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Lava Jato: acusações contra mulher de Cabral beiram o "preconceito de gênero", diz defesa

29.mar.2017 - Adriana Ancelmo chega em casa após ter prisão domiciliar autorizada - Armando Paiva/AGIF
29.mar.2017 - Adriana Ancelmo chega em casa após ter prisão domiciliar autorizada Imagem: Armando Paiva/AGIF

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

18/08/2017 04h00

A defesa de Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) e ré junto com ele na ação penal da Operação Calicute, um dos desdobramentos da Lava Jato no Rio de Janeiro, afirmou à 7ª Vara Federal Criminal, por meio de suas alegações finais, que os argumentos da acusação são baseados em "uma posição retrógrada", "beirando o preconceito de gênero".

Na versão dos advogados, a acusação estaria fundamentada no simples fato de Adriana ser casada com o ex-chefe do Executivo fluminense. "A denúncia sequer rememora ter sido Adriana sócia de escritório de advocacia e que exercia de forma competente, lícita e regular a profissão", afirma a defesa.

"Por certo, a circunstância objetiva de alguém ser cônjuge ou companheiro não se revela suficiente, por si só, a autorizar qualquer presunção de culpa."

Adriana era proprietária da Ancelmo Advogados, escritório que representava clientes poderosos, como a concessionária do metrô do Rio (Metrô-Rio) e a CEG (Companhia Estadual de Gás), entre outros. Depois que as investigações da Lava Jato avançaram sobre o casal Cabral, a Ancelmo Advogados acabou perdendo contratos e encerrando suas atividades.

A ex-primeira-dama do Estado responde por lavagem de ativos e pelos crimes de quadrilha e pertinência a organização criminosa. De acordo com a denúncia, ela adquiriu joias e pedras preciosas e utilizou contratos de seu escritório a fim de tornar lícito o capital da propina obtido pela suposta quadrilha encabeçada por Sérgio Cabral, narra o MPF (Ministério Público Federal).

Além de alegar inocência e pedir a absolvição ao juiz Marcelo Bretas, a defesa requer o reconhecimento de incompetência para "processar e julgar o feito" --isto é, o afastamento da 7ª Vara Federal Criminal--, e questiona a legalidade das provas apresentadas pela Procuradoria da República do RJ.

Os advogados reclamam ainda de cerceamento de defesa por supostamente não terem tido acesso aos autos de delações premiadas no devido tempo em que elas ocorreram. E cobram a extinção da ação penal, uma vez que Adriana já foi absolvida, em primeira instância, em outro processo no qual responde por lavagem de dinheiro.

"(...) os fatos sub judice são correlatos àqueles que já foram julgados pela 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR", argumenta a defesa, em referência à decisão do juiz Sergio Moro.

Citação de Quincas Borba

Ao sustentar a tese de que a criação da força-tarefa da Lava Jato no Rio corresponderia à "designação de procuradores de exceção", a defesa de Adriana Ancelmo afirma que a Constituição não permite "leitura de exceção, a depender do freguês".

Na argumentação, os advogados da mulher de Cabral citam um trecho de uma das obras mais famosas de Machado de Assis. "O inigualável 'Bruxo do Cosme Velho', em Quincas Borba, sentenciou: 'Tão certo é que a paisagem depende do ponto de vista, e que o melhor modo de apreciar o chicote é ter-lhe o cabo na mão'."

A defesa menciona, em seguida, uma entrevista do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio de Mello para dar sentido à metáfora.

"Da literatura para o pretório, que se aplica à instituição MPF, a suma pontuada em tantos votos e entrevistas pelo ministro Marco Aurélio: ‘Nós, magistrados, não somos legisladores, não somos justiceiros’, disse. ‘O chicote muda de mão. Não se avança atropelando regras básicas’."