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Segunda instância amplia pena de Dirceu para 30 anos e absolve Vaccari

Bernardo Barbosa e Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

26/09/2017 10h52Atualizada em 26/09/2017 15h20

O TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região, a segunda instância da Lava Jato, manteve a condenação do ex-ministro José Dirceu (PT) pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa, e ainda aumentou a pena de prisão para 30 anos e 9 meses, em julgamento concluído nesta terça-feira (26).

Também tiveram as condenações confirmadas o ex-diretor da Petrobras Renato Duque, o ex-vice-presidente da Engevix Gerson de Mello Almada e Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, irmão do ex-ministro. Já o ex-tesoureiro do Partido dos Trabalhadores João Vaccari Neto foi absolvido por insuficiência de provas, por dois votos a um.

Dirceu, que saiu da prisão em maio após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), tinha sido condenado pelo juiz Sergio Moro a 20 anos e dez meses na prisão na primeira instância. O ex-ministro tem negado todas as acusações. Neste processo, ele é acusado de ter recebido cerca de R$ 15 milhões em propina da empreiteira Engevix. Os pagamentos teriam ligação com contratos da construtora com a Petrobras obtidos via licitações fraudulentas e, segundo a sentença, foram feitos sob a fachada de consultorias supostamente nunca prestadas por Dirceu.

Com a condenação confirmada, Dirceu pode ser preso novamente --mas a decretação da detenção não é obrigatória. Na primeira instância, a defesa do ex-ministro pediu sua absolvição devido à ausência de provas das delações premiadas de outros réus da ação penal, alegando contradições entre as colaborações usadas na acusação.

Segundo a assessoria do TRF-4, a execução das penas dos condenados poderá ser iniciada após os julgamentos dos recursos dos réus ainda na segunda instância. No caso de Dirceu, esse prazo é de dois dias porque só cabem embargos de declaração, recurso em que a defesa pede para que o juiz observe possíveis erros e omissões na sentença.

O ex-ministro, que já foi condenado e cumpriu pena por envolvimento no mensalão, tem uma segunda condenação proferida por Moro (a 11 anos e 3 meses de prisão) e ainda é alvo de uma terceira denúncia do MPF (Ministério Público Federal) que, até o momento, não foi aceita pelo juiz. Todos os processos ocorrem no âmbito da Operação Lava Jato.

Pena “exagerada” tem valor mais simbólico do que jurídico, diz defesa de Dirceu

O advogado Roberto Podval, que defende Dirceu, disse que ainda aguarda íntegra dos votos dos desembargadores. “No julgamento, nós ouvimos apenas de forma resumida”.

Podval avalia que a pena de 30 anos “é menos ruim” que a desejada pelo desembargador João Pedro Gebran Neto, que relata os processos da Lava Jato no TRF. O desembargador queria uma pena de 41 anos para o ex-ministro, mas não foi acompanhado por seus dois colegas da 8ª Turma.

Para o advogado, a pena, “exagerada”, teve um valor “mais simbólico” do que jurídico. Após conhecer a íntegra dos votos, ele disse que irá apresentar o embargo de declaração, na tentativa de impedir a volta de Dirceu para a prisão.

Segundo Podval, o ex-ministro já sabe da sentença e disse que ele está “aguardando o andamento do processo”. O advogado também defende Luiz Eduardo de Oliveira e Silva, irmão de Dirceu e condenado nesta ação penal.

Ex-tesoureiro do PT tem segunda absolvição

Esta é a segunda absolvição de Vaccari pelo TRF-4 em processos da Lava Jato. Nesta ação, ele era acusado de corrupção passiva por ter participado do repasse de R$ 46,4 milhões em propinas derivadas de contratos da Petrobras para o grupo político de Dirceu. O ex-tesoureiro do PT está preso preventivamente, por ordem de Moro, desde abril de 2015.

Na primeira instância, sob Moro, Vaccari foi condenado em cinco ações penais da Lava Jato, é réu em outras três e ainda é alvo de uma denúncia do MPF (Ministério Público Federal), que até o momento não foi aceita pelo juiz.

Condenado 5 vezes por Moro, Vaccari (foto) já foi absolvido 2 vezes no TRF-4 - Paulo Lisboa/Folhapress - Paulo Lisboa/Folhapress
Condenado 5 vezes por Moro, Vaccari (foto) já foi absolvido 2 vezes no TRF-4
Imagem: Paulo Lisboa/Folhapress

A absolvição só permitiria que o petista deixasse a cadeia caso houvesse mandado de prisão atrelado ao caso. "Ele segue preso, pois neste processo não havia decretação de prisão. Estamos com habeas corpus no STJ [Superior Tribunal de Justiça]", disse o advogado Luiz Flávio Borges D’Urso, que defende Vaccari.

Em nota, D’Urso disse “que a Justiça decidiu corretamente”. “Tanto a denúncia, como também a sentença recorrida, tiveram por base exclusivamente palavra de delator, sem que houvesse nos autos qualquer prova que pudesse corroborar tal delação”. 

D’Urso diz que “as informações trazidas por delator não são provas, carecendo, pois, de investigação”. “Assim, a palavra de delator deve ser recebida com muita reserva e total desconfiança, pois aquele que delata, o faz para obter vantagem pessoal, que pode chegar ao perdão judicial”.

Confira como ficaram as penas:

  • José Dirceu: corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A pena passou de 20 anos e 10 meses para 30 anos, 9 meses e 10 dias;
  • João Vaccari Neto: denunciado por corrupção passiva. A pena era de 9 anos, mas o ex-tesoureiro foi absolvido, por maioria, pela 8ª Turma, por insuficiência de provas;
  • Renato Duque: corrupção passiva. A pena foi aumentada de 10 anos para 21 anos e 4 meses;
  • Gerson de Mello Almada: corrupção ativa e lavagem de dinheiro. A pena passou de 15 anos e 6 meses para 29 anos e 8 meses de detenção;
  • Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura: corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A pena passou de 16 anos e 2 meses para 12 anos e 6 meses de reclusão;
  • Julio Cesar dos Santos: lavagem de dinheiro. A pena passou de 8 anos para 10 anos, 8 meses e 24 dias de detenção;
  • Roberto Marques: pertinência em organização criminosa. A pena passou de 3 anos e 6 meses para 4 anos e 1 mês;
  • Luiz Eduardo de Oliveira e Silva: lavagem de dinheiro. A pena passou de 8 anos e 9 meses para 10 anos, 6 meses e 23 dias de detenção;
  • Cristiano Kok: absolvido em primeira instância, teve a absolvição confirmada;
  • José Antunes Sobrinho: o MPF apelou pedindo a condenação após absolvição em primeira instância. A turma manteve a absolvição.

Entenda aumento da pena

O aumento da pena de Dirceu e de outros réus do processo ocorre porque a 8ª Turma entendeu que deveria ser aplicado o chamado concurso material nos crimes de corrupção. Com isso, os crimes do mesmo tipo deixam de ser considerados como um só (o que é chamado de continuidade delitiva) e passam a ser somados. 

O julgamento no TRF-4, iniciado no dia 13 de setembro, teve pedido de vista do desembargador federal Victor Luiz dos Santos Laus devido à alegação da defesa de que teria “havido deslealdade processual”, mas ele concluiu que a denúncia do MPF "foi devidamente instruída e o contraditório foi oferecido desde 2015, com disponibilidade dos documentos que de fato fundamentaram a acusação, não havendo perda para a defesa". 

21.jul.2017 - Os desembargadores da 8ª Turma do TRF4, da esquerda para a direita: João Pedro Gebran Neto, Victor Laus e Leandro Paulsen. A turma julga processos da Operação Lava Jato em segunda instância - Arte/UOL - Arte/UOL
Os desembargadores Gebran (à esquerda), Laus (centro) e Paulsen
Imagem: Arte/UOL

Antes, os desembargadores Gebran e Leandro Paulsen já haviam votado para manter a condenação de Dirceu e ampliar sua pena.

Segundo Gebran, a defesa de Dirceu não apresentou justificativa plausível para os recursos recebidos por meio de contratos de consultoria que, de acordo com a acusação, serviram apenas para o recebimento de propina.

Já para Paulsen, a defesa não teve sucesso em “descaracterizar a acusação”, enquanto a versão dos operadores e delatores Milton e José Adolfo Pascowitch “ganha força” por meio de provas documentais.

Laus, por sua vez, entendeu que Dirceu tinha maus antecedentes e por isso pediu uma pena de 30 anos e 9 meses. Foi seguido por Paulsen, que em um primeiro momento havia votado por uma pena de 27 anos e 4 meses.

O que dizem as defesas

O advogado de Renato Duque, Roberto Brzezinski Neto, afirmou que ainda não teve acesso à decisão e que não irá fazer comentários a respeito. A assessoria do TRF-4 explica que acórdão e votos devem ser disponibilizados nos próximos dias, já que os desembargadores fazem ajustes antes da publicação.

A defesa de Júlio Cesar dos Santos teve a mesma posição da de Duque. “Sequer tive acesso aos votos”, disse o advogado Rodrigo Bandieri. Para ele, houve uma falta de isonomia na decisão do TRF. Ele justifica sua visão a partir da absolvição do ex-tesoureiro do PT em função de as acusações terem sido feitas por delatores. “A absolvição do senhor Vaccari mostra que o mesmo entendimento não está sendo usado na decisão”, criticou Bandieri, que irá entrar com embargo de declaração contra a decisão.

Os defensores de Gerson Almada, Roberto Marques e José Antunes Sobrinho ainda não se pronunciaram a respeito da decisão do TRF-4.

O advogado de Cristiano Kok, Antonio Ruiz Filho, diz que foi uma decisão justa, mas que ele não poderia comemorar em razão da condenação dos outros corréus.

A defesa de Fernando Antônio Guimarães Hourneaux de Moura disse que, por ora, não irá se manifestar.