Acusado por Funaro, ex-advogado de Temer critica imprensa e "sanha acusatória"
O advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que defendeu o presidente Michel Temer (PMDB), aproveitou ato de desagravo em sua homenagem nesta segunda-feira (9) em São Paulo para defender as prerrogativas da profissão e criticar o que chamou de "sanha acusatória" em vigor na sociedade.
Mariz discursou em ato de desagravo organizado pela OAB-SP (seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil) após as declarações do doleiro Lúcio Funaro de que o advogado, como seu defensor, haveria avisado Temer sobre seu acordo de delação. Mariz negou ter violado o sigilo do cliente ou qualquer preceito ético da advocacia.
Em seu discurso hoje, Mariz disse que tal "sanha acusatória" é marcada pelo ódio, pela "vontade de castigar e não de aplicar a Justiça".
Sem citar casos específicos, o advogado também reservou duras palavras à atuação da imprensa, que atuaria como "arauto" de um comportamento punitivo hoje em evidência na sociedade e não teria o devido cuidado na hora de verificar a veracidade de acusações antes de publicá-las.
Mariz também criticou o Poder Judiciário ao dizer que "quem deveria limitar o poder de acusar, que é o juiz, não o está fazendo".
"Não se obedece mais a lei, não se obedece mais o código de processo penal", disse. "Estamos rumando para um estado de anomia total. Anomia é a total falta de normas."
O ato de desagravo contou com a presença de vários advogados de investigados em escândalos de corrupção da política nacional. Em termos dos partidos dos clientes, a escalação foi democrática.
Entre eles estavam Cristiano Zanin Teixeira e Valeska Martins Zanin Teixeira, advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT); Alberto Toron, advogado do senador Aécio Neves (PSDB); Pierpaolo Bottini, advogado de Joesley e Wesley Batista, donos da JBS; Roberto Podval, advogado do ex-ministro José Dirceu (PT); Luiz Flávio D'Urso, advogado do ex-tesoureiro petista João Vaccari Neto; e Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, defensor dos senadores Edison Lobão (PMDB-MA) e Romero Jucá (PMDB-RR), entre outros.
O advogado que fez o discurso de desagravo a Mariz foi Técio Lins e Silva, defensor do ex-executivo da Odebrecht Alexandrino Alencar e que chegou a dizer que a Lava Jato cometia arbitrariedades piores que a ditadura militar (1964-1985).
Lava Jato, protagonista oculta
As críticas à imprensa e a supostas violações das prerrogativas profissionais de advogados deram o tom do desagravo a Mariz. Sem ser citada, a Operação Lava Jato era a protagonista invisível do evento. Ao fim do evento, no entanto, Mariz negou, em conversa com jornalistas, que as críticas tinham a ver com a Lava Jato.
"A postura punitiva vem antes até do colarinho branco, quando a criminalidade estava na mão do pobre", disse. "É uma coisa assim: a culpa surge quando a polícia aponta, sem saber se é verdade, se é mentira. Isso não tem nada com Lava Jato. Confesso que com a Lava Jato tomou outra dimensão, porque a Lava Jato pegou a elite. Quando pegava só o pobre, isso não vinha à tona, mas a gente já falava."
O advogado João Roberto Piza Fontes, ex-presidente da OAB-SP, pediu uma reflexão sobre o que definiu como "ambiente de conluio" entre jornalistas, a Polícia Federal, o Ministério Público e parte da magistratura. "Isso compromete o Estado de Direito", afirmou.
Já o advogado Técio Lins e Silva lembrou o seu trabalho com Mariz nos tempos da ditadura militar (1964-1985) e disse que, apesar da repressão, se sentia seguro no escritório, "pois uma busca e apreensão era inimaginável".
"Nós vivemos um tempo em que se discute se a comunicação entre o advogado e um cliente preso deve ser gravada", disse Lins e Silva. "Confudem-nos com o cliente, principalmente na advocacia criminal.
No mesmo espírito, o advogado Luiz Flávio D'Urso, outro ex-presidente da OAB-SP, disse que os escritórios de advocacia e diálogos com clientes são invioláveis. D'Urso disse esperar que um dia sejam considerados criminosos os que violarem as prerrogativas do trabalho do advogado --lembrando que, nesta situação, os eventuais criminosos precisarão de advogados. "Toque em um de nós e nos tocará a todos", disse o advogado.
A acusação de Funaro
Preso desde julho de 2016, Funaro é apontado como um dos principais operadores do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Delator, o doleiro teria afirmado que Temer intermediou e recebeu propinas. Cunha, segundo Funaro, eram quem avisava o presidente a respeito das vantagens indevidas.
No mês passado, Funaro afirmou ter enviado por engano a Mariz, em junho de 2016, quando o advogado ainda era seu defensor, uma mensagem por e-mail sobre honorários que deveria ter sido endereçada ao criminalista Figueiredo Basto, que o ajudaria em sua colaboração com o Ministério Público Federal. O doleiro afirmou que, à época, estava em tratativa para trocar de advogado.
Funaro, que fechou acordo de delação com a PGR (Procuradoria Geral da República), disse que, após enviar a mensagem acidentalmente, foi sondado pelo ex-ministro Geddel Vieira Lima, aliado de Temer, sobre a possibilidade de delatar. Segundo o delator, Mariz teria contado ao presidente da República, seu amigo e então cliente, sobre o avanço do doleiro em seu intento de colaborar com investigações.
O advogado deixou de defender Temer no final de setembro alegando conflito de interesses por ter prestado serviços a Funaro. Ele não atua em favor de Funaro desde meados do ano passado.
Em nota divulgada à época, Mariz disse que, durante quase cinquenta anos de exercício da advocacia, jamais resvalou “em qualquer preceito ético, incluindo aqueles referentes ao sigilo profissional”.
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