Pela 1ª vez, Forças Armadas reconhecem violações na ditadura, diz coordenador da CNV
O advogado Pedro Dallari, coordenador da Comissão Nacional da Verdade (CNV), afirmou em entrevista por telefone ao UOL nesta terça-feira (1º) que a decisão do Exército, Marinha e Aeronáutica de abrir sindicâncias para investigar a prática de crimes em seus estabelecimentos (veja os locais na tabela abaixo) durante o regime militar é um fato inédito e representa o reconhecimento das Forças Armadas de que os militares cometeram violações.
“Essa iniciativa é um fato inédito na história das Forças Armadas, que nunca haviam se predisposto a fazer esta investigação. É um gesto de reconhecimento de que graves violações de direitos foram uma realidade nesses estabelecimentos. As Forças Armadas entenderam que precisam contribuir com a sociedade no esclarecimento do que ocorreu”, disse Dallari.
A reportagem procurou as assessorias de comunicação do Exército, Aeronáutica e Marinha e os questionou se a abertura de sindicâncias representa o reconhecimento dos crimes cometidos na ditadura. Apenas a Aeronáutica e Marinha respondeu à indagação de maneira semelhante. “A Sindicância é um processo administrativo interno que visa à apuração dos fatos em sua amplitude, sem prévio conhecimento do resultado. Dessa forma, qualquer apontamento antecipado, seria mera especulação."
Nesta terça-feira, o ministro da Defesa, Celso Amorim, comunicou ao coordenador da CNV a abertura das sindicâncias nas Forças Armadas. A abertura dos processos de apuração foi solicitada pela comissão ao ministro em 15 de fevereiro. Quatro dias depois, Amorim encaminhou o requerimento aos comandos das três forças.
O Exército informou em 25 de março ter aberto a sindicância e, um dia antes, afirmou que buscará as informações disponíveis nos "órgãos de direção setorial" e junto aos comandos militares de área. A corporação prometeu conduzir as diligências necessárias solicitadas pela CNV. O responsável pela investigação será um oficial general do Estado-Maior do Exército.
Segundo o Minstério da Defesa, a Marinha e a Aeronáutica responderam ao requerimento ontem (31). O comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, designou por portaria o major-brigadeiro do ar Raul Botelho, comandante do Terceiro Comando Aéreo Regional (III Comar, Rio de Janeiro) como o encarregado da sindicância.
Sem detalhes
Nos ofícios trocados pelas forças, Ministério da Defesa e CNV não se detalha como serão feitas as investigações. A pasta apenas informa que as sindicâncias serão feitas a partir das regras estabelecidas pelas próprias forças.
O Exército informou à reportagem que a sindicância será concluída em 30 dias, contados a partir de 24 de março, prorrogáveis por mais 20 dias. A Aeronáutica também informou que a sindicância será finalizada em 30 dias.
A reportagem pediu às três forças detalhes sobre os procedimentos investigativos, mas não obteve informações.
“Sensibilidade social”
Para Dallari, a pressão decorrente da “sensibilidade social”, em função dos 50 anos do golpe, provocou a mudança de postura dos militares. Na avaliação do jurista, “as Forças Armadas estão percebendo que a sociedade está sensível, impactada, e que não se pode mais dizer ‘nada a declarar’” sobre os anos de chumbo.
O coordenador da CNV disse que, até então, a colaboração das forças se dava de maneira passiva, em resposta a demandas enviadas pela comissão, e que agora passará a ser ativa. Dallari espera que as sindicâncias esclareçam fatos e ajude a CNV com novos elementos para a produção do relatório final, que deverá ser concluído em dezembro deste ano.
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