Topo

Leia a transcrição da entrevista de Renato Pereira à Folha e ao UOL

Do UOL, em Brasília

23/09/2013 06h00

Renato Pereira, publicitário, participou do "Poder e Política", programa do UOL e da Folha conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 20.set.2013 no estúdio do Grupo Folha em Brasília.
 



Renato Pereira – 20/9/2013

 

Narração de abertura:

O marqueteiro político Renato Pereira tem 53 anos. É filho de diplomatas e nasceu em Zurique, na Suíça. Mudou-se para o Rio de Janeiro aos 6 anos de idade.

Renato Pereira é antropólogo e publicitário. Formou-se em antropologia em 1983 pelo Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ. No final da década de 1980, viveu em uma aldeia Caiapó, às margens do rio Xingu. Ensinou os índios a se filmarem para que os próprios caiapós estudassem seus hábitos e comportamentos históricos.

Renato Pereira fez as 2 campanhas de Eduardo Paes a prefeito do Rio e as 2 de Sérgio Cabral ao governo do Rio de Janeiro, ambos do PMDB. Em todas, saiu-se vitorioso.

Em 2012, fez a campanhas de Henrique Capriles à Presidência da Venezuela, derrotado por Hugo Chávez. Em 2013, novamente esteve com Capriles, que foi derrotado pelo chavista Nicolás Maduro –mas a diferença foi de menos de 2 pontos percentuais.

Fora da política, foi um dos proprietários da produtora de filmes TV Zero, que produziu filmes como “Bruna Surfistinha”. Já produziu também videoclipes de bandas e artistas como Paralamas do Sucesso, Gabriel o Pensador e Lobão.

Renato Pereira é estrategista de comunicação da agência Prole Gestão de Imagem, sediada no Rio, e atual publicitário do PSDB, junto com seu sócio, o também marqueteiro Chico Mendez.

Folha/UOL: Olá internauta. Bem-vindo a mais um "Poder e Política - Entrevista".

Este programa é uma realização do jornal Folha de S.Paulo e do portal UOL. A gravação é realizada no estúdio do Grupo Folha, em Brasília.

O entrevistado desta edição do Poder e Política é o publicitário, antropólogo, Renato Pereira, que recentemente tem cuidado das propagandas do PSDB em rede nacional.

Folha/UOL: Olá, Renato. Muito obrigado por estar aqui no estúdio do Grupo Folha.
Renato Pereira:Olá.

Começo te perguntando, você trabalhou para várias campanhas e políticos recentemente. Poderia me dizer quais foram as principais ou mais relevantes campanhas políticas nas quais você trabalhou e qual foi o desfecho dessas campanhas?
Olha, acho que [entre] as principais certamente a do Sérgio Cabral (PSDB-RJ), que nós fizemos, falando só as principais, Senado, depois governo – a eleição dele em 2006, depois a reeleição em 2010. A do Eduardo Paes (PMDB-RJ) para a prefeitura em 2008, que foi a eleição mais apertada que a gente já fez. O Eduardo ganhou com 0,5% dos votos, com 50 e poucos mil votos, do Fernando Gabeira no segundo turno. Depois fizemos a reeleição do Eduardo também. E acho que a eleição do [Henrique] Capriles foi um projeto grande na Venezuela.

Em 2012.
É, mas a gente começou um ano e meio antes porque a gente fez toda a preparação na Venezuela. As oposições escolheram um candidato único. Então houve uma prévia da oposição. Então nós entramos seis meses antes das prévias, quando o Capriles ainda estava disputando contra cinco outros candidatos. Então organizamos isso tudo, criamos a marca... Enfim, ajudamos toda a campanha. Aí ele venceu as prévias com 60% e poucos dos votos, e depois, então, que ele foi para enfrentar o [Hugo] Chávez.

Como é que você chegou à Venezuela?
Na verdade, eu cheguei à Venezuela através da Argentina porque a gente deu uma consultoria para o Daniel Scioli na eleição dele para governador da província de Buenos Aires. Mas aí foi só uma consultoria.

Em que ano isso?
2011, se não me falha memória. E aí a gente teve a oportunidade de conhecer uma empresa americana que eu respeito muitíssimo, que é a Greenberg, que faz pesquisas, trabalha muito com mensagens... Acabei conhecendo o Stan Greenberg e o James Carville, que é um consultor americano super conhecido, que é muito parceiro do Stan. E eles estavam assessorando, na época, o Scioli. E aí a gente se conheceu e pouco tempo depois eles disseram: “Olha, a gente está começando um projeto na Venezuela em que falta toda essa parte de comunicação e a gente gostou muito do approach de vocês na Argentina. Queria saber se vocês têm interesse em participar lá”. Aí participamos de um bid [oferta], ganhamos e fizemos um dos projetos que eu mais tenho orgulho de ter participado junto com o Chico Mendes, que é o meu sócio. Então foi muito legal.

Ali era uma derrota anunciada já ou você acha que em algum momento teve a possibilidade de vencer na Venezuela? Só para lembrar, na Venezuela, Hugo Chávez morreu. Daí ele já tinha determinado que o sucessor seria Nicolás Maduro e aí a oposição sempre muito fragilizada por conta da alta popularidade de Chávez.
Exato.

Aí, o que se dizia era: “Bom, a eleição vai ser rápida com a influência do Chávez quase que viva. É impossível ganhar”. Era isso mesmo?
Era. Se dizia que era impossível ganhar e que, provavelmente, a derrota ia ser por um placar maior do que tinha sido contra o Chávez. Mas, primeiro, voltando ao Chávez: Acho que ninguém tinha ouvido falar de Henrique Capriles principalmente no Brasil. Me lembro que a imprensa, quando falava da oposição Venezuela, dava um quadro de total desorganização. Não há uma liderança, não há um partido expressivo. Então, assim, acho que primeiro o trabalho lá foi muito importante. Não só o nosso, mas o trabalho particularmente do Capriles e do partido dele, o Primeira Justiça, de conseguir organizar a oposição Venezuela, lhe dar credibilidade, conseguir popularizar uma liderança da oposição. Porque havia uma grande dificuldade, era um país muito divido. Para você ter uma ideia, na Venezuela 50% da população estão na classe que eles chamam de consumo classe E. Literalmente, 50%. Então, é uma população...

Seria o equivalente no Brasil a uma renda muito baixa. É isso?
Muito baixa. Você via pessoas em larga escala vivendo em casas de folha de zinco. Eu cansei de entrar com o Capriles em casas assim: Uma folha de zinco aqui, o teto de folha de zinco, um ambiente só, tudo junto. Assim, a população muito pobre. E a oposição venezuelana sempre teve muita dificuldade de conseguir se aproximar e se comunicar com o eleitor mais pobre. Então, esse era um grande desafio. Só viria a haver viabilidade no projeto se a oposição conseguisse fazer isso. E esse é o principal desafio nosso, na verdade. Do próprio Capriles, do partido dele durante a eleição desde as prévias. E isso foi conseguido com êxito. Hoje claramente existe na Venezuela uma oposição estruturada, um líder político respeitado, com pegada popular. Tanto é que a perda para o Maduro foi ali por 1% dos votos.

Quanto foi, me refresque a memória, o resultado aproximado em percentual?
Contra o Chávez a derrota foi por 9,5%. Contra o Maduro foi 1,2%. Então foi, assim, muito pouquinho.

Ponto percentual. 1,2 ponto percentual.
É muito pouquinho. Então, houve uma derrota eleitoral, mas eu não tenho a menor dúvida que houve uma grande vitória política. Hoje existe oposição estruturada, respeitada dentro da Venezuela. E com poder real.

Vamos falar do Brasil. Marketing político no Brasil tem evoluído ao longo dos anos e se tornado muito importante. Qual é a sua avaliação dessa atividade ao longo dos últimos anos? O que tem sido positivo? O que tem sido negativo?
Fernando, começando pelo negativo, eu acho que existe, primeiro, uma série de preconceitos em relação ao marketing político não só no Brasil. Mas falando aqui do caso brasileiro...

No mundo inteiro.
É, no mundo inteiro. É verdade. Mas, enfim, de um lado você tem um preconceito que eu acho que é injustificado. É uma visão de que quem faz comunicação política distorce na verdade distorce as coisas ou cria coisa coisas diferentes do que elas são, que faz uma propaganda enganosa, não é? Ou seja, é cria uma distorção do mundo da política. E, na verdade, como eu vejo uma democracia jovem como é a democracia brasileira e com um eleitorado tão grande – a gente tem mais de 170 milhões de eleitores no país – eu acho que a gente faz, trabalhado do jeito correto...

170 [milhões]? Eu acho que uns 150 [milhões].
150? Eu acho que um pouquinho mais. Enfim, a ver.

Mas é grande.
Temos uma democracia, um grande eleitorado. É um país com uma democracia ainda, talvez, na sua infância. Tem menos de 30 da redemocratização, tem 28 anos. Então, eu acho que a comunicação política acaba ajudando muito a engajar as pessoas, a fazer com que todos os cidadãos, de alguma maneira, tenham acesso aos princípios, às causas, aos valores, aos projetos dos partidos políticos das principais lideranças políticas brasileiras. E eu acho que isso é muito importante para que as pessoas tenham interesse por política, que elas tenham acesso aos principais debates que estão acontecendo, que elas consigam distinguir entre projetos políticos alternativos ou opostos. Então, assim, eu não tenho a menor dúvida sobre o valor do nosso trabalho. Eu gosto muito de política. Desde pirralho eu gosto muito de política. E me orgulho muito do que eu faço e boa parte das pessoas do meu meio fazem também.

Agora, avaliando em perspectiva, acho que o que se faz no Brasil é um trabalho de altíssima qualidade. Não é à toa que muitos profissionais brasileiros já há algum tempo fazem trabalhos também fora do Brasil. Eu acho que isso tem a ver com a publicidade brasileira, que também sempre foi uma publicidade de muito bom nível.

Então, o que tem mudado?

É isso que ia te perguntar. A impressão que se tem é que mudou tecnicamente porque a tecnologia ajuda, não é? A qualidade melhora, aparece cinema. Mas e no conteúdo? Houve avanços ou é, mais ou menos, uma linguagem mais retilínea que a gente ouve já há muitos anos? Eu tenho essa impressão às vezes.
Que continua a mesma coisa?

Ó, vou te falar: Começa uma campanha eleitoral. Primeiro programa apresenta o candidato, a biografia do candidato, “aqui está a minha proposta”, “eu nasci em tal lugar”. Daí começam os programas seguintes, a falar uma proposta para a infraestrutura, para a saúde, para a educação, mas que é uma fórmula mais ou menos fixa. É isso mesmo?
Olha, eu acho que não. Se você pegar os programas da gente, em nenhum dos nossos primeiros programas nós fizemos a gente fez biografia de candidato. Nem da Eduardo, nem no Cabral, nem no Capriles. Então eu acho que tem maneiras diferentes de você fazer isso. Mas, talvez a principal diferença, Fernando, é que você tem linguagens. Então, por exemplo, linguagem que a minha equipe adota aqui no Brasil é uma linguagem menos publicitária do que normalmente é feito no Brasil. Não tem aí nenhum juízo de valor não. Eu acho que se tem profissionais de altíssima categoria como o Duda [Mendonça], o João [Santana], que acabaram vindo para uma escola um pouco mais publicitária em que a forma é particularmente importante e a linguagem publicitária particularmente presente. A gente, por exemplo, adota uma coisa mais próxima do documental e procura aproximar um pouco mais o candidato da vida como ela é. É uma questão de opção de linguagem.

Mas talvez a principal evolução que a gente tenha no marketing político recentemente não seja o que está aparecendo na forma ou o que você vê na televisão. Acho que tem duas coisas novas importantes. Primeiro o investimento maciço no conhecimento do eleitor. Eu acho que isso faz uma enorme diferença. Então, normalmente você tinha as ferramentas clássicas do conhecimento do eleitor que são as pesquisas quantitativas e as pesquisas qualitativas. A gente tem cada vez mais usado todas as disciplinas ligadas a ciências sociais para você entender com mais profundidade o que faz o eleitor se comportar de uma determinada maneira ou tomar determinadas decisões. Mas, também, a gente tem usado cada vez mais as ferramentas das redes sociais para tentar entender empiricamente o quanto a abordagem que a gente faz funciona ou não.

Me dê um exemplo. Porque isso daí não seriam também pesquisas?
Seriam, mas são pesquisas... Raramente você faz pesquisas a posteriori que testam claramente o que você fez. Por exemplo, eu estou te mandando para uma região do Rio de Janeiro, por exemplo. Estou disparando uma série de telefonemas falando sobre temas que são mais caros a uma região do Rio de Janeiro. OK. Normalmente, o que você fazia? Você tinha uma ideia por pesquisas quantitativas e qualitativas. Tinha hierarquia de temas e você sabia ali numa distribuição geográfica quais são os temas importantes para cada área do Rio de Janeiro, para classe social, certo? Raramente você testaria depois qual foi o impacto real que você teve quando você mandou uma comunicação direta para aquela pessoa. Então, se ela recebeu um e-mail, como é que ela reagiu? Então, hoje a gente já consegue testar. Você, Fernando, recebeu um e-mail nosso, certo?

Propondo ou mostrando o quê? De segurança, transporte...
Falando de alguma coisa, certo? Exatamente. Você tem o mesmo perfil que o “Mário”. Só que para o Mário, a gente não mandou nada. Digamos que o Mário funciona como um grupo de controle, certo? Então ele não recebeu nada. Você recebeu alguma coisa. E a gente vai testar depois se para o Mário e para o Fernando houve alguma diferença em relação à perspectiva do nosso candidato. Se houve alguma proposta...

Mas como assim? Você manda comunicação direta para mim. Não mandou para o outro eleitor.
Exatamente. Um que tem o perfil parecido contigo.

E daí você faz o quê? Faz um comercial, uma propaganda? Ou tem uma ação?
Não, não, não. Eu investigo empiricamente. Eu vou até você, vou até ele e vejo se houve algum impacto nele.

Mas por que teria havido algo para ele se ele não recebeu nenhum estímulo?
Como é que uma – isso é um preceito – indústria farmacêutica testa o efeito de um remédio?

Com placebo.
Exatamente. Você tem um grupo de controle que toma placebo, você tem um outro grupo que toma um determinado remédio. Você, ao longo do tempo, verifica se teve uma diferença entre eles. Mas você tem que ter um grupo de controle. Se você não tive rum grupo de controle, você não tem um efeito comparativo para julgar se a sua mensagem teve algum efeito real ou não.

Deixe eu entender. O candidato, ou o partido, ou o grupo político envia um estímulo para um grupo de eleitores diretamente. Não envia para outro que é muito semelhante. Depois de um tempo, procura de novo aquele que não recebeu estímulo nenhum para ver se chegou até ele alguma onda, algum impacto daquilo que foi...
Claro. Porque você tem várias outras influências, que são os telejornais, os comerciais que passam na televisão etc.

Agora, Renato, isso deve ser uma fortuna para conseguir fazer, não é? Porque exige muito material humano, não é?
Não. Na verdade, não. Acho que são um custo quase que marginal dentro de uma campanha que, normalmente, tem investimentos muito maiores na produção de comercial de televisão.

Nós estamos falando de quantas pessoas que vão ser contatadas diretamente? É muita gente, não é? Não pode ser cinco pessoas.
Não, mas você faz isso em grupos de controle que são menores em escala. Aí você tem uma ferramenta da estatística para poder controlar isso com uma escala menor. Isso é algo que vem sendo feito também nos Estados Unidos também de, sei lá, 10 anos para cá, dos anos 2000 para cá.

Então, deixe eu entender. Nas ferramentas que são usadas para entender o que passa na cabeça do eleitor, primeiro, pesquisa quantitativa desde sempre.
Desde sempre. Qualitativa...

E qualitativa desde sempre. Os grupos de conversa para entender o que pensa o eleitor. E depois esse outro tipo de... Como é que se chama esse outro tipo de controle?
São pesquisas empíricas que você delimita alguns grupos e procura verificar o quanto a tua abordagem... Eu estou falando particularmente em relação à abordagem individualizada porque esse é outro aspecto que mudou também. Enfim, algumas pessoas chamam de “microtargeting”.

Isso significa o quê? Tanto ou telefonar ou ir direto, diretamente na pessoa. É isso?
Direto pessoalmente no porta a porta, na carta, no e-mail, no telefonema...

Quantos visitadores para ir pessoalmente? Quantas pessoas são atingidas, digamos, numa campanha para governador do Estado do Reio de Janeiro nesse tipo de pesquisa empírica, como você chama?
Na pesquisa empírica, você está falando aí de centenas de pessoas. Centenas de pessoas abordadas.  Então, na verdade, por isso que eu estou te dizendo, o esforço de fazer essa pesquisa do ponto de vista financeiro e operacional é pequeno. E particularmente pequeno se você comparar o esforço que você faz para chegar a você na comunicação porta a porta porque isso é um esforço significativo.

Entendi.
Ou na mensagem telefônica, ou na mensagem por e-mail, que são instrumentos cada vez mais usados. Mas também essa abordagem individualizada é, de certa forma, uma novidade, diria aí, dos últimos 10, 13 anos no Brasil. Normalmente aqui você sempre privilegiou o antibiótico, a medida em massa, a televisão. Como se a televisão resolvesse tudo. Na verdade – no meu ponto de vista, da equipe que trabalha comigo –, o ideal é que você faça uma combinação entre as duas coisas. As mídias que permitem você segmentar e trabalhar com as pessoas num plano quase que individual com a mídia que te dá a grande direção, o farol, os grandes temas, a direção geral para onde a campanha está indo, que aí claramente [é] a televisão.

A televisão é uma espécie de artilharia aérea, não é? Você vai lá e bombardeia todos, indistintamente de quem está recebendo aquela mensagem. Que importância num país como o Brasil – de dimensão continental, eleitorado gigante – tem ainda a televisão e vai ter na eleição de 2014?
Tem uma importância tremenda. Mas qualquer eleição em que você comece a ter margens pequenas, todas as técnicas de abordagem individual passam a ter uma diferença determinante. Então, enfim, todas as eleições em que participei que você estava discutindo ali percentuais pequenos... 3%, 5%, 2% de variação, que às vezes pode ser a diferença de um candidato passar para o segundo turno e um outro não, não é?

A grande massa do eleitorado ainda é de uma faixa de renda mais modesta. São mais pobres. Era assim na Venezuela e no Brasil também não é muito diferente. A tendência desse eleitorado é, de fato, ainda, muito se informar por meio da televisão. Aí, que diferença faz nesse grupo do eleitorado? Internet ou comunicação direta, não sei como você chamaria.
Faz uma enorme diferença.

Por quê?
Primeiro porque você tem técnicas que permitem abordar o eleitorado mais pobre. Por exemplo o porta a porta. Na Venezuela, a gente fez uma campanha em desigualdade de condições absurdas. Você tinha um governo com três canais de televisão próprios, com toda a mídia institucional. Lá você compra mídia, então também a verba de publicidade oficial para comprar mídia durante a campanha era muito superior à da oposição. Então, enfim, a desigualdade de capacidade de você usar a televisão para falar com o eleitor era absurda. No mínimo de 10 para 1, certo? Como é que a campanha do Capriles respondeu a isso? Essencialmente com o porta a porta. Aí o porta a porta tinha duas vantagens muito importantes. A primeira...

Quantas pessoas você usou no porta a porta?
Não era nem nós que estávamos usando o porta a porta. A gente ajudava a municiar o porta a porta. A campanha do Capriles tinha o seu próprio dispositivo e um dispositivo muito militante, na verdade. Essencialmente militante.

Quantos militantes foram trabalhar lá?
Não sei exatamente, Fernando. Mas alguns milhares de pessoas. Mas o esforço do próprio candidato também foi absurdo. O Capriles fazia porta a porta durante toda a pré-campanha, durante a campanha todo santo dia. E aí você tem duas coisas importantes...

Porta a porta é o candidato vai a um bairro e bate de casa em casa.
Bate de casa em casa e conversa pessoa a pessoa. O que eu estou [tentando dizer é] tem duas coisas importantes: Primeiro você tem o efeito direto do porta a porta feito pelo próprio candidato ou pelos militantes...

E o impacto posterior?
E o impacto simbólico na comunicação de massa que é você mostrar que você tem alguém que realmente chega ao nível do cidadão, conversa, conhece profundamente, vai à sua casa, entra na sua casa, sabe o que está falando. Então, na Venezuela em que a gente tinha esse desafio de popularizar, ajudar a popularizar um candidato de um extrato social mais alto, isso foi particularmente importante.

Mas voltando à outra pergunta. Mesmo num país com extratos da população mais pobres... Podem eventualmente estar um pouquinho mais afastados da Internet. Embora, no Brasil, você sabe que cada vez mais tem gente conectada. Mas, mesmo assim, a forma de comunicação direta como o porta a porta é muito importante, no meu modo de entender.

A propósito, televisão no Brasil é paga pelo Estado. Há uma divisão e há um sistema muito rígido na época da campanha sobre o uso de TV. Qual é a parte boa e a parte ruim desse sistema adotado no Brasil para uso da televisão e do rádio?
A parte boa é que eu acho que torna, de certa maneira, mais acessível a todos os candidatos, a todos os partidos, o espaço na televisão. A parte ruim é que eu acho que acaba criando um desequilíbrio, que ás vezes é um desequilíbrio exagerado em relação à distribuição de tempo. Eu não acho isso, por essência, negativo. Às vezes ele acaba criando umas distorções. Eu acho que é coerente com o modelo que a gente tem de organização de sistema político. Você tem mais tempo que, enfim, toda a nossa governança se baseia ali no que o Sério Abranches chamou de presidencialismo de coalizão. Então, na verdade, uma coisa é coerente com a outra. Se você depende de coalizão partidária no Congresso para exercício no governo, faz sentido de que, quando você tenha campanha, também isso tenha uma tradução do tempo de TV. Mas, às vezes, isso cria algumas distorções um pouquinho exageradas.

No que diz respeito aos horários em que as propagandas entram no ar, tanto o programa mais longo como os spots mais curtos, essa fórmula é boa?
Eu acho que é.

Esse problema mais longo é útil?
Extremamente útil.

É mesmo?
Extremamente útil, nossa mãe. Porque o programa permite a você...

O programa mais longo é esse que eu estou falando: Na TV, no começo da tarde e no início da noite. No rádio é de manhã e na hora do almoço.
Claro. Ou mesmo fora da época partidária, como, por exemplo, ontem teve o programa do PSDB. É um programa de 10 minutos. Qual é grande vantagem dele? Ele pode ter uma audiência menor. Mesmo assim, é uma audiência significativa. Você tem, numa noite como ontem, entre 12 e 13 milhões de pessoas que de alguma maneira assistiram ao programa. É um número expressivo. Muito menor do que o número de pessoas que vão assistir um comercial de televisão colocado no meio da programação. Porém, o programa permite a você desenvolver uma história, apresentar um enredo. Muito mais do que um comercial. Então, eu acho que a combinação entre as duas coisas é importante.

Se você ver... Vou te dar um exemplo. Na Inglaterra, você tem momentos em que os partidos usam o tempo maior de televisão no formato de programa. Às vezes você de 4 minutos, 5 minutos. Campanha do Obama em 2008, final da campanha do Obama em 2008...

Teve um programa longo.
Programa de 20 minutos. Eles compraram 20 minutos de televisão e fizeram um programaço. Eu gosto muito daquele programa. Você tinha todo um enredo ali, claramente desenvolvido.

Então acho que a combinação entre as coisas é bacana.

Você falou um pouco antes numa resposta sobre o preconceito que se tem um pouco a respeito do marketing político. Eu até tenho umas frases aqui antigas de 2, 3 anos de alguns publicitários que não estão na área política. Olha só. Washington Olivetto, publicitário muito conhecido, disse assim: que ele só gosta de anunciar coisas que as pessoas possam devolver se não gostarem. E disse também que, abrem aspas: “Minha ideologia criativa, que se baseia na verdade bem contada, não combina com o marketing político”. Fecham aspas. Fábio Fernandes, que é presidente diretor da F/Nazca, já disse o seguinte: Que “o mercado já tratou de distinguir separando seus profissionais entre marqueteiros e publicitários”. Fecham aspas. O que você acha dessas afirmações?
Eu acho que elas carregam o preconceito do senso comum a respeito da política, que é de enxergar a política com uma atividade particularmente complicada, que tem aspectos negativos e tudo isso. E, na verdade, eu não compartilho dessa crença. Eu acho que tanto o que se faz no mercado privado também tem os seus problemas, os seus vícios. E tenho uma crença muito firme que a política é, por excelência, o instrumento de transformação da sociedade. Sempre gostei de política. Valorizo a política. Gosto muito de fazer política. E acho que a atividade de comunicação política é muito importante para o exercício da democracia.

Mas acho que é tipicamente preconceito ali da classe média ilustrada a respeito da política. O olhar um pouquinho blasé a respeito. Como se a política não fosse assim tão importante ou tão necessária.

Você hoje faz os trabalhos de marketing político para políticos do PMDB no Rio de Janeiro e no plano nacional está fazendo o trabalho para o PSDB, para o pré-candidato à presidente Aécio Neves. Eu queria falar sobre conjuntura um pouco, em que tudo isso se encaixa. No ano que vem tem eleição. E, em geral, tem um conceito, que eu gosto muito e muitos dizem até [ser] ultrapassado, do Norberto Bobbio [filósofo político italiano] – daquele livro “Direita e Esquerda” – que ele fala assim: No fundo só tem dois tipos de partido. Um partido expressa suas ideias como partido da igualdade social. Um grupo de partidos. E o outro fica no campo... É o partido da liberdade. E eles são polos opostos. Quando a gente passa por momentos de crise econômica, ou o crescimento não está muito bom, ou o país ainda não é muito desenvolvido – tem um extrato social ainda mais pobre –, em geral, quem leva a vantagem é o partido da igualdade social. Porque “olha, nós vamos ajudar esse país a crescer, os mais pobres...”. E aquele partido das liberdades, aquele campo das liberdades fica em desvantagem. Isso daí é hoje assim no Brasil. De um lado tem o PT e seus aliados. E, do outro, mais ou menos o PSDB e os seus. Como é que você pensa que isso vai se replicar em 2014?  E como furar esse tipo de bloqueio?
Posso dar um passinho atrás? Voltando um pouco às origens, você tem a Constituição de 1988, que sinaliza um contrato social com forte compromisso com seguridade social e com a redução da desigualdade. E dois partidos, acho que sociais-democratas, tanto o PT quanto o PSDB, que encarnam esse compromisso. O PSDB governa o país antes do PT. Ele desenvolve toda uma arquitetura institucional, funda as bases de uma política econômica que leva à estabilidade da moeda, uma certa reforma no Estado, responsabilidade fiscal. Mas também é um partido que lança algumas políticas claramente voltadas para a seguridade social. Inclusive projetos de transferência de renda importantes. Então, de cara que você tem no começo... E a própria estabilidade da moeda propiciou uma redução da desigualdade bastante expressiva e criou os fundamentos para a continuação da redução da desigualdade que houve no Brasil durante a gestão do PT também.

Então, ou seja, você tem dois partidos aí que, de certa maneira, têm fundamentos mais próximos do que essa distinção clássica que você consegue enxergar com mais clareza na Europa, em que você tem partidos sociais-democratas claramente com esse compromisso mais com a pegada social e partidos de centro-direita claramente voltado mais para a questão da liberdade individual e para técnica da gestão da governança, para a eficiência da governança. Uma pegada mais liberal, digamos assim. Aqui no Brasil, isso se dilui um pouquinho. Você tem uma aproximação entre essas duas vertentes. É difícil você ver, mesmo saindo do PT e do PSDB, qual é o partido claramente liberal no Brasil, ou que exprime claramente um ideário liberal.

Então, aqui já se complica um pouquinho essa equação. Eu acho que tem uma distinção, eu não tenho dúvidas, que o PSDB tem um fundamento um pouco mais liberal. Particularmente no que se refere à gestão da economia. Aí acho que talvez esteja uma diferença de princípio, embora o PT, particularmente até 2009, tenha executado uma política econômica muitíssimo semelhante à que foi lançada pelo PSDB na gestão do Fernando Henrique Cardoso. Mas se você for falar filosoficamente, se há uma distinção, essa distinção acontece particularmente na maneira como é vista a política econômica. E hoje essa distinção se vê um pouco mais na prática. Você tem um PT fazendo uma intervenção de Estado claramente mais forte do que o PSDB faria.

Mas jogando para 2014. Porque embora quando a gente começa a discutir vai vendo as camadas todas que tem em cada partido, é possível fazer essa discussão. Mas no imaginário popular, você tem Fernando Henrique Cardoso, o presidente do Real, estabilizou a economia, a inflação controlada. É claro que isso tem efeitos pra distribuição de renda, etc. Porém, a imagem principal é essa, no geral. Aí você tem o Lula, que vem depois, fica 8 anos, é o presidente do social, do Bolsa Família, que ajudou os mais pobres. Ele tem essa imagem, ligada a ele e ao PT. E isso, enfim, existe, isso é um fato. Embora possa se discutir “ah, mais tudo começou... ele só pode fazer porque o Fernando Henrique fez”, vários tentaram, mas o fato é que é uma luta às vezes inglória porque Fernando Henrique ficou como pai do Real, da estabilização econômica, Lula é o pai do social. E eu até te pergunto. Agora veio, em seguida, Dilma Rousseff, que sucedeu a Lula. É do PT também. Que imagem você acha que fica dessa terceira fase da democracia brasileira? Oito anos de Fernando Henrique ficou aquela imagem. Lula ficou com uma imagem também muito clara. Desse governo, desse período Dilma, que imagem fica?
A imagem que fica para o eleitor? Acho que agora a gente tem uma variação importante em função do que aconteceu recentemente no país. Mas a narrativa do governo Lula e do governo Dilma, o posicionamento dela, ela se coloca como uma continuação do governo do Lula. Ou seja, que tem um compromisso social como compromisso central da sua gestão. Até o próprio slogan do governo, é “País rico é país sem pobreza”, manifesta claro compromisso central com a redução da desigualdade e o compromisso social.

Mas está ficando essa imagem?
Eu queria só dar um passinho atrás, de novo, rapidamente porque você tinha me perguntado em relação a como é que a gente enfrenta essa questão de 2014. Eu só estava tentando levantar o ponto, eu não acho que haja uma diferença de essência em relação ao compromisso social entre PT e PSDB. Esse é um ponto. Como é que isso aconteceu historicamente? Acho que o PSDB perdeu a sua identidade popular, quando se fala nacionalmente, porque regionalmente o PSDB continuou muito forte, muito capaz de vencer eleições, localmente também, nos municípios. Agora, nacionalmente acabou de alguma maneira se configurando uma imagem de um partido que não está tão comprometido assim com a agenda social, e de um partido que talvez tivesse mais compromissos com a elite, digamos assim. Essa imagem que o eleitor mediano brasileiro passou a ter dos brasileiros nos últimos anos.

Por que que aconteceu isso?
Acho que primeiro pelo PSDB não estar mais na presidência. Quem está exercitando a presidência da República é o PT, e durante os últimos dez anos houve uma melhoria de vida de uma parcela importante da população. Então, se atribui isso a quê? É normal que se atribua a quem está gerindo o país neste momento. Então o PT naturalmente se beneficiou disso e o PSDB, por definição, já estava mais distante, e era quem exatamente antecedeu o PT. Além disso..

Mas o PSDB poderia ter feito alguma ação para não ser prejudicado por isso, ou não?
Claro, mas é sempre um pouco mais difícil quando você está no exercício da oposição, não dispõe de todos os mecanismos de comunicação que estão acessíveis a quem é o incumbente.

Deixa eu problematizar, veja só. O PT, enquanto não esteve no governo, sempre teve essa imagem de que, entrando no governo, iria cuidar do social.
Mas também tinha a imagem de radical, também tinha a imagem de oposição por oposição, também tinha uma série de coisas negativas que ele só conseguiu desconstruir quando teve a chance de ter uma eleição de mudança pela frente e aproveitar bem a oportunidade que teve. Então é normal que você padeça de alguns males quando você está na oposição, particularmente porque a sua história também passa a ser contada com alguma eficiência por aqueles que estão no exercício do poder, que acho que é algo que também aconteceu ao PSDB. O PT conseguiu fazer isso com alguma competência nos últimos anos, manifestar sempre como ele via o PSDB, como via o passado do país. Então parte de nossa tarefa agora é exatamente, de alguma maneira, atualizar a imagem do PSDB.

Inclusive, eu me lembro que em várias campanhas eleitorais há sempre uma discussão eterna no PSDB sobre vamos ou não vamos usar a imagem do ex-presidente Fernando Henrique. Então é uma situação quase que bipolar. “Não, vamos usar”, aí usa. “Não, não deu certo”, não usa mais. Volta a usar de novo. Isso foi um erro lá? Você tem uma clareza sobre se é bom ou não usar a imagem de Fernando Henrique?
Eu acho que usar a imagem do Fernando Henrique é absolutamente essencial. Primeiro porque é um presidente que deixou um legado importantíssimo para o país. Segundo porque é uma das lideranças centrais do PSDB. Então, quando você de alguma maneira... Não vou dizer “renegar”, talvez seja um termo forte. Mas quando você de alguma maneira oculta a sua própria origem, os seus próprios líderes, acho que você não está fazendo um bem assim mesmo. Óbvio que você tem contextos em que é mais difícil você portar determinadas bandeiras. Mas tentar evitá-las, tentar ocultá-las, na minha concepção, é sempre um erro. Eu acho que você tem que ser verdadeiro na comunicação que você faz independente do que contexto que você esteja enfrentando. É claro que é uma questão mais de ênfase. Acho que o ponto principal que a gente tem, por exemplo, no ano que vem é que o eleitor brasileiro está muito mais interessado em discutir o futuro do que discutir o legado. Então você tem um país aonde milhões de pessoas conseguiram mudar de vida muito por conta do seu próprio esforço. São pessoas que conquistaram trabalho, que abriram o seu próprio negócio, que estão estudando, que conseguiram entrar na universidade. Enfim, essas pessoas estão preocupadas com o quê? Com o próximo passo delas. Qual é a perspectiva que o país tem e que minha família tem. Como é que vou continuar prosperando.

Mas, nesse sentido, a presença constante de um presidente como o Fernando Henrique, que para muitos já é uma coisa muito antiga – o eleitorado mais jovem –, é uma coisa boa ou ruim? Ela tem que ser usada com parcimônia, a imagem do Fernando Henrique, nesse caso?
Olha, naturalmente... O que eu estou dizendo? A gente já tem uma eleição que a agenda é muito mais para frente do que para trás. É muito mais uma discussão de como é que você faz para que as políticas públicas que hoje não estão dando certo sejam substituídas públicas que deem certo. Essa é a discussão. O que não está dando certo no Brasil? Como é que você tem que enfrentar o que não está dando certo? Qual é a sua proposta para o que não está dando certo? O que diferencia o PSDB e as propostas do PSDB em relação ao que o governo do PT está fazendo hoje? Essa é a agenda que interessa essencialmente o eleito, certo?

É claro que você tem também uma discussão “olha, tem determinadas coisas que estão sendo feitas no Brasil que são positivas, importantes, que na verdade foram iniciadas lá atrás por políticos como o Fernando Henrique Cardoso”. Então, é óbvio que isso aí vem, mas a discussão essencial é uma discussão de futuro. A preocupação da gente não deve ser buscar quem realmente começou determinada coisa. É claro que isso vindo, mas é uma questão de ênfase. Na minha visão, a ênfase não é no legado, é no futuro. O que de modo algum significa dizer que não é falar em Fernando Henrique Cardoso etc. Até porque muito das propostas que o PSDB tem para enfrentar o contexto atual tem a ver com políticas públicas que foram já adotadas lá atrás e que, de certa maneira, foram abandonadas particularmente a partir de 2009.

Basicamente, quando tem uma eleição, o eleitor, ainda que de forma inconsciente, se pergunta: “Eu estou melhor ou estou pior do que eu estava há 4, 8 anos? E qual desses candidatos vai me ajudar a ficar melhor?”. E quando o país continuar a crescer é muito difícil haver mudança. Apesar de que o crescimento ás vezes não ser muito robusto, o país crescendo estável favorece a quem está no poder. Daí tem essa discussão. Depois de 12 anos de PT, que vai ser o caso no governo federal em 2014, o eleitor já está querendo experimentar uma mudança ou não? Qual é a sua opinião? E, já problematizando, os períodos podem ser mais longos porque o PSDB está há muito mais tempo, por exemplo, no governo de São Paulo e lá o eleitor sempre renova esse contrato com os tucanos.
Fernando, eu acho que na verdade são duas perguntas. No mínimo duas que o eleitor se faz. Você claramente tem a pergunta “poxa, eu estou vivendo melhor ou estou vivendo pior em relação ao passado?”. Claro, é uma pergunta importante. E, se você faz essa pergunta hoje, a maior parte da população brasileira vai te dizer “eu estou vivendo melhor do que eu vivi no passado”. Mas a pergunta mais importante não é essa. A pergunta mais importante é “qual é a minha perspectiva de dia seguinte?”, ”qual é a minha perspectiva de futuro?”. Então, se você pergunta hoje ao cidadão, a quem mora no Brasil, se você acha que a tua vida vai melhorar ou piorar nos próximos meses, a maior parte dos brasileiros tem insegurança em relação ao seu futuro. Se você perguntar “os preços vão continuar aumentando ou vão diminuir?”. Dois terços vão te dizer que os preços vão continuar aumentando. Então, a incerteza em relação ao futuro hoje é muito significativa. E eu acho que vai vencer a eleição quem for capaz de transmitir confiança, segurança em relação à perspectiva de futuro dos cidadãos e das famílias brasileiras.

Mas, na sua avaliação, o senador Aécio Neves, do PSDB de Minas Gerais, que é o pré-candidato e possivelmente o candidato do PSDB à presidente, consegue incorporar tudo isso e transmitir essa segurança que você disse que o eleitor vai buscar para o futuro?
Fernando, é um processo. As janelas de comunicação de que dispõe o PSDB e o senador Aécio Neves hoje ainda são modestas. Você tem na mídia de massa algumas oportunidades – uma oportunidade a cada semestre –, na mídia espontânea quando o senador aparece em entrevistas e toda uma iniciativa agora no campo digital de criar canais próprios de comunicação com o eleitor brasileiro. Então, esse é um processo. Acho que no ano que vem e ao longo da campanha é quando de fato vão existir as condições necessárias para uma comunicação mais próxima nessa direção. Agora, isso é um caminho que já se iniciou e tem esses objetivos.

O senador Aécio não foi modesto no trabalho até agora de nacionalizar mais o seu nome e tentar já avançar um pouco mais nesse processo?
Eu acho que não porque, em primeiro lugar, você tinha uma tarefa política importante de gestão dentro do próprio partido, de articulação política dentro das próprias bases do PSDB, que eu acho que foi um trabalho muito bem conduzido até agora. E acho que tinha que ser, evidentemente, a prioridade do senador durante os últimos meses. E acho que a partir de agora que a gente começa a entrar numa agenda um pouco mais voltada para o eleitor, digamos assim, para fora.

Assim, pensando em 2014, como você mesmo disse, o eleitor hoje, se indagado se tá melhor ou pior do que estava nos anos passados, a imensa maioria vai dizer que está melhor. Aí, a outra pergunta é “a minha perspectiva”, “como é que eu vou estar no futuro?”, “o que que eu quero para o futuro?”. Mas não é lógico que esse eleitor daí, olhando os candidatos, fale “bom, esse grupo que está no poder – que é o PT com Lula, agora com Dilma – me ajudou a ficar melhor até agora. Por que eu vou arriscar e trocar?” Não tem uma força enorme que leva o eleitor a manter aquilo que está mais ou menos dando certo para ele?
Não.

Por que não?
Porque mais ou menos dando certo. Se for uma força que está dando certo, eu te diria que sim. Mais ou menos dando certo, já são outros quinhentos.

Foi o que aconteceu em 2010, com a eleição de Dilma Rousseff, que daí o país estava num momento exuberante da economia?
Claro, ali era uma eleição de continuidade escancarada, não há a menor dúvida. Você tinha a economia crescendo muito, você tinha exatamente um momento de boom das famílias brasileiras tendo uma renda melhor, tendo acesso a muito mais bens de consumo, a mais alimentos, se sentindo empoderadas também, com mais direitos, não há a menor dúvida. Agora, veja bem, essas milhões de pessoas que conseguiram prosperar, elas não são fieis a ninguém. A preocupação delas é com o próximo passo, como vai ser o dia de amanhã. É a coisa mais normal do mundo, a gente mesmo, Fernando. Eu não sou diferente, duvido que você seja. A principal coisa que a gente pensa é como é que é o nosso dia amanhã, estamos tranquilos, vamos continuar bem, a nossa família vai continuar direito, nossos filhos vão seguir adiante? Se você começa a ter incerteza e insegurança em relação a isso, se o seu salário começa a não conseguir pagar a renovação do teu aluguel, começa a não conseguir botar os mesmos alimentos que botava em casa, o teu padrão de vida começa a ser um pouquinho comprometido, você começa a ter insegurança.

Mas Renato, veja bem. Em junho houve muitos protestos de rua no Brasil, todos os políticos em certa medida foram prejudicados nas suas taxas de popularidade, inclusive os pré-candidatos a presidente no ano que vem. Passado um primeiro momento, as ruas se esvaziaram um pouco, alguns políticos ficaram lá embaixo, outros até voltaram para um patamar que não era tão bom, mas melhoraram um pouco. Por exemplo, a presidente Dilma Rousseff perdeu muita popularidade e recuperou já um pouquinho. O senador Aécio Neves, nas pesquisas, perdeu também as suas taxas de intenção de voto e não conseguiu recuperar depois de junho. Por quê?
Primeiro, discordo de você. Depende...  Mesmo que você pegue o Datafolha e o Ibope. O Ibope, o senador [Aécio Neves] tinha 9% das intenções de voto. No Datafolha tinha 10%. Em junho tinha 14% pelo Datafolha, 13% pelo Ibope. O Datafolha deu exatamente com 13% ou 14% agora e o outro instituto, que é o MDA, que faz para a CNI [Confederação Nacional da Indústria], deu agora o senador com 15%. Então ela não voltou ao que ele tinha em março. Ele está mais ou menos aí na faixa de 13%, 15% das intenções de voto, que é um patamar quase 50% superior ao que ele tinha em março. Segundo, a recuperação da presidente Dilma, o que a presidente Dilma recuperou até agora é um pouco menos do que ela perdeu antes das manifestações. Não sei se você lembra que ela tinha caído 8 pontos, tanto pela Datafolha como pelo Ibope antes das manifestações, o que inclusive nos leva à pergunta: Por que que ela tinha perdido antes das manifestações? Eu acho que a resposta a isso claramente é a economia. E não a economia, quando você está lidando, “ah, o preço aumentou, mas será que a inflação já é tão expressiva assim?”. Não, a economia no sentido que afeta a perspectiva de futuro das pessoas.

Mas Renato, a impressão que se tem da economia, ainda os mais pessimistas, concordam que este ano não será tão ruim como o ano passado.
Ainda bem.

E que em 2014, como é tradição no Brasil, todo ano eleitoral, em geral, a economia acaba um pouco mais aquecida por fatores diversos. Então a economia vai fazer uma curva supostamente ascendente, de agora até 2014. Isso não é água no moinho mais da reeleição da presidente Dilma do que pra oposição?
A não ser que houvesse uma retomada do crescimento muito expressiva. O que tenho visto basicamente dos economistas que eu mais respeito no Brasil é, olha, a perspectiva é que a gente cresça aí na casa dos 2%. O que na verdade, para deixar bem claro, ninguém no PSDB torce por um mau desempenho do país. E nós não estamos falando hoje claramente com um eleitor ou com um país que está em crise, ou com um eleitor que é um coitadinho. Nós não estamos falando de Itália, de Portugal, de economias em crise. Nós estamos falando com um país que está numa encruzilhada, uma economia que está andando de lado, com famílias que conseguiram prosperar até um certo ponto, mas agora estão tendo dificuldades de renovar suas expectativas de continuar progredindo, e que têm dúvidas, incertezas e inseguranças importantes em relação ao seu futuro. Eu não creio que essas incertezas se transformem em certezas daqui para o ano que vem. A não ser que houvesse uma mudança substantiva do quadro econômico brasileiro. O que, a julgar, não houve nenhuma mudança importante do ponto de vista da política econômica brasileira agora, continuamos tendo um Estado particularmente intervencionista, mudando as regras do jogo, você tem claramente dificuldades nos leilões que estão em andamento agora, você tem problemas sério de infraestrutura, não creio que haja uma mudança significativa desse quadro de um ano pro outro.

Que discurso exatamente, síntese, terá Aécio Neves em 2014? No momento, na pré-campanha, ele fala muito “vamos conversar com os eleitores”, está se apresentando, tentando se aproximar do eleitorado. No ano que vem, como é que se sintetiza tudo isso que você está dizendo, numa campanha de um candidato de oposição como o Aécio?
A síntese que a gente tem hoje é “quem muda o Brasil é você”. Por que a síntese de nossa mensagem é essa? Basicamente por duas razões. Você está vivendo num país aonde a principal, a grande mudança nos últimos anos, que é a redução da desigualdade, que é a emergência de milhões de brasileiros, tanto em termos econômicos como em termos de cidadania mesmo, ela se deve em grande parte ao esforço de cada uma dessas pessoas. Os brasileiros conquistaram um melhor lugar ao sol graças ao mérito próprio. E você tem muitas pessoas no Brasil hoje que compreendem o valor do mérito. Esse é um ponto. O eleitor com que a gente está tentando falar hoje, que é a classe média tipicamente brasileira, a classe média mais baixa, ou a nova classe média, ser quiser chamar assim, é um eleitor que precisa se sentir valorizado. Não é um eleitor que é exatamente, como eu te falei, não é um coitadinho. É o eleitor que conseguiu progredir trabalhando por mérito próprio. Então você valorizá-lo já é uma forma muito importante de você mostrar que compreende o que tem de novo no país. Segundo ponto, tem a ver exatamente com a agenda mais liberal que o PSDB carrega em relação à economia. Que é uma visão de que o agente da mudança não é essencialmente o Estado. O agente da mudança está na sociedade. São os indivíduos, são as empresas, é a sociedade civil organizada.

Difícil introduzir esse tipo de ideia num país tão acostumado – todos os cidadãos quase – ao olhar para o Estado como um grande senhor e esperar que ele resolva tudo.
Fernando, isso tem mudado. Se tem uma das coisas que mais têm mudado no país é exatamente essa cultura do brasileiro médio. Você tem mudanças importantes em relação ao comportamento como você vê o mérito, como você vê o valor das coisas. Você tinha um país em que, sei lá, 30 anos atrás, o sonho do brasileiro médio era se tornar funcionário público. Era ter estabilidade, era ter que não se preocupar. É um certo estereótipo.

Se aposentar aos 50 anos...
Se aposentar aos 50 anos, ter uma boa aposentadoria... Hoje você tem um país em que o sonho de muitos brasileiros é ter o seu negócio próprio. O sonho de muitos brasileiros é conseguir alcançar, progredir, graças ao seu esforço. O sonho de muitos brasileiros é fazer com que os seus filhos consigam ir além de você. Como? Estudando. Estudando mais tempo do que você estudou. Tendo acesso a uma educação de qualidade que você não teve. Então, você tem mudanças culturais importantes acontecendo no Brasil. Eu acho que é das coisas mais interessantes e mais positivas que vêm acontecendo no nosso país nos últimos anos.

Então eu não acho difícil. Eu acho difícil quando você vai trabalhar esses temas do ponto de vista ideológico ou da grande política. Quando você traz para o cotidiano, não acho tão difícil assim.

O grupo no poder hoje, representado pelo PT, que já teve Lula e hoje tem Dilma, explora muito e com eficácia o fato de esse grupo político que comanda o país ter introduzido essa mudança e ter resgatado as pessoas de uma classe social menos favorecida para uma classe social média emergente. Você está me dizendo que a ideia é sequestrar essa ideia e dizer: “Olha, não é assim. Não foi o PT. Não foi o Lula. Não foi a Dilma. Foi você que andou para frente”. É isso?
Só que não é sequestrar essa ideia. É claramente...

Sequestrar a ideia, reformatar e dizer: “Olha ela de outro jeito”. É isso?
Mas por que reformatar? Claramente há um contraste entre quem acha que o sujeito protagonista da mudança é partido, é o governo e quem acha que o sujeito da mudança e do progresso é o cidadão e o indivíduo. São simplesmente maneiras distintas de você ver a coisa que eu acho que é exatamente uma outra virtude dessa mensagem, porque ela claramente distingue. Você tem visões diferentes e distingue a partir de coisas que são verdadeiras porque, não tivesse o PSDB algo a ver com isso... E tem. Se tem exatamente algum componente liberal na visão, particularmente da economia que o PSDB tem, está claramente manifesto nessa ideia. E, por outro lado, tem uma conexão com que está acontecendo no país recentemente.

Renato, você acredita mesmo que a maioria do eleitorado hoje já enxerga o Estado desse jeito, mais distante e não tão como o senhor provedor de tudo no Brasil?
É que eu não recorto o problema dessa maneira. Eu acredito que a população brasileira, boa parte do eleitorado brasileiro, particularmente da assim chamada nova classe média brasileira tem uma profunda convicção de que está conseguindo mudar de vida porque está ralando, porque está trabalhando, porque está se esforçando para isso. Ela tem consciência de que o seu esforço está sendo recompensado. Isso ela tem. E é partir daí que a gente está falando. Então, não era necessariamente você [dizer] que: “Ah, o cidadão médio brasileiro não valoriza tanto o papel do governo”. Claro que valoriza. E a gente valoriza também. Só que a gente está dizendo que o papel do governo é ser um parceiro seu. O papel do governo é te dar as condições para que você tenha sucesso do seu jeito. É oferecer infraestrutura de qualidade, é oferecer educação de qualidade, é administrar a economia com competência. A gente dá as condições, mas o sujeito da mudança do progresso é você. Não sou eu que te guio.

É muito importante na composição dessa narrativa política o candidato, o político em si que vai representar isso. Então, nós teremos alguns candidatos a presidente no ano que vem. O senador Aécio Neves, do PSDB de Minas, deve ser um deles. Há, a respeito do senador Aécio Neves, ao longo dos últimos anos, uma tentativa dos adversários de desqualificá-lo como [não] sendo uma pessoa com o perfil de um presidenciável. Volta e meia na oposição, fala-se que ele, em vez ficar mais em Minas Gerais, fica mais no Rio de Janeiro, que não é uma pessoa que estaria preparada para trabalhar duro como presidente. Na internet você encontra vídeos do senador com os amigos em bares no Rio de Janeiro. Esse aspecto da personalidade do senador, ou da forma como querem retratá-la, não prejudica na campanha do ano que vem?
Eu acho que isso tem um efeito bastante limitado. Vou te dizer por que. Primeiro porque não é plenamente verdadeiro. Acho que você tem uma liderança política brasileira com uma gestão admirável em Minas Gerais. Então ele tem um legado efetivo como gestor. Ele foi governador  de Minas duas vezes. Teve essa experiência. Pegou Minas como um Estado praticamente falido. E conseguiu implementar muitos dos princípios que a gente está dizendo que tem uma agenda mais liberal em relação a economia. Ele colocou em prática em Minas e conseguiu resgatar Minas Gerais. Tanto nos fundamentos da gestão, quanto na dimensão social e econômica e na força política de Minas também no país.

Então acho que ele teve uma gestão admirável e respeitada, enfim, não só no país, como fora do país. Acho que isso é um atributo importantíssimo quando se vai discutir qual é a capacidade do senador Aécio Neves de se transformar no presidente da República. Ele foi um excelente governador de Minas. E Minas tem conexão como o Brasil real, que é um Estado muito diverso, é o Estado com mais municípios num país que tem realidades muito diferentes. Se você vai para o Triângulo Mineiro ou se vai para o Vale do Jequitinhonha, enfim, você tem toda essa diversidade, essa desigualdade típica nesta complexidade típica do país. Primeiro ponto.

Segundo: Do ponto de vista pessoal, você tem um candidato leve, com espírito jovem, capaz de se comunicar muito bem, capaz de chegar ao nível de proximidade das pessoas e conversar com intimidade, com naturalidade. Enfim, a gente acabou de fazer um programa. Se tem uma coisa, aliás, que diferencie a gente um pouquinho em relação a outras escolas de comunicação brasileira é: a gente raramente usa teleprompter. Então a gente acabou ter um programa ontem [19.set.2013] na televisão pela segunda vez em que o senador Aécio Neves está falando espontaneamente o tempo inteiro. Então, as ideias, os princípios ali são verdadeiros, são coisas que ele pensa, coisas que ele acredita. E ele se comunica muito bem, espontaneamente bem. E, aliás, em qualquer pesquisa qualitativa que você faça, a maneira dele falar com as pessoas, ele parece gente como a gente, parece povão, parece pessoa próxima. E isso faz muita diferença.

Mas, nesse aspecto então, a vida pessoal dele, você acha que não terá impacto significativo na campanha?
Acho que não terá impacto significativo na campanha.

No que diz respeito a ele estar próximo das pessoas e as pessoas se identificarem. Nesse caso, por exemplo, há uma pré-candidata à presidente no ano que vem que é a ex-senadora Marina Silva que, ela sim, tem uma identificação muito grande com as classes menos favorecidas pela sociedade pela origem própria que ela tem. Nesse caso, ela não está mais  apetrechada do que o senador Aécio para se identificar com as pessoas?
Olha, eu tenho um profundo respeito pela figura da Marina Silva e pela trajetória dela em particular. Mas, se você considerar o perfil do eleitor da Marina Silva hoje é exatamente o oposto. Quem vota na Marina Silva é exatamente o cidadão de mais poder aquisitivo e mais instrução. A intenção de voto dela varia positivamente na proporção que você sobe de renda e sobe instrução. É claro que ela pode até se popularizar. Mas, na verdade, o eleitor mais típico dela é o eleitor bem formado e com poder aquisitivo alto.

No programa do PSDB nacional semestral desse segundo semestre que foi ao ar no dia 19 de setembro, em alguns momentos aparecem obras do governo federal que não foram executadas. A ideia é colar ou contrastar um pouco a imagem de competência ou incompetência gerencial no atual governo federal?
Eu acho que a ideia é o exercício de uma candidatura de oposição. Você tem que mostrar o que não está dando certo hoje. Uma das coisas que não está dando certo hoje são obras de infraestrutura que, quando existem, em sua maior parte, ou estão incompletas, ou foram abandonas, ou custam muito mais caro do que o planejado.

Em que medida essa, se for percebido assim, incompetência administrativa gerencial do governo Dilma ajuda a campanha da oposição?
Ajuda porque você tem aí, mais uma vez, um contraste.

Mas há mesmo essa incompetência?
Olha, você tem obras de infraestrutura... Primeiro você tem algumas obras de infraestrutura importantes que estão pela metade, para sair há muito tempo. Obras como a transposição do Rio São Francisco, ferrovias no Nordeste que estão para acontecer há muito tempo e estão pela metade...

Como é que se refere a isso na propaganda para o eleitor entender?
Como nós mostramos ontem. Você tem uma obra que é importante, só que já era para ter sido inaugurada em 2010. Nós estamos em 2013. Não só ela não foi inaugurada, como ela está deteriorada e, pelo fato de estar deteriorada, vai custar muito mais caro porque você vai ter que refazer toda uma parte dessa obra para poder entregá-la a tempo. Além disso, você tem toda uma agenda de obras que nunca foram sequer iniciadas. Então, os déficits de infraestrutura do país são muito importantes. Não apenas para os brasileiros, que não conseguem aí desenvolver, ter emprego, ou desenvolver as suas próprias empresas, ou seu próprio negócio, mas o próprio país, que perde competividade internacional porque os seus produtos custam muito mais caro por conta dos déficits crônicos de infraestrutura que o país apresenta até hoje.

O eleitor fica ofendido quando o candidato, seja de oposição ou não, aponta para o outro e diz: “Veja a incompetência de fulano de tal, que não terminou essa obra”. Ele gosta? Não gosta? Como se trata esse tipo de crítica?
Fernando, tem uma diferença aí muito importante. Acho que o eleitor brasileiro não gosta é quando você fulaniza a discussão. Então, quando você começa a criticar pessoalmente, colocar o dedo na cara e dizer “a culpa é sua”, “a responsabilidade é de não sei quem” etc., esse tipo de crítica ácida, pessoal, mais contundente é uma coisa que normalmente incomoda o eleitor brasileiro. Agora, a discussão de políticas públicas: “isto aqui não está funcionando por responsabilidade...”...

Mas fica o sujeito oculto assim?
De jeito nenhum.  Não está funcionando hoje por conta do governo. De um governo que é comandado por um partido político que é o PT, certo? Então imagina. De modo algum. Mas a outra coisa é quando você vai para o exercício da política como ela é feita em geral no teatro político. Quando você vai para o Congresso Nacional, quando você vai para a arena política stricto sensu, normalmente a discussão é muito fulanizada. Você se refere ao seu adversário o tempo inteiro nominalmente, ao partido, não é? O objeto da crítica em geral é muito pessoal, certo? Quando você sai da arena política stricto sensu e vai para a eleitoral é muito que, na verdade, você traduza isso para a discussão das políticas. Muito menos do que para a discussão pessoal. Quando você vai para a discussão pessoal, você acaba criando obstáculos importantes para a comunicação com o eleitor.

É por isso que o senador Aécio Neves na propaganda vai falar “a administração do governo federal, a administração do PT”, e não vai dizer “a presidente Dilma deixou essa obra se deteriorar”?
Em geral, sim. Pode até falar. Mas você tem uma diferença de ênfase que é importante. Você não fulanizar é muito importante. E vice-versa. Para a candidatura da situação também. Você ficar nominando os seus adversários te dá um tom agressivo desnecessário e que acaba incomodando o eleitor.

Mensalão, que impacto vai ter no ano que vem na eleição?
Não creio que tenha muito impacto, assim como já não teve no passado. A gente acabou de sair de uma eleição, em 2012, em que se teve todo o teatro, no bom sentido da palavra, mas todo o drama público do julgamento, acontecendo diante da televisão, e eu não vi nenhuma candidatura do PT sendo prejudicada por conta disso.

Ou seja, o mensalão não tem impacto significativo no ano que vem?
Na minha opinião, acho que tem uma sobrevalorização enorme em relação a isso. E basta você ver a experiência recente. Lembre de 2012, não teve um impacto tão grande assim.

Isso significa que talvez seja ineficaz a candidatura da oposição, no caso do PSDB, citar o caso do mensalão, portanto?
Você tem distinções aí. O mensalão é um episódio importante para o país, tanto em relação ao passado recente do país como também que país você quer.

Mas é um tema que merece estar na propaganda do PSDB, do senador Aécio Neves?
Se você pensar no efeito estritamente eleitoral, talvez não, mas como eleição não é feita apenas de temas que têm um efeito específico eleitoral, é feita também de valores, de princípios.

Mas hoje, olhando hoje, vai ter algum programa em que o senador Aécio Neves vai falar: veja o caso do mensalão...
Fernando, é muito cedo pra dizer isso. O que eu consigo te de dizer é que, na minha opinião, não é um tema particularmente relevante para o eleitor brasileiro. E, como ponto de prova, só lembrar 2012.

Ou seja, portanto a tendência seria não utilizar na campanha?
Não posso dizer isso, porque como eu te disse, uma campanha não é feita só de temas que têm ume relevância eleitoral. Você tem questões de princípios também que muitas vezes são importantes de se manifestar, independente do peso eleitoral que possa vir a ter ou não.

Mas o que pode ser dito hoje então sobre o uso ou não do mensalão?
Que é muito cedo. Posso dizer que...

É muito cedo pra dizer se o mensalão vai ser ou não vai ser usado na campanha?
Muito cedo, muito cedo.

Há também acusações nesse campo de corrupção contra o PSDB também. Há um caso que vai, em tese, algum dia ser julgado no Supremo, que é o chamado mensalão mineiro. Há um caso recente agora de cartel de empresas que vendem trens para o metrô, e que envolve alguns governos do PSDB. Esses casos acabam se neutralizando e, no final, não têm impacto significativo?
Olha, eu nunca avaliei especificamente se eles acabam se neutralizando, então é uma hipótese a se testar. O que até hoje eu realmente avaliei objetivamente é, particularmente, o impacto do mensalão sobre as eleições e sobre o comportamento, a decisão do voto do eleitor. Então, na sua maioria, se tirando um eleitor de classe média mais alta, que já tem uma visão sobre a política muito crítica, tirando esse eleitor, em geral esses temas não têm uma penetração tão grande assim.

Se a eleição fosse hoje, que tipo de abordagem se daria para esse tema? Teria que ser dada, teria que falar desse tema?
Acho que você tem que falar desse tema porque é um tema presente, é incontornável, faz parte do cenário político atual. Além disso, eu acho que ele tem algum significado em relação ao projeto de país que você tem. Acho que uma das questões importantes do Brasil é a impunidade. Então esse é um tema relevante do ponto de vista dos princípios? É relevante. Então por isso é meio incontornável que o tema apareça, mas não por seu peso eleitoral, o peso eleitoral acho que é reduzido.

Pelas suas análises, pesquisas, do eleitorado, quais dos nomes que têm sido citados como pré-candidatos a presidente serão competitivos em 2014?
Acho que temos quatro candidatos competitivos em 2014. Temos Dilma, temos Aécio, temos Marina e temos Eduardo.

Joaquim Barbosa, se viesse a ser candidato, seria competitivo?
Não creio.

José Serra, se viesse a ser candidato, seria competitivo?
Mais difícil de responder a essa pergunta. Se você considerar aspectos das últimas pesquisas, que a gente tem, mais difícil responder. Talvez fosse.

Lula, que ainda é sempre uma possibilidade de voltar a ser candidato no lugar da presidente Dilma, pelo PT, seria um incômodo maior para a oposição?
Acho que o Lula tem mais força eleitoral do que a presidente Dilma, eu não tenho a menor dúvida. Então, respondendo à tua pergunta, sim.

Se Lula fosse candidato, seria mais difícil vencer a eleição?
Eu acho que sim, acho que o Lula, se você coloca o Lula, é só ver as últimas pesquisas agora, nos cenários em que foi colocado o presidente Lula, pelo Datafolha, ele tinha um desempenho, saía melhor que a presidente Dilma. Então, é um candidato com mais força eleitoral aparente do que a presidente Dilma.

Então o PSDB vai torcer pra não ter Lula como candidato?
Não, acho que o PSDB tem que jogar contra quem tiver que jogar.

O PSDB é um partido, não é novidade, como todos os outros, com as suas idiossincrasias e divisões internas. Eu citei o ex-governador, ex-prefeito, ex-senador José Serra, que não esconde o seu incômodo no momento atual dentro do PSDB. Ele gostaria de ser candidato, dá mostras disso. Se Serra ficar no PSDB, não sair, não for candidato, e não ajudar na campanha de Aécio, isso vai atrapalhar? Sim ou não, em que medida?
Fernando, esse é o tipo da questão que eu realmente tenho dificuldade em responder, porque eu não tenho um conhecimento interno do PSDB, mínimo que seja.

Mas e do ponto de vista do eleitor, se Serra se engaja na campanha de Aécio e percorre o Brasil, ou São Paulo, e realmente entra na campanha, ele ajuda?
Eu nunca testei essa hipótese objetivamente, até agora, em termos de investigação de pesquisa e tal, mas creio que sim, porque você tem um partido mais unido, com as suas forças trabalhando lado a lado, imagino que sim. Mas para te responder objetivamente teria que avaliar esse cenário, coisa que eu ainda não fiz.

Mas, com a potencialidade do voto de cada um, o que que seria possível projetar com o seu conhecimento, embora não tenha ainda investigado?
Não consigo projetar isso agora com clareza de jeito nenhum.

Se ele vier a ser candidato por outro partido, é bom ou ruim para o cenário eleitoral do ano que vem, pra oposição?
Acho que pra oposição, como um todo, quanto mais nomes você tiver capazes de atrair o eleitor para uma alternativa de oposição, melhor. Não é à toa que quem está no governo hoje, o PT, tem procurado exatamente evitar ter muitas candidaturas de oposição. Então isso é uma coisa matemática mesmo. Quanto mais candidaturas de oposição você tiver, mais chance você tem de ter segundo turno, mais chance você tem de ter mais votos no campo de oposição.

Mas no caso de José Serra, que também hoje é tucano, essa diáspora no PSDB, eventual, um sendo candidato por um partido, outro ficando no PSDB, no caso, Aécio, aí essa vantagem matemática também é benéfica pra oposição?
Para a oposição ou para o PSDB?

Pro PSDB e pra oposição em geral.
Olha, pra oposição em geral, aí, num raciocínio puramente matemático, diria que sim, independente se você me perguntar não só do Serra, colocar uma outra figura da oposição de outro partido. Bom, se o PPS quiser ter candidato próprio, se outro partido que está no campo da oposição agora resolver ter candidato próprio. Isso é positivo? Bom, se são candidatos que têm algum tipo de nicho eleitoral minimamente relevante, claro que sim, porque você tende a garantir mais votos para a oposição.

Mas para o PSDB em particular?
Pro PSDB eu acho que na verdade aparecer como um partido que está unido é mais positivo do que ter líderes que são importantes trabalhando em partidos separados. Acho que pro PSDB, tenho a impressão que é melhor que esteja todo mundo junto no mesmo barco.

Tem sido comum nas eleições no Brasil temas de caráter moral, religioso, o debate às vezes fica impregnado por isso, como aborto, drogas, casamento gay. É inevitável que esses temas sempre apareçam nas eleições?
Não tenho a menor dúvida disso, é completamente inevitável. Primeiro porque você tem segmentos importantes da sociedade brasileira com uma agenda clara em relação a esses temas, acho que uma das mudanças sociais importantes que aconteceram no Brasil nos últimos anos, praticamente nos últimos 20 anos, é a emergência do segmento evangélico. Você tem um contingente hoje muito importante de brasileiros que professam religiões pentecostais, e isso é importante, para boa parte delas, a agenda que tem a ver com comportamento moral é particularmente relevante. Então, é normal que assim seja.

Além disso, você ainda tem todo o jogo habitual de uma eleição, em que muitas coisas são feitas de modo oportunista para trazer temas como esse e colar no adversário. Infelizmente isso faz parte do jogo também. Por isso que eu acho inevitável que isso vá acontecer novamente. Mesmo em eleições municipais e estaduais isso acaba acontecendo, o que dirá na eleição presidencial.

Então esses temas estarão presentes de novo?
Estarão presentes de novo.

Não é um debate às vezes reducionista esse?
Totalmente.

Como fazer para os principais candidatos tentarem tanger um pouco isso daí, não deixar que isso domine o debate sucessório?
Não sei, Fernando, mas assim, é difícil, porque na hora da disputa mesmo, em que o calor aumenta, acho difícil ter qualquer nível de compromisso entre as candidaturas, de tratar isso de maneira... Eu diria assim, teoricamente, a melhor maneira de fazer isso é você... tratando isso exatamente de acordo com o que você de fato acredita. É trazer o debate como ele é, o que muitas vezes acontece é que você acaba tendo uma distorção, tendo os  candidatos tendo vários passos atrás em relação a declarar o que realmente pensa em relação a temas como esse com medo de ofender A, B ou C.

Não vai ser diferente agora né.
É, por isso que eu acho também que é um pouquinho inevitável que assim seja.

A lei eleitoral no Brasil obriga aos candidatos todos que eles sejam convidados por emissoras de TV se querem fazer debates. Todos os candidatos cujos partidos têm representação no Congresso Nacional. Isso, nas eleições recentes, sobretudo em reeleições, tem produzido um cenário no qual o candidato que é o governante, em geral fica lá no topo das pesquisas, e se recusa a fazer debate no primeiro turno. Então é provável que, no ano que vem, 2014, a presidente Dilma Rousseff considere a possibilidade de não aceitar convites para debater no primeiro turno. Isso poderia ser contornado com um debate na internet dos principais candidatos, porque a lei permite. O sr. acredita que haverá ou não debate no primeiro turno?
Eu acredito que haverá, porque eu tenho a impressão de que a equipe da presidente Dilma vai compreender que será um erro mais grave do que no passado evitar debate no primeiro turno. Uma coisa é você ir a todos os debates, é perfeitamente compreensível que você não vá a todos os debates, até porque senão você não faz outra coisa a não ser ir a debate. Tem convite o tempo inteiro. Mas participar de debates do primeiro turno, no momento em que o Brasil, cada vez mais, tem a sua população querendo participar, conversar, ser ouvida, poder influenciar o rumo dos acontecimentos, você querer dizer “não debatam no primeiro turno”, acho difícil.

Na internet seria uma opção fazer só com os dois ou três primeiros colocados?
Seria, mas eu tenho assim... Se tivermos aí quatro ou cinco candidatos mais competitivos, acho que até cinco dá pé, com quatro particularmente, então se você considerar aí Dilma, Aécio, Marina, Eduardo, quatro candidatos, você consegue ter um bom debate entre quatro candidatos. Quando você vai pra seis, sete, aí a história começa a ficar esquisita.

Nesse caso, como já tem quatro, são três contra um em geral, porque é um do governo e três contra. Então quem está no governo vai sempre argumentar, “olha, eu vou ficar em desvantagem enorme, se tiver quatro ou cinco candidatos, pra que que eu vou num debate desses?”.
Bom, aí é uma desigualdade totalmente circunstancial porque a desigualdade real é a desigualdade de tempo de televisão entre a situação e todas as forças de oposição, entre as verbas de comunicação de quem está na situação pra oposição, então a desigualdade é muito mais na direção oposta do que nessa. Agora, meu ponto não é esse não. Eu acho que, no momento que a gente está vivendo, imaginar que você pode ter uma figura como um presidente evitando qualquer debate no primeiro turno sem que isso lhe crie problemas, acho difícil que a equipe de comunicação da presidente vá recomendar uma história dessas. Eu tenho essa impressão.

Renato, quem vai ganhar a eleição pra presidente ao no que vem?
Não sei. Acho que a gente vai ter uma eleição bastante competitiva.

Como é que você acha que os candidatos competitivos chegam ao final do primeiro turno, na faixa de pontuação?
Também é difícil imaginar, mas eu tenho a convicção de que a gente vai ter um segundo turno entre Aécio Neves e Dilma Rousseff.

E quem fica em terceiro?
Muito difícil. Muito difícil. Não sei te responder essa pergunta. Aí é puro chute. Não sei. Acho que pode ser Marina, acho que pode ser Eduardo.

Tá imprevisível.
Acho muito difícil de prever. Não me arriscaria a essa previsão, não.

Renato Pereira, publicitário, responsável pelo marketing do PSDB, muito obrigado.
Eu que agradeço.