigues: Sim. Eu acho que agora, definitivamente, a CPI virou uma Comissão Parlamentar de Inquérito do Brasil. Anteriormente, ela estava circunscrita geograficamente aos negócios presentes no Estado de Goiás.
Folha/UOL: O sr. poderia dar um exemplo objetivo de dados que chegaram à CPI, de sigilos bancários que demonstram essa nacionalização da CPI?
Randolfe Rodrigues: Perfeitamente. Em relação à empresa Delta, por exemplo, os levantamentos bancários e fiscais dos anos de 2009 e 2010 dão conta de mais de R$ 1 bilhão mobilizados pelo governo federal para a empresa Delta.
Folha/UOL: R$ 1 bilhão?
Randolfe Rodrigues: R$ 1 bilhão e R$ 400 milhões, dos dados bancários de 2009 e 2010.
Folha/UOL: Governo federal?
Randolfe Rodrigues: Governo federal. Até aí normal. O que é extraordinário para nós é, por exemplo, a mobilização bancaria do Estado do Rio de Janeiro. A mobilização do Estado do Rio de Janeiro é quase 65% de toda a mobilização bancária da região Sudeste, que totaliza R$ 950 milhões. Então essa mobilização bancaria do Estado do Rio de Janeiro, no meu entender, chama a atenção. E desperta o seguinte interesse: por que tantos negócios com o governo do Rio de Janeiro e com prefeituras do Rio de Janeiro.
Folha/UOL: Deixe-me entender então. Nos anos de 2009 e 2010, na região Sudeste, houve pagamentos de governos dessa região para a empreiteira Delta no valor de R$ 950 milhões?
Randolfe Rodrigues: Em torno de R$ 950 milhões.
Folha/UOL: Em dois anos, 2009 e 2010. E desse total, 60%, é isso?
Randolfe Rodrigues: Cerca de 60% [do dinheiro] está concentrado no Estado do Rio de Janeiro, entre o governo e prefeituras do Rio de Janeiro.
Folha/UOL: Prefeituras ou a Prefeitura da cidade [do Rio de Janeiro]?
Randolfe Rodrigues: A Prefeitura da cidade do Rio e outras prefeituras do interior do Rio de Janeiro. Então tem uma preferência...
Folha/UOL: Esse dado é novo? Onde aparece esse dado, senador?
Randolfe Rodrigues: Esse dado aparece no sigilo bancário que nós recebemos até agora. No sigilo bancário que já nos chegou do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal e do HSBC. Ainda falta o sigilo bancário do Bradesco. Ou seja, esse dado pode aumentar.
Folha/UOL: Entendi. E adicional a esses R$ 950 milhões da região Sudeste, tem aquele valor que é do governo federal, que é outra coisa.
Randolfe Rodrigues: É, é outra coisa. O do governo federal, pelo menos por enquanto, há concentração dos números em torno do Dnit, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes. Mas, enfim, por enquanto [a transferência do governo federal para a Delta] não chama a atenção como deveria chamar, por exemplo, essa mobilização do Rio de Janeiro. Essa mobilização do Rio de Janeiro, veja, 60%... Então mais da metade, por exemplo, da mobilização do governo federal, que é grande, é uma grande quantia, é concentrado em um Estado da Federação. E isso é, realmente, um número que chama a atenção.
Folha/UOL: O sr. enxerga já, só com esses números, algum indício de irregularidade nessa relação Delta com o governo do Estado do Rio, Prefeitura do Rio e outras?
Randolfe Rodrigues: Eu diria que tem algo no mínimo extraordinário aí. Por que uma mobilização maior, por exemplo, do que outros Estados da federação? Qual a razão dessa concentração de negócios no Rio de Janeiro? E tem mais uma coincidência disso: uma das contas que mais paga a empreiteira Delta do Rio de Janeiro é a conta da Caixa Econômica Federal. Dessa conta da Caixa Econômica Federal, quase 50% dessa conta, R$ 480 milhões, de R$ 1,3 bilhão, foram transferidos para uma conta movimento da Delta, que é uma conta no HSBC. Dessa conta do HSBC foram transferidos R$ 50 milhões para duas empresas de Goiás, chamadas Alberto & Pantoja e Brava. Essas duas são empresas laranjas do sr. Carlos Cachoeira. Então tem um modus operandi aí identificado, tem um caminho identificado do dinheiro até chegar em Carlos Cachoeira.
Folha/UOL: Esse dinheiro que irrigou as contas dessas empresas ditas laranjas veio de contas bancárias onde era pagos [valores] pelo governo do Rio de Janeiro, prefeituras do Rio? Ou não?
Randolfe Rodrigues: É o seguinte, na conta da Caixa Econômica, a Delta recebe os recursos do governo e prefeituras do Rio. Aliás, na conta da Caixa Econômica todo o recurso arrecadado é [proveniente de] governo do Rio, Prefeitura do Rio, e duas prefeituras de Goiás, [as de] Catalão e Caldas Novas. Dessa conta da Caixa Econômica é transferido quase 50% para a conta da Delta no HSBC, que é a conta de movimento. A conta da Caixa, veja, é a conta que recebe dos agentes públicos. [A do] HSBC movimenta. Do HSBC vai para as empresas de Cachoeira.
Folha/UOL: Agora, senador, não obstante esses dados, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e outros políticos do Rio de Janeiro, eventualmente, ainda não foram convocados. Eles serão?
Randolfe Rodrigues: Assim como se tornou inevitável, irreversível a convocação do sr. Cavendish e do sr. Pagot. Veja que há uma semana atrás nós perdemos na CPI, nós fomos derrotados. E a CPI, claramente, se constrangeu com aquela derrota. Naquele dia, houve uma vitória em números da maioria da CPI mas houve uma derrota política que ajudou a construir a vitória que hoje celebramos na última 5º feira, dia 5, na CPI. Então, da mesma forma, eu considero inevitável que nós, daqui a pouco, teremos que convocar o governador Sérgio Cabral.
Folha/UOL: Esses dados de 2009 e de 2010 ainda são incompletos e ainda não há dados disponíveis de 2011?
Randolfe Rodrigues: Esses dados são incompletos porque ainda faltam chegar sigilos bancários e fiscais à CPI. Entre eles os de 2011 e, notadamente, o sigilo bancário e fiscal do Bradesco.
Folha/UOL: De 2011 ainda não há nada de sigilo bancário?
Randolfe Rodrigues: De 2011 já temos. Nós ainda não terminamos a contabilização desses dados para concluir esse levantamento que eu já tenho pronto em relação a 2009 e 2010.
Folha/UOL: Qual o método que o sr. utiliza? Cada senador, cada deputado tem um para fazer análise e compilação, a tabulação desses dados.
Randolfe Rodrigues: Eu tenho três assessores trabalhando na CPI. Um está dedicado somente à análise de sigilo bancário e fiscal. Está dedicado somente a isso e diariamente me apresenta um relato do seu trabalho e da sua apuração. Um outro está dedicado somente a ouvir os áudios que estão presentes na CPI. Áudios e vídeos. E um terceiro, um assessor jurídico, está dedicado, a partir da análise que nós fazemos a proceder requerimentos e representações que nós apresentamos à CPI.
Folha/UOL: O sr. mencionou áudios e vídeos. É sabido que ainda muito material não foi analisado pela Polícia Federal, entregue devidamente à justiça e muito menos à CPI. O sr. tem informações sobre o que podem conter esses áudios esses vídeos que ainda não chegaram?
Randolfe Rodrigues: Eu estou ansioso em especial em relação aos vídeos. Até agora o único vídeo que nós temos na CPI é o que já se tornou de conhecimento público, que mostra o envolvimento do prefeito de Palmas. Então nós ainda não temos sequer 10% dos vídeos que foram aprendidos na operação. Nós já aprovamos um requerimento de minha autoria, anteriormente teve um requerimento de autoria do deputado Protógenes [Protógenes Queiroz do PCdoB-SP], solicitando todo o material. Eu, o senador Taques [Pedro Taques do PDT-MT] e o deputado Miro Teixeira [PDT-RJ] pretendemos ter um encontro na 2ª ou 3ª feira da semana que vem com o diretor-geral da Polícia Federal para solicitar a agilidade necessária no encaminhamento desses vídeos.
Folha/UOL: Eu tenho notado que sr. aqui, na nossa conversa, apresenta um certo um otimismo que eu não tinha visto nas semanas passadas. O sr. não está sendo otimista demais, considerando-se o tamanho do Governo e o poder político dos grandes partidos para evitar que toda essa investigação seja feita?
Randolfe Rodrigues: Vou citar Gramsci [Antonio Gramsci, filósofo e socialista italiano] que diz que às vezes é necessário o pessimismo da razão e o otimismo da vontade. Então, esse otimismo aqui é o da vontade, que acredita que nós podemos avançar na CPI. E, lógico, influenciado pela 5º [feira]. Antes de 5ª, realmente, meu pessimismo batia as alturas, os níveis recordes. Depois de 5ª eu comecei a ver luzes no final do túnel.
Folha/UOL: Então o senhor tem um otimismo...
Randolfe Rodrigues: Pessimismo da razão, otimismo da vontade. Como diria Antonio Gramsci.
Folha/UOL: O sr. citou alguns deputados, citou até o deputado Protógenes Queiroz, e até uma discussão dentro da CPI, fora também, sobre a conveniência de alguns de seus integrantes permanecerem ali quando eles próprios também têm sobre si alguma suspeita, enfim, alguma dúvida. Alguns já foram citados. O sr. já citou o Protógnes. Há o deputado Cândido Vacarezza (PT-SP), que trocou mensagens com o governador do Rio [de Janeiro] a respeito da vinda ou não do governador para a CPI. E há outros também. Isso não atrapalha a CPI?
Randolfe Rodrigues: Olha, é verdade, ter na CPI parlamentar próximo da Delta, o parlamentar, por exemplo, que se relacionou, estabeleceu relação com a empresa Delta, esteve com o sr. Cavendish, é algo que prejudica a CPI. Esse dado em especial é algo que prejudica a CPI. É contraditório: O investigador não pode ter relação com o investigado. Agora, lamentavelmente, o princípio de composição da CPI é o princípio da proporcionalidade do parlamento e da indicação dos partidos políticos. Já foi objeto de representação nossa. Em especial parlamentares que se relacionaram com o sr. Cavendish e que mostram relação próxima com sr. Cavendish, no meu entender, em todas as alegações que se referem a Delta e ao sr. Cavendish deveriam, por força da CPI, se absterem de votar. Essa questão de ordem que fizemos não foi acatada pela presidência da CPI.
Folha/UOL: Foram nomeados esses congressistas que o sr. menciona que teriam relação com a Delta? O sr. nomeou na época nessa relação de ordem? Quem são eles?
Randolfe Rodrigues: Sim. Na verdade a denúncia originalmente vem do deputado Miro Teixeira. Com base na denúncia, depois o senador Ciro [Nogueira, PP-PI], do Piauí, havia admitido que tinha tido um encontro com o sr. Cavendish em Paris. Ele e a sua esposa que também compõe, faz parte da CPI. Eles foram objeto de uma questão de ordem minha ao presidente da CPI arguindo a suspensão deles na votação da convocação do sr. Cavendish quando ela voltasse a pauta.
Folha/UOL: Com relação aos demais, o sr. tem algum óbice em relação a Protógenes Queiroz, por exemplo?
Randolfe Rodrigues: Eu acho que deveria sim. Seria bom para a CPI aqueles que por alguma razão tem uma demonstração de proximidade com investigados ou com réus se absterem de votar no que está relacionado pelo menos a esses senhores.
Folha/UOL: O seu assento na CPI deve-se a uma benemerência do PSDB, que cedeu uma cadeira para o PSOL.
Randolfe Rodrigues: Na verdade, do bloco PSDB e DEM.
Folha/UOL: E, durante um certo momento, na CPI, o sr. foi muito crítico e muito duro sobre a investigação necessária em relação ao governador Marconi Perillo, de Goiás, que é um tucano. Em algum momento o sr. sofreu alguma pressão do PSDB por conta dessas suas posições?
Randolfe Rodrigues: Quando eu recebi, generosamente, a designação por parte do PSDB, o PSDB não me impôs nada. O senador Aécio [Neves, PSDB-MG], o senador Álvaro [Dias, PSDB-PR] me perguntaram se eu aceitava a indicação deles para a suplência, eu agradeci o reconhecimento, a generosidade e não recebi nenhum tipo de imposição da parte deles.
Folha/UOL: E depois?
Randolfe Rodrigues: Nem depois. Eu recebi a notícia que teve pressão por parte do governador de Goiás à bancada do PSDB. Mas também recebi a notícia que houve uma posição firme por parte do senador Aécio, do próprio senador Álvaro Dias em aceitar essa pressão. Essa pressão, se ocorreu, não chegou até mim.
Folha/UOL: Ou seja, o sr. não se sentiu ameaçado de perder o seu assento na CPI?
Randolfe Rodrigues: Não. E mesmo porque, assim, se a ameaça tivesse chegado perto era o mesmo peso dela ter chegado ela ir embora. Não me sentiria ameaçado.
Folha/UOL: Nesta CPI há um congressista que está relativamente encrencado, que é o senador Demóstenes Torres, que foi do DEM, de Goiás, agora está sem partido e pode vir a perder o mandato. O sr. enxerga outros congressistas, deputados ou senadores, que eventualmente possam perder o mandato? Quais são eles?
Randolfe Rodrigues: Posso, pelo menos na Câmara Federal tem pelo menos cinco que foram citados e claramente aparecem no contexto das investigações. Deputado Rubens Otoni [PT-GO], deputado Leréia [Carlos Alberto Leréia, PSDB-GO)... Tem mais outros dois deputados que são citados e aparecem nas investigações. Eu só receio, eu só tenho uma preocupação a essa altura: O Senado já avançou na investigação em relação ao senador Demóstenes. Teve a representação do PSOL, teve apreciação pelo Conselho de Ética, apreciação pela CCJ. Daqui a pouco vamos votar em plenário a cassação do mandato. Na Câmara, lamentavelmente, o processo não anda. Não avança o processo envolvendo os deputados.
Folha/UOL: Pela análise dos documentos a disposição da CPI o sr. vê indícios robustos para caçar algum desses deputados ou não tem como dizer?
Randolfe Rodrigues: Olha, eu diria que, em especial em relação ao deputado Rubens Otoni tem uma gravação, um vídeo dele recebendo dinheiro. Isso aí é gravíssimo. Se isso não for quebra de decoro então não há necessidade mais de decoro parlamentar. Em relação ao deputado Leréia, ele mesmo reconhece o nível de relação e aproximação com o sr. Carlos Cachoeira. Mas o problema não é só a relação porque a relação, com quem quer que seja, por mais condenável que seja a relação com o contraventor, se pode ter é que as interceptações telefônicas demonstram concretamente uma relação junto a organização por parte do deputado Leréia. Entao, em relação a esses me parece que há elementos fortes.
Folha/UOL: O sr. disputou a presidência do Senado. No ano que vem, em fevereiro, há outra eleição para presidente do Senado. O sr. pretende disputar novamente?
Randolfe Rodrigues: Olha eu acredito que tem que ser apresentada uma alternativa à disputa à mesa do Senado. Não pode ser um jogo de cartas marcadas, um jogo como se tudo fosse unanimidade e não tivesse nenhuma divergência à postura do Senado. Logicamente, se meu nome for citado, for apresentado, serei candidato. Mas eu acredito que nós temos outros nomes também no Senado com atuação próxima a nossa que possam ser alternativas. Senador Pedro Taques é um. Senador Pedro Simon [PMDB-RS] é outro. Senador Roberto Requião [PMDB-PR] é um outro nome. Senador Jarbas Vasconcelos [PMDB-PE] é um outro nome. Senador Pedro Taques seria um bom nome. E eu acredito que nós poderíamos organizar um grupo independente com uma proposta de mudança dos caminhos e do rumo do Senado.
Folha/UOL: O sr. diria que hoje no grupo mais independente, de oposição, Pedro Taques é o que poderia galvanizar o...
Randolfe Rodrigues: Eu acho que mais até do que meu nome, o nome do senador Pedro Taques é o que galvaniza apoios na oposição, apoios entre os independentes, que nós nos incluímos, e apoios dentro da própria base do governo.
Folha/UOL: Na semana que vem, 4ª feira, dia 11, é possível que o plenário vote o processo de cassação ou não do senador Demóstenes Torres. O sr. já afirmou convicção a respeito e como deve votar?
Randolfe Rodrigues: Meu voto será pela cassação. Eu consolidei essa convicção, e não é confortavelmente que eu consolido. Não é confortável julgar um par. Mas o Senado não é uma confraria de amigos. Não é uma corporação profissional. Não é uma associação. O Senado é uma instituição republicana.
Folha/UOL: Pelo menos não deveria ser, não é?
Randolfe Rodrigues: Pelo menos não deveria ser. Embora, às vezes, esse corporativismo triunfe. Meu voto será pela cassação porque no meu entender é incompatível mentir, é incompatível receber benfeitoria de chefe de organização contraventora por parte de qualquer parlamentar.
Folha/UOL: Nós sabemos que o voto é secreto. Ainda não vai ser possível ter uma votação aberta e, nesse caso, qual é o prognóstico que o sr. faria diante do clima que existe hoje no Senado para essa votação?
Randolfe Rodrigues: Eu diria que hoje a perspectiva é de cassação. Acredito que poderemos ter 20 a 25 votos favoráveis ao senador Demóstenes, contra a cassação.
Folha/UOL: Até 25 votos?
Randolfe Rodrigues: Eu diria. Mas com voto secreto, qualquer perspectiva aqui pode ser infundada. Mas o ambiente que sinto no dia de hoje, quando estou aqui sendo entrevistado por você, Fernando, é que há um ambiente para a cassação.
Folha/UOL: Qual o futuro do seu partido, senador, o PSOL?
Randolfe Rodrigues: Eu quero que o PSOL tenha um futuro coerente com a vocação que ele foi criado. O PSOL não é uma reedição do PT porque, como diz o Lulu Santos, tudo mundo o tempo todo no mundo, nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia. O PT foi criado sobre a égide de uma ascensão dos movimentos sociais e o PSOL não. O PSOL não pode ser um partido do esquerdismo. Não pode ser um partido vocacionado a ser uma vanguarda, crente que é dono ética e de todas as propriedades da esquerda brasileira. O PSOL tem que ser um partido de esquerda. Tem que ser um partido moderno e tem que ser um partido plural, democrático e de massas. O projeto que até outrora fora dos Partidos dos Trabalhadores.
Folha/UOL: Como é que é possível ser de esquerda e moderno com o programa do PSOL hoje? Por exemplo, o PSOL defende uma revolução socialista no país ou acredita apenas na via da democracia representativa?
Randolfe Rodrigues: Esquerda e moderno. Não tem nada mais moderno do que ser de esquerda. Mesmo porque ser de esquerda é a mais bela declaração de amor à humanidade. Uma sociedade em que cada um viva de acordo com a sua necessidade ou que cada um viva de acordo com a sua capacidade. Isso é uma declaração de amor à humanidade possível, no horizonte. Revolução, para o Brasil, nós precisamos de uma revolução democrática. Precisamos de inversão de prioridades. Precisamos incluir ainda milhões. Precisamos resolver, por exemplo, a chaga do analfabetismo. 9% da população brasileira padece do analfabetismo.
Folha/UOL: Mas o PSOL, me refresque a memória, no seu programa, no seu estatuto, mantem a necessidade de fazer uma revolução socialista no país?
Randolfe Rodrigues: Não está dito isso. Não está no programa. Não está no estatuto. O socialismo é um horizonte estratégico que nós vamos alcançar. Eu repito: O que nós precisamos no Brasil é de uma revolução democrática.
Folha/UOL: Mas por meio da democracia representativa?
Randolfe Rodrigues: Da democracia representativa e avançando-a para uma democracia participativa, como diz na Constituição, no parágrafo único do artigo 1º e no artigo 14, sisos 1, 2 e 3.
Folha/UOL: O PSOL acertou ao escolher Plínio de Arruda Sampaio como candidato a presidente da República em 2010?
Randolfe Rodrigues: Foi em quem eu votei a presidente da República. Eu preferiria que nós tivéssemos mais alternativas. Eu preferia, por exemplo, que nós tivéssemos construído uma aliança com a senadora Marina Silva [PV-AC]. Não foi possível. Nós fomos derrotados, nesse aspecto, internamente. Mas, enfim, estivemos na campanha junto como Plínio. E eu acho que o Plínio cumpriu um papel importante naquele momento.
Folha/UOL: Eu ouvi algumas vezes, às vezes no noticiaria vem e vai que o sr. tava um pouco insatisfeito com partido. Já vi um noticiário que o sr. poderia sair do partido. Como está essa situação hoje?
Randolfe Rodrigues: Não, eu acredito no PSOL e eu acredito que nós podemos avançar no PSOL. Eu acredito que o PSOL possa ser uma alternativa dentro desse perfil que eu descrevi para você. Um partido democrático, socialista e de massas. Moderno, como eu disse. Porque não há nada mais moderno do que declarar amor à humanidade.
Folha/UOL: A ex-senadora Heloísa Helena também tem aparecido no noticiário como possivelmente estando de saída do PSOL. O que o sr. sabe a respeito disso?
Randolfe Rodrigues: Faz tempo que não falo com a Heloísa. Eu não quero acreditar nisso. Ela já poderia ter saído e não saiu.
Folha/UOL: Poderia como?
Randolfe Rodrigues: Pelas manifestações públicas que ela já fez anteriormente que indicavam uma saída. Ela poderia, se quisesse sair mesmo, já ter saído. E não saiu. Então eu acredito que ela está convencida que nós podemos agregar muitas forças em torno do PSOL e o PSOL terá uma vocação natural ao crescimento.
Folha/UOL: Quem pode ser candidato a presidente pelo PSOL em 2014?
Randolfe Rodrigues: Esse é um debate que eu quero trata-li assim: Cada dia com sua agonia. Eu acho que nós temos alternativas, mas não podemos precipitar esse debate. E não podemos exigir sequer que esse candidato seja do PSOL. Eu creio que nós temos que encontrar alternativas aos blocos que estão em disputa hoje no Brasil. Há o bloco que governa capitaneado pelo PT e há o projeto de oposição, mais à direita, capitaneado pelo PSDB e Democratas. Nós temos que construir alternativas e temos ter generosidade de dialogar com outras forças políticas para a construção dessas alternativas.
Folha/UOL: No espectro político partidário brasileiro, quais são as siglas que podem eventualmente estarem aliadas ao PSOL nos próximos anos?
Randolfe Rodrigues: Eu acho que nós temos que dialogar com um campo que nós chamamos de democrático popular.
Folha/UOL: Quais são?
Randolfe Rodrigues: Com o PPS. Com o Partido Verde, não com o partido, mas com o movimento liderado pela senadora Marina Silva. Acho que temos que construir diálogos com o PCdoB. Temos uma experiência importante hoje em Belém do Pará: Uma aliança PSOL e PC do B disputa a prefeitura com chances de ganhar aquela prefeitura. Enfim, tem contradições no bloco que governa e nós temos que avançar no âmbito dessas contradições.
Folha/UOL: Mas senador, veja, o PCdoB é um partido que apoia no plano federal há muitos anos já o bloco que hoje comanda o país, comandado pelo PT. O PCdoB é um partido que se envolveu em escândalos recentes, sobretudo no Ministério dos Esportes, um caso muito rumoroso. E está aliado ao PSOL em Belém do Pará. Como explicar isso?
Randolfe Rodrigues: Olha, o PC do B é também um partido que carrega uma história que todos nós devemos reverenciar, né? Devemos reverenciar e reverenciar. Tem um perfil político parecido com o do PSOL. Tem identidade política de esquerda. E tem contradições com o bloco que governa com o PT. E temos identidades em especial na crítica à política econômica. Enfim, eu adoraria avançar nessa perspectiva de deslocar o PCdoB do bloco que governa. Em Belém nós vamos ter uma experiência. Eu espero que ela se repita.
Folha/UOL: O sr. nasceu em Pernambuco. Fez carreira política no Amapá. Deve seguir fazendo carreira política no Amapá?
Randolfe Rodrigues: Ah, sim. Eu costumo dizer: Nasci em Garanhuns e sou amapaense. Saí de Garanhuns com oito anos de idade. O Amapá me acolheu. No Amapá eu tive filhos. O Amapá acolheu os meus pais. No Amapá tem meus amigos e vou terminar meus dias em alguns dos cemitérios. De São José ou no cemitério da Nossa Senhora da Conceição, lá em Macapá. Minha terra é o Amapá e eu sou apaixonado por aquele endereço: Esquina do rio mais belo com a linha do Equador.
Folha/UOL: Senador Randolfe Rodrigues, muito obrigado por sua entrevista à Folha/UOL.
Randolfe Rodrigues: Eu que agradeço. É sempre um prazer estar contigo e ter sido entrevistado por ti.
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