Moro utiliza tática de 'guerra jurídica', diz advogada de Lula
Alvo da reclamação da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Inácio Lula da Silva (PT) no comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), o juiz Sergio Moro é o condutor de uma “guerra jurídica”, segundo a advogada Valeska Martins Teixeira, que faz parte da equipe que defende o petista. "[Moro] cria uma presunção de culpa, violando a presunção de inocência que um cidadão tem, passando a demonizar um inimigo político eleito. Esse tipo de tática de guerra jurídica tem que ser denunciada”, declarou em entrevista ao UOL.
Em julho do ano passado, os advogados de Lula apresentaram um comunicado ao comitê da ONU dizendo que o ex-presidente seria “vítima de abuso de poder por um juiz, com a cumplicidade de procuradores que o atendem e atuam lado a lado com os meios de comunicação".
Segundo Valeska, que diz acreditar na Justiça do país, ir à ONU não seria uma afronta ao Brasil, citando que outros países também são alvo de reclamações no comitê. “Nenhum país entende que é uma afronta a sua soberania. Muito pelo contrário, é um sinal que nós temos de estar dispostos a sempre nos aprimorarmos nas garantias individuais e nos direitos humanos dentro do país, dentro do Judiciário e também dentro da legislação”.
Valeska, ao lado de seu marido, Cristiano Zanin Martins, é uma das líderes da equipe de defesa de Lula. Ela é quem mais tem focado na reclamação sobre os processos perante a ONU.
Dizendo acreditar que os processos da Lava Jato são políticos, a advogada avalia que seria um "escândalo" se Lula não puder disputar a eleição presidencial em 2018. Lula pode ficar impossibilitado de concorrer caso seja condenado em segundo instância. O petista lidera as pesquisas de intenção de voto.
Efetivamente, retirá-lo das eleições de 2018 por conta dessa perseguição política seria mais um escândalo jurídico internacional. Não acho que o Brasil pode passar por mais uma ruptura de Estado de direito, de violação dos preceitos básicos
Valeska Martins Teixeira, advogada de Lula
Ela diz que "a guerra política tem que ser travada nas urnas, de forma democrática, transparente". "Isso que é uma democracia. Nós não podemos transformar procedimentos jurídicos em perseguições políticas".
Justiça em dúvida
A defesa tem sofrido críticas por membros do Judiciário por ter levado a questão ao exterior. A mais recente veio do procurador regional Mauricio Gerum, que representa o MPF (Ministério Público Federal) na segunda instância da Operação Lava Jato. Ele negou que o processo seja político e que haja um julgamento de exceção. Gerum ainda pontuou que é lamentável o ex-presidente colocar em dúvida a Justiça no Brasil.
A advogada de Lula rejeita a tese. “Não se pode impedir que um advogado não recorra de uma ilegalidade, não busque o direito de seu cliente”.
Valeska não concorda com a avaliação de especialistas em Direito Internacional ouvidos pelo UOL de que o efeito prático da reclamação na ONU seja político. “É um comunicado sério. Não é uma aventura jurídica. E nós temos que entender que o Brasil não pode ficar se perguntando: ‘Vai ter consequência ou não?’ A gente tem que se perguntar: ‘Teve violação ou não?’”, avalia a defensora.
“Mais do que saber se o violador, o juiz Sergio Moro ou a força-tarefa vai conseguir que não haja uma sanção em relação a suas ações ou aos abusos de autoridade que eles cometeram. A sociedade brasileira tem o direito de saber ou não houve grosseiras violações de direitos humanos”.
A decisão de fazer um comunicado ao comitê veio após a Corte Especial do TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região, a segunda instância da Lava Jato, ter decidido, no ano passado, arquivar uma ação contra Moro, que, segundo a defesa de Lula, teria cometido ilegalidades ao divulgar gravações telefônicas com o ex-presidente.
Na época, o desembargador federal Rômulo Pizzolatti, que rejeitou a questão, disse que a Lava Jato estava trazendo “problemas inéditos”, que exigiram “soluções inéditas”. Desse forma, não se poderia “censurar o magistrado ao adotar medidas preventivas da obstrução das investigações da Operação Lava Jato”. A decisão de Pizzolatti foi tomada em junho de 2016 e confirmada pela Corte, por 13 votos a um, em setembro do mesmo ano.
Já no STF (Supremo Tribunal Federal), a última instância na Justiça brasileira, há uma reclamação da defesa de Lula contra Moro, feita após o juiz ter divulgado conversas telefônicas do ex-presidente, em março do ano passado. A reclamação ainda não foi encerrada, segundo o Supremo. O caso está sob segredo de Justiça.
Sem remédios
Com isso, a defesa de Lula avaliou que não há mais “remédios jurídicos eficazes para reparar ou cessar” o que ela alega ser violação aos direitos do petista.
“Isso [ir ao comitê] é importante para que não volte mais a ocorrer no país tamanha violência como ocorreu em março do ano passado contra o ex-presidente Lula”, diz a defensora.
Quando os defensores se dirigiram à ONU, em 2016, a principal reclamação dos defensores era a condução coercitiva de Lula, quando ele foi obrigado a prestar depoimento, em 4 de março de 2016. A defesa considera que isso foi “uma prisão arbitrária de seis horas”.
Há cerca de duas semanas, a defesa apresentou novos itens à ONU para embasar sua tese de que Lula estaria sofrendo um julgamento injusto.
Um deles é a ida de Moro à pré-estreia do filme “Polícia Federal: A Lei é Para Todos”, que é tratado como “obra de ficção” pela defesa. A advogada acredita que, “para o juiz ser imparcial, ele tem que passar a percepção de imparcialidade para a população”.
“O juiz não pode atuar de uma forma de tanta proximidade com a acusação. Ele não pode prestigiar um filme da acusação, que relata, que narra fatos, pontos de vista da acusação. Ele tem que se manter equidistante. Ele tem que manter uma distância entre as partes. O que se percebe aqui é que o juiz sumiu. Esse processo não tem juiz”, criticou.
Ele é um juiz parcial, é o protagonista do lawfare [termo definido pelo uso da lei para fins políticos]
Valeska Martins Teixeira, advogada de Lula
Para a defensora, “partes do Judiciário e do Ministério Público estão travando uma guerra política através do abuso dos procedimentos jurídicos”. Em novembro, ela irá lançar o livro "Lawfare, a lei como arma política", em que irá debater a questão sob seu ponto de vista. Ela também já lançou "O caso Lula", com artigos a respeito da "luta pela afirmação dos direitos fundamentais no Brasil".
Em manifestações neste ano, o procurador Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa da Lava Jato no MPF (Ministério Público Federal), disse, mais de uma vez, que alegar "perseguição política" é uma manobra para tirar o foco do réu.
O UOL procurou a assessoria da Justiça Federal no Paraná, mas Moro não irá se manifestar a respeito das falas da advogada de Lula. Ele, porém, já respondeu ao próprio ex-presidente, no interrogatório de 13 de setembro, que é um juiz imparcial. Sobre a ida ao cinema para ver o filme sobre a Lava Jato, Moro já falou que foi "na condição de espectador, não de juiz".
Condenação e processos
Lula já foi condenado por Moro a nove anos e seis meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em um processo que envolve um apartamento tríplex como pagamento de vantagem indevida.
Neste momento, o ex-presidente observa os últimos movimentos dos defensores antes de Moro proferir uma nova sentença, dessa vez em uma ação envolvendo um esquema entre a empreiteira Odebrecht e a Petrobras.
Lula ainda responde a um terceiro processo, a respeito de um sítio no interior de São Paulo, que seria pagamento por corrupção na Petrobras. Esta ação penal ainda está em sua fase inicial, com as partes apresentando a defesa prévia.
Valeska diz ser otimista em relação à avaliação do comitê da ONU, que deve se posicionar apenas no ano que vem. “Nós entendemos que não só aquele comitê reconhecerá o recurso, julgará procedentes essas violações e recomendará ao Brasil que melhore, aprimore seus mecanismos de garantias individuais e de direitos humanos”.
“Eu acho que Lula não está acima da lei, mas Lula não está abaixo da lei”, diz Valeska.
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